Juíza Noemia Porto fala da ausência de uma experiência profissional efetivamente igualitária para as magistradas
A igualdade entre homens e mulheres na Magistratura tem sido paulatinamente alcançada e, com ela, uma também igualitária presença na articulação da política associativa? O questionamento foi lançado pela presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, em “live”, promovida pela Amatra 6 (PE), nesta terça (9/3).
Em sua participação, conduzida pela presidente da Amatra, Laura Botelho, Noemia Porto alertou para o fato de, em que pese as mulheres serem maioria na Magistratura do Trabalho e se destacarem em cargos de gestão em algumas associações – como a Anamatra e a Amatra 10 (DF), onde foi presidente em 2011 – isso não vem acompanhado de uma igualdade substantiva, em termos, por exemplo, de condições de trabalho.
Essa realidade das magistradas brasileiras foi constatada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em grupo de trabalho, com a participação da Anamatra, criado para elaborar proposta de ações e diretrizes para a Política Nacional de Empoderamento Feminino no Poder Judiciário estabelecida pela Resolução CNJ 255/2018. Entre os problemas nesse sentido estão recusas de promoções na carreira que impliquem deslocamento para outras cidades, falta de estrutura física nos fóruns e demais locais para atendimento de crianças em idade que exige cuidado mais próximo, práticas sexistas de preferências masculinas pelo trabalho de homens em razão da possível gravidez das mulhere, falta de mulheres em bancas de concursos públicos, entre muitos outros.
“O que se nota é que a Magistratura mais feminina do país ainda tem desafios pela frente para equacionar o desencontro entre a maior presença quantitativa no Poder Judiciário e a ausência de uma experiência profissional efetivamente igualitária”, explicou a presidente. Além disso, segundo Noemia Porto, o incremento da presença das mulheres na carreira da Magistratura trabalhista não é transportado automaticamente para o ambiente da política associativa. A Anamatra, por exemplo, em 43 anos de história, foi presidida por apenas quatro mulheres.
Segundo a presidente, os arranjos familiares, que culturalmente procuram indicar às mulheres os mais diversos atributos de cuidado e de preponderante presença no âmbito privado, podem representar dificuldades na assunção das responsabilidades próprias à liderança associativa, como a constância de viagens, a disponibilidade horária intensa, a imprevisibilidade de agenda, o comparecimento a eventos diversos, dentre outros. Mas, para Noemia Porto, há outras dificuldades ou bloqueios mais sutis, porém, não menos relevantes, como a ausência das mulheres nos ambientes em que as alianças políticas, a rede de conhecimentos e o desenvolvimento da liderança acontecem. “Também atua como inibidor a consideração sobre o atributo de exercer a liderança como tipicamente masculino, carregado de estereótipos como coragem, racionalidade e equilíbrio”, completou a magistrada.
O cenário, esclarece Noemia Porto, passa pelas dificuldades de compreensão sobre a inexistência de uma única e correta lógica de pensar a esfera política. Mulheres e homens, exemplificou a presidente, compreendem e atuam em tal esfera social de modo diverso, mas o ‘jeito masculino de liderar’ ganha prestígio e visibilidade, com estranhamento para as mulheres que são ‘julgadas’ por suas supostas impaciências, fraquezas ou ingenuidades. “A igualdade desafia aceitar e valorizar as diferenças entre mulheres e homens e seus diferentes papéis que livremente possam assumir na sociedade, mas sem que essa diferença sirva de justificativa para tratamentos jurídico, social, econômico e e/ou político que coloquem as mulheres em patamares de subcidadania ou de desvantagem”.
Para a presidente da Amatra 6 (PE), Laura Botelho, a exposição da presidente Noemia Porto escancarou o grave deficit de representatividade feminina no movimento associativo, ao destacar que é a quarta presidente mulher em 43 anos de história da Anamatra, realidade que também se verifica no âmbito da Amatra 6 (PE), eis que figura como quinta presidente mulher na longa história de 45 anos da associação regional. “Esse cenário vem se alterando pela maior ocupação feminina nos espaços políticos, sendo certo que debates como o de hoje contribuem para que o futuro reserve um cenário mais inclusivo e plural”, aponta a presidente da Amatra.
Exemplo do Recife – Um dos destaques da “live” foi a apresentação de vídeo institucional, produzido pela Prefeitura do Recife, em que o município anuncia a nova marca de sua gestão. O brasão oficial da cidade passa a simbolizar a paridade de gênero: ao invés de dois leões, o símbolo traz um leão e uma leoa. O vídeo também destaca o fato de as mulheres serem maioria no serviço público da capital, além de metade das secretarias da Prefeitura serem lideradas, pela primeira vez, por mulheres.