Evento segue até esta quarta (2/12), com transmissão pelas redes sociais da Anamatra
“O direito fundamental ao trabalho digno no universo dos algoritmos e das plataformas digitais”. Esse foi o tema da mesa de debates que abriu a programação do webinário “Direito Fundamental ao Trabalho Digno no Século XXI – Desafios e Ressignificações Para as Relações de Trabalho na Era Digital”, nesta terça (1º/12).O evento, que segue até amanhã, é transmitido pelas redes sociais da Anamatra (Facebook, Instagram e YouTube). Clique aqui e saiba mais sobre a abertura do evento.
O painel de abertura contou com a participação do ministro do Ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Luiz Alberto Bresciani e do desembargador aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3/MG) Márcio Túlio Viana, sob a mediação da advogada e professora da UnB Gabriela Neves Delgado. O ministro Bresciani trouxe reflexões a respeito dos impactos da inteligência artificial no mundo do trabalho. “O novo normal refundou o desemprego master, estabeleceu protocolos de vida vinculados à tecnologia e nos segregou a todos. Essa é a realidade”, apontou.
Já o desembargador Márcio Túlio Viana abordou o tema central sob a ótica sindical, fazendo uma análise temporal, destacando os desafios que enfrentam os sindicatos na atualidade. Para Viana, o sindicalismo vive uma crise, juntamente com o Direito do Trabalho, e precisa se reinventar para sobreviver. “Os sindicatos, para voltarem a unir as pessoas, precisam ser mais democráticos horizontais e sempre dispostos a mudar, no mesmo ritmo frenético de tudo, sempre criando novas táticas, exercitando sempre a autocrítica. Terá que viver o presente e distribuir coisas do presente”.
Na mesa seguinte, a mestranda em Direito da UnB Raianne Liberal mediou a discussão sobre o “Trabalho por aplicativos: o ciclo de expansão do capital no século XXI e a contraposição necessária pelo direito fundamental do trabalho digno”, que reuniu o ministro do TST Augusto César Leite de Carvalho e o professor da Universidade do Estado de Mato Grosso Murilo Oliveira Souza. O ministro falou do seu entendimento sobre a concepção quanto ao tempo, cada vez mais escasso na atualidade, especialmente para os trabalhadores por aplicativos. “É relevante notar como o gerenciamento algorítmico faz lembrar as lições do taylorismo para o sistema fordista de produção, que se sustenta pelo conhecimento do gestor pelo processo do trabalho, a concentração desse conhecimento como concentração exclusiva da gerência e o uso desse monopólio sobre o conhecimento para controlar cada passo desse processo de trabalho”, alertou.
Já o professor Murilo Souza, entre outros aspectos, discutiu o atual contexto de crise estrutural, na qual a expansão do capital se mostra por meio da gradativa redução da proteção social, tendo como recorte os vínculos precários formados pelas empresas de aplicativo. O docente citou estudo realizado pela professora Gabriela Neves Delgado, que apresenta possíveis mecanismos para frear o referido processo. “Precisamos construir estratégias para ressignificar, do ponto de vista valorativo, as normas que compõem as normas do direito”, defendeu.
Subordinação e desconstitucionalização - A readequação do conceito de subordinação jurídica para o trabalho em plataformas digitais foi o tema do painel com a participação do ministro aposentado do TST Pedro Paulo Manus e da advogada e professora universitária Ruth Manus, com a mediação de Ricardo Britto Pereira, subprocurador-geral do Trabalho aposentado. Entre outros aspectos, o ministro falou da importância de se observar os primados básicos do Direito do Trabalho, da dignidade da pessoa humana, dos princípios fundantes da República e de se entender que os trabalhadores são todos e não apenas os formais. “Não é possível descurar o conceito de subordinação e sua adaptação para as novas formas de trabalho. É preciso pensar nas pessoas e não nos empregados”, defendeu.
Para a professora Ruth Manus, o cenário da pandemia apenas intensificou o trabalho remoto, que era algo já previsto. “Nunca ficou tão evidente o fato de que estamos vivendo em um mundo integrado, globalizado e com uma profunda interdependência entre os países. Vivemos um processo informal de integração global há muito tempo. E a era digital é a maior prova disso”. Nesse cenário, segundo a docente, as reformas trabalhistas, com foco na precarização dos direitos sociais, são feitas em nome da competitividade e da abertura de mercados. “As respostas locais para problemas digitais não são suficientes. Existe uma necessidade de uniformização do conceito de subordinação”. Para Ruth Manus, faz-se necessário uma atuação internacional em torno do tema, por exemplo, não só pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), mas também com a Organização Mundial do Comércio (OMC).
A programação do primeiro dia do webinário foi encerrada com debate sobre o capitalismo de plataforma, uberização e a desconstitucionalização do trabalho digno, que reuniu o juiz do trabalho e professor da UnB Paulo Blair e Ricardo Festi, professor da Faculdade de Sociologia da UnB. A mediação coube à diretora de Assuntos Legislativos da Anamatra, Viviane Leite que abriu o painel falando da importância do evento. “É um tema que deve ser discutido à exaustão diante da realidade que estamos vivendo, com a ideia de que há um novo formato para as relações de trabalho em substituição ao modelo tradicional”. Nessa realidade, o que se verifica é uma tentativa de se “adjetivar essas novas formas de trabalho como empreendedorismo”. Os diversos projetos de lei que dispõem sobre o tema, alertou, em sua maioria, sequer aventam a possibilidade de reconhecimento do vínculo empregatício ou garantia de direitos fundamentais mínimos.
Blair falou que o cerne da discussão em torno do trabalho do mundo digital é a preocupante desconstrução e desconstitucionalização, a partir de uma redefinição de categorias, que passa pela ideia de que o trabalhador é, na verdade, muito melhor atendido, se tiver a condição de alçar à condição de igualdade para com o status de empreendedor. “Esse discurso é perverso, pois estabelece como ilusão a ideia de que o microempreendimento possa fazer frente às necessidades de subsistência básica em uma sociedade igualitária. A sociedade igualitária está preparada para a concentração de renda e não para a sua distribuição”. Sobre a era digital falou da naturalização da ideia de que o trabalho subordinado é negativo. “Essa desconstrução transcende a pauta da proteção mínima necessária aos trabalhadores de plataformas. A proteção passou da hora, do momento, do contrário nós não conseguiremos romper o casulo do Direito do emprego se tornar, de fato, o Direito do Trabalho”.
O professor Ricardo Festi, que coordena da Unb projeto de pesquisa coletiva Mundo do Trabalho na Era Digital, falou do tema abordado em seu livro “Uberização, trabalho digital e Indústria 4.0”. A publicação traz artigos de pesquisadores e pesquisadoras, brasileiros e estrangeiros, que investigam, em diferentes setores, os impactos sociais decorrentes da expansão do universo maquínico-informacional-digital. Ao revisitar o tema abordado em artigo de sua autoria que integra a obra, o professor falou do debate atual em torno do vínculo empregatício para os trabalhadores de plataformas digitas, que ganha novas dimensões. “A pandemia exacerbou a crise colocada no mundo do trabalho e esse setor se expôs demais e viu contradições, inclusive sob o discurso do empreendedorismo”.
Confira a íntegra da programação desta terça: