“Crise é companheira do Direito do Trabalho”

Para o catedrático Antonio Pedro Baylos Grau, crise econômica gera ação transformadora das relações entre capital e trabalho

A crise econômica mundial deflagrada ao longo dos dois últimos anos vem sendo pouco a pouco entendida como uma crise do modelo neoliberal de desregulamentação e flexibilização dos direitos dos trabalhadores que se espalhou pelo planeta, sobretudo na primeira década deste século.

Os fatos ocorridos desde o estouro da “bolha imobiliária” norte-americana, incluindo seus desdobramentos, como a recessão que atinge vários países, vêm fornecendo elementos de análise que ajudam a compreender o momento de crise porque passa o modelo hegemônico baseado na economia de livre mercado.

O tema foi amplamente dissecado, no 15º Conamat, durante a conferência “Trabalho e capitalismo em crise”, apresentada por Antonio Pedro Baylos Grau, catedrático de Direito do Trabalho na Universidade Castilla La Mancha (Espanha), no dia 30 de abril. O ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Lélio Bentes Corrêa presidiu a mesa, integrada também pelo professor Wilson Ramos Filho, doutor em Direito.

Baylos Grau, que também é diretor do Centro Europeu e Latino-americano para o Diálogo Social (CELDS), disse que a crise expressa o modo de ser do capitalismo, isto é, revela a capacidade de adaptação do sistema, não necessariamente no sentido final, isto é, de que está previsto a acontecer dessa maneira. “As crises pelas quais passou o capitalismo sempre produziram mudanças muito importantes nas estruturas políticas e sociais“, destacou.

Da mesma forma, quando se fala em trabalho em crise, verifica-se a relação direta da atividade laboral com a crise do capitalismo. Para o catedrático, as crises capitalistas levaram ao fim ou à escassez dos empregos em escala global. E mais do que esse fato: “as crises do sistema econômico modificam o processo de trabalho, isto é, muda o modo típico do trabalho assalariado“.

O conferencista destacou um matiz dessa discussão, o que aponta que a globalização ampliou o paradigma de trabalho assalariado e atinge milhões de pessoas em todos os continentes. “Isso significa que (mesmo com a crise) formalizam-se as relações de trabalho, ao mesmo tempo em que se materializam todas aquelas reivindicações dos trabalhadores, como as que versam sobre dignidade e saúde no trabalho, de condições mínimas de vida“, ressalta.

“Muitas vezes falamos das crises do trabalho, do fechamento em massa dos postos de trabalho, mas esquecemos que cada vez mais o trabalho assalariado é a forma normal de produzir bens, mercadorias e serviços“, disse. Baylos Grau avisa que, nesse contexto, há de se ressaltar a importância que adquire o sindicalismo, em nível global, e a presença cada maior das estruturas sindicais nas relações de trabalho.

“É certo que o trabalho, nos moldes aqui descritos, também impacta na  cadeia de dispersão dos trabalhadores; na externalidade que atinge as empresas, e na desarticulação produtiva. Esse é o trabalho fragmentado em que não se encontra a dimensão da solidariedade. A pergunta a ser feita, é: como reconstruir essa solidariedade?”.

O conferencista lembrou ser sintomático que a Confederação Sindical Internacional tenha divulgado comunicado, por ocasião do Dia do Trabalho, no qual lembra que neste ano de 2010, após décadas de desregulamentação e especulação do mercado livre, o mundo registra o fechamento de aproximadamente 34 milhões de postos de trabalho.

“Essa perda de empregos deve ser contextualizada na estrutura do modelo econômico que está na base dessa relação. A constatação feita é a de que nos países onde houve mais flexibilização das relações de trabalho, como é o caso da Espanha, piores foram os efeitos da crise. Essa afirmação é incontestável”, ressaltou.

Companheira de viagem - Aos congressistas presentes no 15º Conamat, sobretudo os magistrados da Justiça do Trabalho, Baylos Grau disse que a crise é uma tragédia, “mas é também uma companheira de viagem do Direito do Trabalho”. “A crise favorece as trocas dos modelos de reprodução. Essas trocas não seguem sempre na mesma direção. Elas dependem dos atores envolvidos e, fundamentalmente, de quatro grandes fatores”.

O primeiro, conforme destacou, é a ação do poder público: “Porque para os direitos nascidos do trabalho, a norma pública é excessiva; temos a importância da presença do Estado; temos a capacidade estatal de regulação e há que se considerar a capacidade do poder público de realizar políticas de desregulamentação social e econômica“.

A segunda variante seria a capacidade de determinadas organizações, fundamentalmente os sindicatos, de representar o trabalhador. “Não só uma representação nominal, mas a representação real. A possibilidade de que esse sujeito coletivo seja a expressão de diversas entidades“.

O terceiro aspecto envolve as novas formas de organização de trabalhadores dentro das empresas. “Como se apresenta esse novo modelo de empresa que admite essa nova maneira, esse novo espaço de organização dos trabalhadores?”, indaga.

Por último, segundo Baylos Grau, cabem também as questões sobre qual é a ideia de “cultura industrial” que se apresenta aos juristas do trabalho. “Qual é a noção de autonomia cultural desses direitos, a respeito da economia? Isso explica nossa posição ante a relação de trabalho e a crise do sistema”, resumiu.

TV Anamatra – Após a conferência, o catedrático concedeu uma entrevista exclusiva à TV Anamatra,  conduzida pelo juiz do Trabalho Alexandre Teixeira de Freitas.

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* A cobertura  do 15º Conamat está sendo realizada pela equipe da Assessoria de Imprensa da  Anamatra e colaboradores, em parceria com a Assessoria de Comunicação da Amatra 10

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