Direito precisa se adequar aos ensejos sociais, afirma presidente da Anamatra

Juíza Noemia Porto participa de webinário para discutir as audiências telepresenciais e o direito ao acesso à Justiça

 

“O princípio do acesso à justiça, nos tempos atuais, concretamente, revela a necessidade da adequação do direito aos ensejos sociais”; A afirmação foi feita pela presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, no webinário, promovido pela Rede Lado, nesta quinta (2/7), para discutir as audiências telepresenciais e o direito ao acesso à Justiça. Além da transmissão pela Rede, o evento foi veiculado, ao vivo, no canal da TV Anamatra no Youtube e na fanpage da Associação no Facebook.

Para a juíza Noemia Porto, o pano de fundo das reflexões sobre o acesso à Justiça é o direito de acesso a uma ordem jurisdicional justa e efetiva. Na avaliação da presidente, é preciso indagar o papel da advocacia na promoção desse equilíbrio de forças entre trabalhadores e empregadores, incluindo a questão do acesso digital. “Não se trata apenas do Judiciário disponibilizar os meios. O sistema de justiça é formado por todos os seus atores: magistrados, advogados, partes, procuradores, sindicatos, instituições formais”.

Também é necessário se discutir, segundo a presidente, a questão da morosidade judiciária. “Gostemos ou não, com esse novo tempo, o fato é que a reelaboração do uso dos recursos tecnológicos pode, sim, influenciar positivamente no combate à morosidade judiciária”. Noemia Porto explicou que a informatização da Justiça do Trabalho, com índice de quase 100%, representa um avanço para esse ramo, por exemplo, na questão da investigação patrimonial. Para a presidente, não se trata de “endeusar os recursos tecnológicos, que podem ter um custo humano muito grande”, mas de não negar que a lógica das atividades jurisdicionais já precisava ser revista há algum tempo.

A presidente criticou ainda o retardo na prestação jurisdicional por atos procrastinatórios. “O custo é, sem dúvida nenhuma, suportado por aqueles que mais precisam da justiça, os mais vulneráveis, os trabalhadores. Eles precisam da audiência, da conciliação, da sentença,”. Na mesma linha, reprovou o excesso de rigor instrumental nas práticas processuais. “O processo do trabalho nasceu simples e precisa permanecer simples. Em algum momento, nós nos perdemos e passamos a nos agarrar ao rigor como uma tábua da salvação da segurança jurídica. Voltar às nossas origens, com um processo simples, oral, falado, talvez seja o grande resgate de identidade que nos cabe neste momento’’.

Outro problema que precisa ser considerado, na visão da presidente da Anamatra, é a intensificação do uso dos meios tecnológicos como modo de preservar o isolamento social e de não bloquear o acesso à justiça. “Essa experiência que foi intensificada traz entusiastas de todas as formas. Alguns chegam a dizer que será a Justiça do futuro, como legado destes tempos difíceis. É inegável que algumas práticas, que foram aceleradas pelas necessidades presentes, podem revelar ganhos para o futuro, dentre elas o recebimento de defesa antes da audiência, o que encontrava resistência em alguns tribunais”.

Desigualdade – Ao final de sua exposição, a presidente da Anamatra falou do uso da tecnologia em um cenário em que a inclusão digital não é igualitária e tampouco completa em todo o país, sendo para a realidade das partes, seja no que concerne às testemunhas e mesmo aos advogados. “Essa constatação indica um alerta: o instrumento, e suas potencialidades, pode servir como marco para avanços no Poder Judiciário, mas sempre será um problema se, como instrumento, for imposta a sua generalização para o período pós-pandemia”.

A presidente também falou da importância de se refletir sobre o acesso à Justiça daqueles trabalhadores e tomadores de serviços ou empregadores que desejam buscar a Justiça pessoalmente, sem constituir procuradores, especialmente aqueles que sequer dispõem de recursos para os contratar, por exemplo, na justiça itinerante e por meio do “jus postulandi”.

Segundo Noemia Porto, o jurisdicionado mais carente não tem o seu problema de acesso à uma jurisdição justa resolvido no momento da pandemia e nem sem ela, pois ele mal acessa o prédio da Justiça. “Se não olharmos para os mais vulneráveis, deixaremos muitos dos necessitados para trás. Não é só fazer audiências de instrução, ou seja, o debate não pode se resumir a isso. Temos que nos perguntar como podemos auxiliar na inclusão digital para aqueles que precisam do Poder Judiciário como forma de acesso a direitos”.

Noemia Porto também emprestou destaque à independência judicial como fator a ser respeitado, enquanto elemento essencial que decorre do paradigma do Estado Democrático de Direito.

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