O ingresso via "quinto constitucional" nos Tribunais do país (art. 94, da Constituição Federal) tem sido assegurado pela Carta no sentido de garantir ao Poder Judiciário uma certa transparência social com que se permeia o sistema judicial de diversas visões institucionais, no caso, também da advocacia e do Ministério Público. Esse "quinto" constitui, aliás, um dos argumentos que sustentam os opositores do Controle Externo da Magistratura, pelo que consideram-no já existente.
Um vício do sistema faz com que esses representantes, no ato da posse, perpetuem-se como Magistrados, embora não de carreira, e não mais como advogados ou Representantes do Ministério Público, segundo suas origens, de cujas funções estariam temporariamente afastados. Gera-se com isso uma estranha perspectiva psico-funcional: o agente nem é mais advogado ou Representante do Ministério Público e, nem como se jamais fora Magistrado, também passa a exercitar de forma não raramente incomum a judicatura. O grande perigo de aproveitar esse pessoal da forma como presentemente ocorre é justamente o de que venha a exercitar a Magistratura sendo exímios políticos. Nesse caso, o agente, parecendo Juiz, de fato acaba não o sendo para comprometer a saúde institucional do sistema como um todo. Despiciendo referir que para esses acessos muitos lobbies são gerenciados no sentido do amesquinhamento da própria instituição judiciária, valendo tais ações tanto para o ambiente dos Tribunais da eleição como para um concerto muito largo e complexo de politicidade em que o pretendente passa a atuar por si ou por seus prepostos, sempre interessados em algum tipo de retorno que possa, quando menos, exprimir prestígio e poder.
Numa abordagem sistemática de que se compadece o Direito Positivo, não é para essa gente que se reservam os cargos de Juízes de carreira junto às instâncias superiores (104, inc. I, da CF), pois esses agentes, embora formalmente Juízes porque integrantes de Tribunais, e não obstante os méritos pessoais com que possam eventualmente vergastar suas judicaturas de ocasião, não o são de fato, pois jamais vivenciaram uma carreira judiciária como tal reclamada pela Constituição.
Maior risco é aquele que se antevê no médio e longo prazos quando, a se consolidar o já notório trato familista com que as coisas no serviço público brasileiro são conduzidas, os Tribunais Superiores, que deveriam ser órgãos eminentemente técnico-jurisdicionais, passarem a se guarnecer de composições majoritariamente não de origem judicativa. Então, teremos uma comunidade de advogados e de Representantes do Ministério Público a comandar os destinos e a autonomia do Poder Judiciário neste país. Dessa forma, aqueles que se arredam de defender o Controle Externo da Magistratura, até por articulações as mais irascíveis, na verdade são uns contraditórios na medida em que defendem a possibilidade de acesso às instâncias superiores de Juízes que acudiram aos Tribunais locais e regionais pela via do assim chamado "quinto constitucional". De fato, esse pessoal se transforma em Juiz no momento da investidura, por encanto e ficção se tornam vitalícios desde então, mas não terão empreendido a experiência nem os sofrimentos que todos nós, Magistrados de carreira, que fizemos concurso e não devemos nada a ninguém, senão a Deus, à nossa consciência e à lei, tivemos de passar e nos vemos, por isso, desprestigiados com a perpetuação da política de resultados também nessa questão das investiduras originárias às Cortes Superiores deste já notoriamente infelicitado país.
Os excessivamente formalistas, portanto, não devemos nos iludir... Repetindo Sheakespeare, em Hamlet: "Há mais coisas entre o céu e a terra do que possa supor nossa vã filosofia!"
De minha parte entendo - e isso significa muito pouco - que as listas para acesso aos Tribunais Superiores em que figurem Juízes oriundos do "quinto constitucional" para vagas destinadas a Magistrados de carreira não podem prevalecer do ponto de vista ético-jurídico, pois aqueles de carreira não são e pelo que resultariam "premiados", politicamente, duas vezes em detrimento da dignidade da Magistratura como um todo e no desprestígio de tantos Magistrados quantos se houvessem em condições legais para uma leal e perfeita disputa institucional-corporativa, como cabe em casos que tais. Os Magistrados de carreira não somos políticos, não lidamos com a política, não sabemos transitar com facilidade por ela e em meio aos seus praticantes. Chega-nos a ser vedada a participação político-partidária e isso parece mesmo uma estupidez, se a proibição for analisada em profundidade, pois, conforme podemos normalmente votar, e diferente não poderia ser, também deveríamos poder ser votados, observados, por exemplo, os mesmos critérios vigentes para o Ministério Público. Já o pessoal do "quinto constitucional" sabe muito bem como administrá-la, tanto por que aproveitados por igual forma, enquanto a competição que resulta estabelecida entre uns e outros por cargos mais proeminentes acaba refletindo uma cruel e desigual disputa.
Combater a falta de participação justa e tolerável e a falta de democracia em nosso meio não se compadece das interpretações menos avisadas