A Anamatra divulgou, nesta segunda-feira (29/02), nota pública a respeito da entrevista concedida pelo novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra da Silva Martins Filho, ao jornal O Globo, na qual o ministro fala, entre outros assuntos, sobre os rumos do Direito do Trabalho no Brasil, o papel institucional da Justiça Especializada e sobre a atuação dos juízes. Confira abaixo a íntegra da nota:
NOTA PÚBLICA
A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO – ANAMATRA, tomando conhecimento de entrevista concedida ao jornal "O Globo" pelo ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, novo Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, neste domingo, dia 28/02/2016, vem a público, por seu estrito dever estatutário (art. 4o), externar o seguinte.
1- A ANAMATRA avalia a entrevista do novo presidente do Colendo Tribunal Superior do Trabalho como expressão de suas convicções pessoais.
2- Há concordância com Sua Excelência no que diz respeito a afirmar que as decisões dos juízes de primeiro e segundo graus devam ter maior efetividade, de modo a serem cumpridas independentemente dos recursos que tramitam nas Cortes Superiores. A busca por maior celeridade das decisões judiciais, especialmente nesse ramo do Poder Judiciário, é fundamental.
3- Do mesmo modo converge-se na avaliação de que o uso do FGTS como garantia no crédito consignado tem caráter prejudicial e não benéfico para o trabalhador.
4- Não pode a ANAMATRA deixar de registrar, entretanto, que outros pontos das convicções esboçadas na entrevista ao "O Globo" não se identificam com o pensamento majoritário da Magistratura do Trabalho e nem com aquele dominante no âmbito da Corte Superior Trabalhista, notadamente quando se diz sobre os rumos do Direito do Trabalho no Brasil, e menos ainda quanto ao papel institucional da Justiça Especializada ou quanto ao perfil de seus juízes.
5- Nesses termos, a ANAMATRA diverge cabalmente de afirmativas do novo presidente como as que indicam que magistrados, sejam de primeiro grau, desembargadores ou ministros, “dão de mão-beijada” aos trabalhadores indenizações de até um milhão de reais, como se a jurisdição não fosse praticada com zelo, mas sim de modo irresponsável.
6- Semelhante afirmação, generalista e descontextualizada, notadamente porque pronunciada por quem acaba de assumir a governança de um Tribunal Superior, agregada a reflexões suas sobre o mérito de debates técnico-jurídicos travados no próprio Tribunal e na Justiça do Trabalho como um todo, não faz justiça à Magistratura do Trabalho, que exerce seus misteres com extrema seriedade e compromisso ético; jamais para fazer favor às partes, por qualquer viés ideológico que se imagine. Daí porque o comentário contribui unicamente para atrair, contra a Instituição, uma carga mais severa e injustificada de ranço e preconceito, especialmente por parte daqueles que hoje já se encontram incomodados com a atuação eficiente desse importante ramo do Poder Judiciário.
7- É preciso que todos os agentes que lidam com a Justiça do Trabalho compreendam a sua índole e a sua própria razão de existir, conscientes de que “o Direito do Trabalho responde fundamentalmente ao propósito de nivelar as desigualdades”, como bem afirmava Plá Rodriguez.
8- Não por outras razões, em vários Congressos da Magistratura do Trabalho (CONAMATs), há anos, os juízes participantes defendem e aprovam teses que rejeitam a terceirização em atividades essenciais da empresa, como forma de evitar a lesão contumaz aos direitos fundamentais dos empregados; e, na mesma linha, afirmam o princípio da progressividade e da não-regressividade dos direitos sociais, como dispõem o artigo 7º, XXVI, combinado com o art. 114, § 2º, da CF e com o art. 26 do Pacto de San José da Costa Rica.
9- No mesmo sentido, ademais, caminham as teses de CONAMATs que rejeitam a prevalência do negociado sobre legislado, entendendo-se que a redução, derrogação ou negociação prejudicial de direitos trabalhistas, pela via negocial coletiva, somente está autorizada nos estreitos limites daquilo que foi excepcionado, em "numerus clausus", pela Constituição Federal (art.7º). Qualquer passo em outro sentido tende a ser, na prática, retrocesso social eivado de desconformidade constitucional e convencional.
10- Fragilizar as regras jurídicas gerais de proteção ao trabalho é negar a tutela legal deferida aos seus destinatários, há mais de setenta anos, e há mais de vinte e cinco reforçada pela Constituição de 1988. Contra essas proposições retrocessivas se coloca a ANAMATRA, com fiel observância ao decidido em seus Congressos, ao comando de seu Estatuto e em defesa do Direito do Trabalho.
Brasília, 29 de fevereiro de 2016
Germano Silveira de Siqueira
Presidente da ANAMATRA
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