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A possibilidade de renúncia à promoção por Juiz do Trabalho

Nei Messias Vieira (*)

1. INTRODUÇÃO
O problema posto é a possibilidade de renúncia, por magistrado trabalhista, à promoção já efetivada para o cargo de juiz titular de vara, retornando, então, ao cargo de juiz do trabalho substituto.

Não existe previsão da renúncia na legislação específica que regulamenta a magistratura nacional. Existe, porém, a previsão de renúncia à promoção para os membros do Ministério Público da União, no `PAR` 4° do art. 199 da Lei Complementar n° 75/1993[1].

Vistas essas informações, a solução da questão parece passar por duas etapas. Na primeira, indaga-se se a falta, na legislação, incluindo na Lei Orgânica da Magistratura Nacional - Lei Complementar n° 35/1979, de dispositivo prevendo a renúncia é omissão intencional, implicando vedação da prática do ato, ou é mera lacuna legislativa. Se se concluir por esta última hipótese, adentra-se a segunda etapa: indaga-se se a lacuna legislativa constitui impedimento à renúncia.

2. HÁ OMISSÃO INTENCIONAL NA LEGISLAÇÃO?

Primeiramente merece resposta a pergunta: qual o eventual motivo para vedação à renúncia?

Qual direito ou garantia seria protegido pela vedação à renúncia e motivaria a proibição desse ato?

Dentre o rol das garantias da magistratura, identifica-se a inamovibilidade em eventual contraposição à renúncia (vista a inamovibilidade como instrumento para se manter a independência no exercício da função e, conseqüentemente, como instrumento para a garantia objetiva e institucional da independência do Poder Judiciário).

A inamovibilidade, obviamente, não é absoluta. Visa impedir a movimentação sem aquiescência ou sem manifestação volitiva do juiz e se aplica nas escalas horizontal e vertical da magistratura; logo, a aquiescência ou a manifestação de vontade servem tanto para garantir a permanência do magistrado no exercício da função em que se encontra, quanto para permitir sua remoção ou promoção.Essa regra está claramente estampada no art. 30 da LC n° 35/1979[2].

Além disso, é possível a remoção compulsória, por imperiosa necessidade pública.
No mesmo sentido está claramente redigido o art. 654, `PAR` 5°, alíneas "a" e "b" da CLT[3], que prevêem a remoção do juiz presidente de vara somente a pedido, ou a promoção de juiz substituto a juiz presidente de vara mediante aceitação facultativa. Não por outra razão, os tribunais do trabalho usualmente estipulam, nos editais de concurso para promoção, cláusula afirmando a renúncia tácita à promoção por aqueles que não se inscrevam.

Indiscutível, pois, que a promoção do juiz do trabalho substituto é ato volitivo e sujeito à renúncia à preferência, o que obviamente não significa violação à inamovibilidade. Por outro lado, ato volitivo de mesma natureza, visando o retorno à condição de juiz substituto significa alguma violação à inamovibilidade? Tal situação somente se verificaria em situações excepcionais, em que a manifestação de vontade fosse viciada. Em regimes de exceção, a vedação geral à renúncia da promoção, sobretudo tácita, talvez fosse compreensível, para se garantir a independência do Poder Judiciário perante o Poder Executivo, cuja ingerência se agiganta nos períodos ditatoriais. Mas a legislação acima transcrita mostra que, mesmo durante regimes excepcionais no País, admitiu-se a renúncia tácita à promoção ou à remoção, assim como a faculdade da manifestação volitiva pelo juiz.

Então, por que, ao contrário da previsão legal para os membros do Ministério Público da União, não houve taxativa previsão de renúncia para os magistrados da União?

Essa questão nos parece atrelada à forma como se organizam as carreiras. Sendo a carreira do Ministério Público da União organizada nacionalmente, as lotações em qualquer lugar do País ficam acessíveis a todos os membros; isso implica que as remoções devem ser operar também nacionalmente. Todavia, os cargos de promotor, procurador, procurador regional e subprocurador-geral não são distribuídos uniformemente no território nacional. Nem poderiam, haja vista os números de cargos variarem conforme a necessidade de serviço em cada Região administrativa do Ministério Público; e, no caso dos subprocuradores-gerais, os cargos se concentrarem exclusivamente na capital federal.

A remoção a pedido ficaria obstada a um membro para Região que não tivesse, em seu quadro de lotação, vaga de mesma natureza (art. 212 da LC n° 75/1993[4]). Daí se permitir que se proceda, a qualquer tempo, à renúncia à promoção (`PAR` 4° do art. 199), tornando possível a remoção. Exemplifica-se: um procurador regional renuncia à promoção e retorna a procurador, buscando remover-se para Região onde, na época, exista vaga de procurador apenas.

Todavia, tal possibilidade inexistia na Justiça do Trabalho, em que as remoções se realizavam exclusivamente nos limites da Região para a qual se houvera prestado concurso para ingresso na carreira de magistrado. Inexistia porque, a partir da inserção, pela Emenda Constitucional n° 45/2004, do inciso VIII-A no artigo 93 da Constituição da República[5], interpretou-se ser possível a remoção de juízes do trabalho substitutos entre diversos tribunais regionais. Tal entendimento foi assentado na Resolução n° 21/2006 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (cópia integral ao final), publicada em 2/6/2006 e em cuja motivação se menciona que existe a já citada autorização constitucional, que se faz necessária a regulamentação dessa autorização dotada de eficácia plena e que "a proteção à família é valor constitucionalmente consagrado (art. 226)".

Como se nota, no atual estágio do Estado brasileiro, entendeu-se que a boa prestação jurisdicional pelo magistrado depende, também, da manutenção da integridade de seus vínculos familiares. Vínculos esses muitas vezes esmaecidos quando, num País de vastas dimensões, a assunção da magistratura ocorre em Região distante daquela à qual está emocional e familiarmente vinculado o juiz.

Antes da edição da EC n° 45, ausente a possibilidade de remoção de juiz entre diversos tribunais regionais, o legislador ordinário somente se preocupava com a taxativa regulamentação da promoção e da remoção na mesma Região. E somente se redigiram dispositivos que tratavam expressamente da proteção à promoção e à remoção, meios de movimentação a que teria interesse o magistrado. Não havia, pois, necessidade de estabelecimento de qualquer regra prevendo a renúncia à promoção já efetivada.

Agora, contudo, o interesse à renúncia aflora, em decorrência da necessidade de correspondência de cargos para a remoção entre tribunais regionais, segundo disposto no art. 2° da Resolução n° 21/2006 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho[6].

Em suma, atualmente não nos encontramos sob regime de exceção, que implicaria a proteção objetiva da magistratura com a proibição da movimentação regressiva na carreira (seja considerada como preservação de garantia institucional da independência do Poder Judiciário, seja considerada como preservação de direito subjetivo público de um magistrado); sem embargo, a legislação ordinária jamais criou embaraço à manifestação volitiva individual acerca do interesse à promoção ou remoção do magistrado. Por outro lado, hoje há normas autorizando a remoção de juízes substitutos entre diversos tribunais regionais, implicando o surgimento do interesse individual do magistrado pela regressão na carreira, a fim de obter a compatibilidade com vaga existente na Região de destino - interesse que, como já se disse, inexistia antes do alargamento das hipóteses de remoção.

Conclui-se, ante o exposto, que não há intencional omissão legislativa, que significaria vedação da renúncia à promoção já obtida.

3. A LACUNA DA LEI É SUPRÍVEL?

Não se tratando de omissão intencional da lei, mas sim de mera lacuna, o direito à renúncia fica obstado pelo princípio da legalidade que rege a Administração Pública?

Primeiramente, conste-se que não são raras as decisões dos tribunais nacionais, preenchendo lacunas da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Por exemplo, a 5ª Turma do C. Superior Tribunal de Justiça, já decidiu que:

A questão da prescrição das penalidades cometidas por magistrado, sem dúvida, por estar diretamente ligada ao exercício do cargo, é matéria a ser tratada no Estatuto da Magistratura. Entretanto, por ser a atual legislação vigente omissa quanto a esse aspecto e, sendo necessário o tratamento uniforme da matéria, é aplicável subsidiariamente o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, ainda que se trate de juiz estadual (recurso ordinário em mandado de segurança nº 2001/0090911-0, relator Ministro Félix Fischer, DJ 29.03.2004, p. 253).

Não é estranho à Justiça brasileira, pois, o preenchimento das lacunas da LOMAN. É necessário buscar, então, meios que fundamentem essa composição dos vazios legais. Trazem-se as lições modernas do Direito Administrativo:

Mas é indispensável evitar que as considerações acima conduzam a identificar o princípio da legalidade com a necessidade de existência de disposição expressa no texto de uma lei. Quando se afirma que o princípio da legalidade envolve a existência de lei, isso não pode ser interpretado como exigência de disciplina legal literal e expressa. O princípio da legalidade conduz a considerar a existência de normas jurídicas, expressão que não é sinônima de "lei", tal como exposto.

Há princípios jurídicos implícitos. Também há regras jurídicas implícitas. A disciplina jurídica é produzida pelo conjunto das normas jurídicas, o que exige compreender que, mesmo sem existir dispositivo literal numa lei, o sistema jurídico poderá impor restrição à autonomia privada e obrigatoriedade de atuação administrativa.

Em suma, o princípio da legalidade não conduz a uma interpretação literal das leis para determinar o que é permitido, proibido ou obrigatório (Justen Filho, Marçal. Curso de direito administrativo, São Paulo:Saraiva, 2005, p. 141-142. Negrito e aspas no original; sublinhados nossos).

Assim, a observação das normas e princípios jurídicos e seu respeito podem conduzir a solução não prevista taxativamente na lei em sentido estrito, ainda no âmbito da Administração Pública. Nessa linha, a solução poderá ser encontrada em normas gerais ou em princípios, aqui entendidos como forma de expressão normativa.

Encontrada a solução em um princípio, abre-se a possibilidade de ocorrência de conflito entre princípios. Conflito dessa ordem se resolverá mantendo intacto todo o sistema jurídico, mediante o exercício da ponderação e identificação do valor subjacente que deva prevalecer, jamais pelo exercício dos mecanismos de exclusão, restritos ao conflito aparente de regras. Como ensina Paulo Bonavides, aproveitando a teoria de Robert Alexy:

Com a colisão de princípios, tudo se passa de modo inteiramente distinto, conforme adverte Alexy. A colisão ocorre, p. ex., se algo é vedado por um princípio, mas permitido por outro, hipótese em que um dos princípios deve recuar. Isto, porém, não significa que o princípio do qual se abdica seja declarado nulo, nem que uma cláusula de exceção nele se introduza.

Antes, quer dizer - elucida Alexy - que, em determinadas circunstâncias, um princípio cede ao outro ou que, em situações distintas, a questão de prevalência se pode resolver de forma contrária.

Com isso -  afirma Alexy, cujos conceitos estamos literalmente reproduzindo - se quer dizer que os princípios têm um peso diferente nos casos concretos, e que o princípio de maior peso é o que prepondera (Curso de direito constitucional, 18a ed., São Paulo:Malheiros, 2006, p. 279-280).

Então, se se entender que o ato de renúncia à promoção se embasa em algum princípio jurídico e preserva algum direito fundamental, dever-se-á solucionar o aparente conflito com o princípio da legalidade por meio de composição harmoniosa, em que prevaleça aquele primeiro.

Ressalte-se que o princípio da legalidade na Administração Pública visa a proteção do interesse público, do interesse social e do interesse do administrado, restringindo e pautando a atuação do agente estatal.

A inamovibilidade é, sob o enfoque individual do magistrado, um direito subjetivo público; enquadra-se, pois, em categoria jurídica que permite a renúncia, se esse ato não se pratica em contrariedade a seu aspecto objetivo, de garantia institucional.

Parecer elaborado pelo Exmº Vogal Prof. Doutor Eduardo Vera-Cruz Pinto, integrante do Conselho Superior da Magistratura de Portugal, já tratou da matéria, ao se apreciar a renúncia a mandato por um dos membros do próprio Conselho, ato que, a nosso ver, não difere ontologicamente do ato de renúncia à promoção ora sob investigação. Nesses termos se vazou o parecer:

Primeiro porque o direito a renunciar a uma função ou mandato exercido em órgão colectivo é um princípio geral de Direito com filiação nos direitos, liberdades e garantias individuais da pessoa e um direito com filiação nos direitos da personalidade. Logo, não está dependente de previsão normativa expressa.

Subtraída a categoria iuris dos direitos indisponíveis ou irrenunciáveis, o que não é o caso, o exercício do direito de renúncia a um mandato é um direito absoluto do membro do órgão colectivo, embora sujeito a disciplinas legais próprias, e por isso variáveis. Nenhuma pessoa pode ser obrigada, contra a sua vontade, a exercer funções. O exercício do direito de renúncia pode ser disciplinado, mas não pode ser negado (encontrado no endereço eletrônico http://www.conselhosuperiordam agistratura.pt/index.php?idmenu=15&lg=1#37).

A solução é correta juridicamente, pois faz prevalecer garantias fundamentais individuais, se validamente manifestado o ato de renúncia.

Visto o ordenamento jurídico pátrio, idêntica solução é encontrada e adquire contorno legal na previsão encontrada no art. 199, `PAR` 4º, da Lei Complementar nº 75/1993. Isso demonstra que nosso sistema jurídico reconhece que o direito subjetivo público de renunciar à promoção não ofende a garantia institucional da inamovibilidade, enquanto expressão da independência do exercício de função essencial à Justiça.

Para a magistratura a mesma solução se impõe, não só porque o ato de renúncia não confronta a garantia da inamovibilidade sob o enfoque institucional, mas também porque pode ser validamente manifestado sob o enfoque individual. Não haveria sequer suspeita de vício de consentimento, quando presente motivação para o ato de renúncia: obter a possibilidade de participar de remoção entre tribunais regionais.

Não bastasse isso, o ato de renúncia se mostra instrumento necessário e adequado para a preservação do interesse público, concretizado no preenchimento de vaga no tribunal de destino, necessidade premente com relação à necessidade menos intensa no tribunal de origem, verificada na autorização para a remoção (de outra sorte, não se autorizaria a remoção, segundo regra do art. 3º, "caput" e parágrafo único, da Resolução nº 21/2006 do CSJT). O ato de renúncia também se mostra compatível com todos os demais princípios da Administração Pública, destacadamente os da finalidade pública, da moralidade e da impessoalidade. Mais ainda, se mostra compatível como instrumento para proteção da família, valor constitucional encontrado como motivo para a edição da Resolução n° 21/2006.

Acrescente-se que não se cogita a ocorrência de desprezo do princípio da legalidade, porquanto não se vislumbra que qualquer dos valores ou direitos por ele garantidos se tenha violado; em outra vertente, o ato obedece a todos os requisitos legais para sua prática, atende às garantias legais da magistratura e é exercido sem afrontar qualquer dispositivo legal expresso.

Por fim, repete-se que o preenchimento de lacunas da Lei Orgânica da Magistratura Nacional por dispositivos encontrados em outras leis não é estranho aos tribunais nacionais. E a solução prevista no `PAR` 4º do art. 199 da Lei Orgânica do Ministério Público da União merece ser tomada como paradigma para se completar adequadamente a lacuna da LOMAN, por ter sido criada para tratar situação jurídica em que estão em jogo princípios, valores, garantias e direitos institucionais e individuais comuns ao "Parquet" e à magistratura.

Diante de todo o exposto, conclui-se pela validade do ato de renúncia à promoção por juiz do trabalho.

Referências

[1] Art. 199. As promoções far-se-ão, alternadamente, por Antigüidade e merecimento.
..........
`PAR` 4º É facultada a renúncia à promoção, em qualquer tempo, desde que haja vaga na categoria imediatamente anterior.
[2] Art. 30. O juiz não poderá ser removido ou promovido senão com seu assentimento, manifestado na forma da lei, ressalvado o disposto no art. 45, I.
[3] Art. 654. O ingresso na magistratura do trabalho far-se-á para o cargo de juiz do trabalho substituto. As nomeações subseqüentes por promoção, alternadamente, por Antigüidade e merecimento.
..........
`PAR` 5º O preenchimento dos cargos de presidente de Vara, vagos ou criados por lei, será feito dentro de cada Região:
a) pela remoção de outro presidente, prevalecendo a antigüidade no cargo, caso haja mais de um pedido, desde que a remoção tenha sido requerida dentro de quinze dias, contados da abertura da vaga, ao Presidente do Tribunal regional, a quem caberá expedir o respectivo ato.
b) pela promoção de substituto, cuja aceitação será facultativa, obedecido o critério alternado de Antigüidade e merecimento.
[4] Art. 212. A remoção a pedido singular atenderá à conveniência do serviço, mediante requerimento apresentado nos quinze dias seguintes à publicação de aviso da existência de vaga.
[5] Art. 93. ..........
VIII-A ? a remoção a pedido ou a permuta de magistrado de comarca de igual entrância atenderá, no que couber, ao disposto nas alíneas a, b, c e e do inciso II.
[6] Art. 2º A remoção a pedido é de exclusivo interesse do magistrado e somente será deferida para provimento de cargo vago idêntico.

______________
(*) Nei Messias Vieira, Procurador do Trabalho da 15ª Região, Ex-Juiz do Trabalho da 3ª e 15º Regiões.

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Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra