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O inquérito civil na promoção da ação civil pública

Carolina Lobato Goes de Araújo (*)

O inquérito civil é um procedimento administrativo investigatório, de caráter inquisitivo, instaurado e presidido pelo Ministério Público. Seu objetivo é, basicamente, coletar elementos de convicção para as atuações processuais ou extraprocessuais a seu cargo. (MAZZILLI in MILARÉ, 2005, p.223)

Inicialmente ventilado pelo promotor de justiça paulista José Fernando da Silva Lopes, em 1980, em palestra proferida para um Grupo de Estudos da Instituição, o inquérito civil possuiria como modelo inspirador o já existente inquérito policial e seria um procedimento investigatório realizado por organismos administrativos a serem enviados ao MP como peças fundantes da ação civil pública.

Apesar de não ter sido aprovado exatamente nos moldes como proposto, o inquérito civil passou a existir com a edição da Lei 7.347/85 (arts. 8º e 9º), vindo posteriormente a ser consagrado na Constituição como função institucional do Ministério Público (art. 129, III), além de elevar a status constitucional o poder ministerial de efetuar diligências e requisições (art. 129, VI e VIII) no procedimento inquisitorial.

A par da legislação já existente sobre o assunto, foi o inquérito civil previsto também pela Lei 7.853/1989 (sobre a proteção às pessoas portadoras de deficiência), pela Lei 8.069/1990 (que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente), pela Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), pela Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e pela LC 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União). (MAZZILLI in MILARÉ, 2005, p.222)
A superveniência de novas leis prevendo o instrumento investigatório só vem corroborar a importância do inquérito civil como procedimento prévio às ações cujo objeto tenham elevada relevância social.

Na lição de Mancuso:

 

[...] esse inquérito é um instrumento destinado a possibilitar uma ?triagem? das várias denúncias que chegam ao conhecimento do Ministério Público: somente as que resultarem fundadas e relevantes acarretarão, por certo, a propositura da ação; de todo modo, a conclusão  a que chegue o Ministério Público não é vinculante para a entidade denunciante. (MANCUSO, 1998, p.173)

A triagem ganha especial destaque, sobretudo porque sua seleção equivocada poderá enquadrar as eventuais denúncias e representações no tipo do art. 19 da Lei 8.429/92, qual seja, crime de representação por ato de improbidade contra agente público ou terceiro beneficiado quando o autor da denúncia o sabe inocente, com a conseqüente pena de detenção de 6 a 10 meses e multa. No mesmo sentido o art. 339 do Código Penal.

No cotejo do inquérito civil com o inquérito policial, sua fonte inspiradora, despontam-se importantes diferenças, a saber: a) o objeto do inquérito policial é a apuração da materialidade e autoria de infrações penais, para servir de base para a denúncia ou a queixa (contrariamente, o objeto do inquérito civil cinge-se à apuração de fatos que embasem a atuação do parquet); b) no inquérito policial, a despeito de ser o MP o titular privativo da ação penal pública, as investigações pré-processuais são conduzidas pela polícia, e as informações são repassadas à instituição ministerial (já no inquérito civil a condução da investigação é feita diretamente pelo MP); e c) no inquérito policial, o controle do arquivamento é feito pelo juiz (no inquérito civil, a lei atribui o controle ao próprio MP). (MAZZILLI in MILARÉ, 2005, p.223)

Sobre este último aspecto, ressalta-se que o Ministério Público não requer o arquivamento do inquérito civil. Ele simplesmente o determina, havendo, todavia, a obrigatoriedade imposta por lei (art. 9º, `PAR` 1º, da Lei 7.347/85) de remessa dos autos ao Conselho Superior do Ministério Público, no prazo de três dias, sob pena de se incorrer em falta grave.

Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de arquivamento, designará, desde logo, outro órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação (art. 9o, `PAR` 4o, da Lei 7.347/85).

Uma vez arquivado o inquérito civil, nos casos em que o membro ministerial não identifique nenhuma hipótese de lesão a interesse que lhe incumba tutelar, qualquer legitimado, e não apenas as associações (art. 9o, `PAR` 2o, da LACP), poderá manifestar-se nos autos submetidos a exame do Conselho Superior do Ministério Público, por força do direito constitucional de petição (art. 5o, XXXIV). (NERY e NERY, 2003, p.1322)

Lembra-se que, mesmo tendo o membro do MP arquivado a peça investigatória, pode ele reabrir o inquérito, independentemente da superveniência de novas provas ou não. Nos dizeres de Mazzilli:

 

[...] se surgirem novas provas em caso de inquérito civil já arquivado, nada impediria sua reabertura: afinal, o arquivamento do procedimento administrativo não cria direito subjetivo em favor da não-propositura da ação, que pode ser ajuizada mesmo sem novas provas, por qualquer legitimado. (MAZZILLI in MANCUSO, 2004, p.177)

Dentre outros méritos, o inquérito civil carrega o trunfo de prevenir e, até mesmo, desencorajar a prática de atos ilícitos em potencial ou em andamento. Além disso, o uso dos termos de ajustamento de conduta durante o inquérito civil (art. 5º, `PAR` 6º, da LACP), com força de título executivo extrajudicial, tem o condão de fazer cessar o ato ilícito praticado.
A propósito, a observação de João Batista de Almeida, de que

 

[...] é maior o número de inquéritos civis, se comparado com o número de proposituras (de ações civis públicas). É que alguns (IC) são arquivados por falta de fundamentação e outros porque atingem, na via extrajudicial, o objetivo colimado, com o enquadramento à legalidade, o ajustamento de conduta e a correção de irregularidades, tornando despiciendo o recurso à via judicial. (MANCUSO, 1998, p.181)

O uso consciente do inquérito civil atua diretamente na redução das lides temerárias. Por intermédio deste valioso instrumento investigatório, pode o membro do Ministério Público atuar de forma intensa na conferência da veracidade e consistência dos fatos apontados como ilícitos e danosos. Dessa forma, evita-se o risco de ajuizar-se ação coletiva manca e, logo, fadada ao insucesso. 

O inquérito civil pode ser instaurado por portaria expedida pelo órgão do Ministério Público ou a partir de despacho por ele proferido em ofício, requerimento ou representação. Em ambos os casos, não é necessário que se desça a minúcias excessivas e irrelevantes da situação, bastando que haja a indicação suficientemente precisa e minuciosa quanto aos elementos básicos que integrem o fato ilícito, objeto da investigação. (MAZZILLI in MILARÉ, 2005, p.224-229)

Apesar da inquestionável contribuição do inquérito civil, não é ele indispensável à propositura da ação civil pública. Outras peças, que não necessariamente o inquérito civil, podem embasar o ajuizamento da ação civil.

No mesmo sentido, a abertura do inquérito é faculdade do Ministério Público, a teor do art. 8o, `PAR` 1o, da LACP, que dispõe que o MP poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil ou requisitar de qualquer organismo público ou particular certidões, informações, exames ou perícias no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a dez dias úteis.

Quanto à natureza do inquérito civil, há quem sustente ser ele mero procedimento e há quem o classifique como processo.

Na primeira posição, desponta Hugo Nigro Mazzilli, para quem:

 

[...] o inquérito civil não é processo administrativo e, sim, mero procedimento; nele não há uma acusação nem nele se  aplicam sanções; nele não se criam direitos nem se impõem sanções; nele não se limitam, nem se restringem, nem se cassam direitos. Em suma, no inquérito civil não se decidem interesses; não se aplicam penalidades; ele serve apenas para colher elementos ou informações com o fim de formar-se a convicção do órgão do Ministério Público para eventual propositura ou não das ações a seu cargo. (MAZZILLI in MILARÉ, 2005, p.233)

Concordamos com Mazzilli, para quem o inquérito civil possui natureza jurídica de procedimento, pois, não sendo um processo que contenha um fim em si mesmo, não é contraditório, não lhe cabendo ampla defesa, uma vez que não existe tecnicamente uma acusação, nem sanções.

Para finalizar, a despeito dos incontestáveis ganhos proporcionados pelo uso do inquérito civil, instrumento relativamente novo de auxílio na promoção de ações civis públicas, este não está isento de críticas.

Registra Mazzilli que deve-se atentar para o fato de que o inquérito civil tem de ser usado com moderação e na plenitude a que se destina, pois não raro é indevidamente utilizado para investigar critérios que a lei colocou ao alvitre da esfera discricionária do administrador.
Apesar de não ser peça acusatória, não deixa o inquérito civil de desgastar a imagem dos investigados, além de correr o risco de ser palco de abusos cometidos pelo seu presidente, devendo ser usada com sensatez e razoabilidade.

Em todos os casos de abuso na instauração do inquérito civil deverá o responsável ser punido nos termos da lei.

Por outro lado, se ainda existem ajustes a serem feitos no uso do inquérito, não há como negar o fortalecimento do poder investigatório do Ministério Público em casos que estejam a reclamar sua instauração.

O parquet agregou mais um instrumento de aperfeiçoamento das investigações na promoção da defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, sendo-lhe facultada a apuração direta de todos os elementos que possam contribuir para uma ação civil pública segura e robusta de provas.
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(*) Mestre em Direito do Trabalho pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG e analista judiciária do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª região

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Dr. Marco Aurélio Marsiglia Treviso
Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra