Diretor Legislativo, Valter Pugliesi, alertou para as inconstitucionalidades na inclusão de matérias estranhas ao texto originário da MP
O diretor de Assuntos Legislativos da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Valter Pugliesi, participou, nessa sexta (27/8), da Audiência Pública destinada a debater o Estatuto do Trabalho e a Medida Provisória (MP) 1045/2021, realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal. Conduzido pelo senador Paulo Paim (PT), o evento contou com a participação do presidente da ALJT e ex-presidente da Anamatra, Hugo Melo Filho, do vice-presidente do Sinait, Carlos Silva, do diretor Legislativo da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Antonio de Oliveira Lima, e do secretário nacional de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle.
Em sua exposição, Pugliesi afirmou que a MP 1045, em seu texto originário, nada mais é que a reedição da MP 936/2020, que foi convertida na Lei 14.020/2020, que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção de Emprego e Renda. O juiz alerta que a MP 936 foi instituída em meio à crise causada pela pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), que impactou diretamente a atividade econômica por conta das restrições de funcionamento de diversos segmentos empresariais. Nesse sentido, avalia o diretor da Anamatra, a MP 1045 não se justifica, já que “a mesma situação de crise não se verifica no atual momento, em que temos pouquíssimas restrições, com as empresas em funcionamento e sem o mesmo impacto na atividade econômica”.
Valter Pugliesi também chamou à atenção para a inserção de um extenso conjunto de matérias estranhas ao texto original da MP. Mais de 70 artigos foram inseridos, inclusive criando outros programas como o programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip) e o Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário.
Na avaliação do magistrado, essas inclusões, sem o necessário debate, em meio a um rito de tramitação célere e abreviado, como é próprio das medidas provisórias e, atualmente, sem a participação da comissão mista, conforme prevê a CF/88, violam o devido processo legislativo e a própria iniciativa legislativa, pois a Constituição confere ao Presidente da República a avaliação justamente dos dois requisitos relativos às medidas provisórias, que são a urgência e a relevância. “Nesse caso, o Executivo entendeu que esses requisitos estavam limitados apenas à execução do Programa Emergencial. Assim, todas essas matérias estranhas não foram objeto de avaliação do Presidente, que tem a competência constitucional dessa avaliação”, disse.
Acesso à justiça - O magistrado também citou a inconstitucionalidade das alterações dispostas no projeto de conversão em lei aprovado pela Câmara dos Deputados, no que se refere à inserção de matéria processual, ressaltando os artigos que tratam do acesso à justiça e das condições para a concessão da gratuidade de justiça, seja na CLT, no CPC ou nas leis dos juizados especiais. “São matérias nitidamente processuais e a Constituição, em seu Art. 62, Inc. I, “b”, veda expressamente o trato de matéria processual em medidas provisórias”, apontou.
Essa inserção inadequada de temas estranhos no decorrer do processo legislativo já foi, inclusive, discutida e assentado o entendimento no âmbito do Supremo Tribunal Federal. No julgamento da ADI 5.127, declarou-se que a prática de inserir matérias de conteúdo temático estranho ao objeto originário da MP viola o devido processo de tramitação legislativa e descumpre o compromisso democrático anotado na Constituição. Em seu voto de relatoria, a Min. Rosa Weber esclareceu que “a alteração da proposta legislativa sujeita a cláusula de reserva de iniciativa somente se legitima quando a modificação proposta – seja para ampliar, restringir, adequar ou adaptar o alcance do texto original –, guarda com ele estrita relação de afinidade temática. ”. Firmou-se a compreensão que emendas de parlamentares só são admitidas para restringir, adequar ou adaptar questões estabelecidas no texto principal da MP, e desde que não atinjam a essência das proposições nem desvirtuem seus propósitos.
Esses e outros argumentos da Anamatra com relação à medida, estão detalhados em nota técnica elaborada pela entidade. No documento, a Associação chama à atenção para alterações em diversos dispositivos da legislação ordinária trabalhista, ressaltando, mais uma vez, que as medidas não guardam relação alguma com o enfrentamento das consequências trabalhistas da pandemia. “São profundas as alterações pretendidas na CLT, com precarização do sistema de fiscalização, diminuição na autonomia do Ministério Público do Trabalho, extensão de jornadas laborais e redução do adicional de horas extras para profissões com jornada diferenciada, ampliação do pagamento de prêmios em detrimento de sua natureza de salário, dentre outras”, alerta. Clique aqui e confira o inteiro teor do documento.
Atuação da Anamatra - Ao longo da tramitação da MP, a Anamatra tem atuado intensamente, com a elaboração de notas técnicas e a apresentação de seus argumentos em audiências com diversos parlamentares. Já no Senado, a entidade tem se colocado à disposição para contribuir com os debates e estudos sobre a matéria, a fim de se evitar o avanço de legislação que promova a precarização dos direitos dos trabalhadores.
Tramitação – O senador Confúcio Moura (MDB/RO) foi designado para relatoria da proposta, que deve ser votada já nesta quarta (1/9). Segundo informações divulgadas nos últimos dias, o projeto poderá ser levado ao plenário nesta semana, mas a decisão depende do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). O prazo final para votação da MP encerra no dia 7 de setembro, feriado nacional.