Vice-presidente da entidade analisa impactos dos contratos precários, previstos na Lei 13.467/2017
A Anamatra, representada pela vice-presidente, Noemia Porto, participou nesta quinta-feira (22/2) de audiência pública na Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho para discutir as normas destinadas à tutela (proteção) do trabalhador. O foco do debate foi a relação de emprego, abordando questões como direito ao emprego decente, responsabilidade patronal e formas de rescisão do contrato de trabalho.
Em sua intervenção, a magistrada destacou a necessidade de diálogos como este, ou seja, que estejam voltados a pensar sobre as possibilidades que se abrem para o futuro. “São debates produtivos, pois é preciso considerar o fato concreto de que a Lei nº 13.467/2017, conhecida como reforma trabalhista, foi aprovada, e na sua aplicação já se notam sinais agressão aos direitos sociais, como é o caso das notícias reiteradas de demissões em massa, sem a contrapartida de geração de empregos decentes”. A magistrada ainda referiu que, a partir desta constatação, é necessário que "se pense, e que se comece a trabalhar a sério, num outro modelo de mercado de trabalho, que possa ser verdadeiramente inclusivo.
Para a juíza, diante da ameaça aos direitos dos trabalhadores, a suspensão da votação da reforma da Previdência (PEC 287/17), nesta semana, foi uma vitória. “Nós, cidadãos, temos sentido uma imensa pressão sobre os direitos sociais considerados básicos, como saúde, educação, proteção ao trabalho, previdência e assistência. Por isso, talvez uma das poucas boas notícias dos últimos meses tenha sido essa, a de que a PEC da Previdência não está mais em nosso horizonte”. Isso ocorreu, conforme destacou a magistrada, “em razão do poder de articulação de diversas entidades, incluindo a Anamatra, que defenderam o direito constitucional a uma previdência verdadeiramente pública e capaz de assistir, de forma justa, a todos os que dela necessitam”.
Contratos precários - Sobre o tema da audiência, Noemia Porto destacou que a Constituição deixa clara a opção por uma política de emprego. “A existência de contratos precários viola a perspectiva constitucional de uma opção por este regime. A defesa do meio ambiente do trabalho - com a mesma rigidez com que nós defendemos o meio ambiente natural e cultural – tornou-se, recentemente, uma urgência. Além disso, tem-se a questão da proteção contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, reconhecendo-se que o Brasil é um dos últimos países, do capitalismo avançado, que ainda aceita a chamada denúncia vazia dos contratos”.
Sobre o trabalho intermitente, a magistrada disse que este regime atua contra uma política consistente de emprego. “Na 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, realizado ano passado pela Anamatra em parceria com outras entidades, este foi um dos itens que gerou ampla discussão, havendo enunciado que não apenas aponta para a inconstitucionalidade da previsão, como ainda outro que alerta para a ilegalidade da contratação de trabalhadores supostamente intermitentes, a pretexto de trocar ou substituir trabalhadores que vinham observando a chamada escala móvel de trabalho. A Lei 13.467 precisa ser analisada pela ótica constitucional e não o reverso”, opinou.
Noemia Porto também ponderou a responsabilidade patrimonial do empregado, que se alia à problemática dos contratos precários. “Na mesma medida do aumento dos trabalhos precários e a da desfiliação social dos trabalhadores, a tendência é a da degradação do meio ambiente, com o aumento dos acidentes de trabalho, doenças profissionais e sofrimento dos trabalhadores. Diante desta realidade, é necessário trabalhar com um reforço instrumental da responsabilidade civil dos empregadores em relação ao tipo de meio ambiente de trabalho que oferecem aos trabalhadores”.
A vice-presidente destacou ainda a questão da dispensa arbitrária ou sem justa causa, o que vai de encontro à previsão da Constituição de 1988 de proteger, de forma efetiva, contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa. “Dispensar o trabalhador, pagando certos valores, mas sem comunicar, de forma transparente, a razão pela qual está sendo levado a uma situação de desemprego, viola o devido processo legal no plano contratual. Esta prática, ainda, pode acobertar dispensas que ocorrem por postura antissindical ou de natureza discriminatória, já que o empregador não precisa dizer a razão de demitir o trabalhador. Agrava esta situação a adoção do regime de trabalho intermitente, que fragiliza esta proteção ainda mais”, pontuou.
Normas internacionais - A vice-presidente lembrou que o Brasil voltou, neste ano, ao cenário dos casos que serão analisados pela Organização Internacional do Trabalho, durante a Conferência anual que acontecerá em Genebra em final de maio de 2018. “O Brasil já figurou dentre esses casos em 2017, por possível violação a normas internacionais do trabalho, dentre elas a Convenção nº 98 da OIT. Agora o país está novamente no relatório dos peritos da OIT e merece destaque o fato de que não temos mais um projeto de lei, mas, sim, uma lei aprovada - a Lei 13.467/17”, observou.
A vice-presidente também reforçou que o relatório do Comitê de Peritos da OIT faz referência aos contratos precários (autônomo, parceiro, intermitente, etc), que violam a mesma Convenção nº 98, sobre autonomia sindical e sindicalização dos trabalhadores. “Quanto mais contratos precários tivermos, o que estará verdadeiramente em curso é um processo de desprofissionalização e de dessindicalização dos trabalhadores, o que atinge a identidade coletiva e a solidariedade entre eles, que seriam fundamentais para a luta por melhores condições de vida e de trabalho”.
Sugestões - Na contribuição para uma possível compilação para o Estatuto do Trabalho, a magistrada mencionou dois projetos (PLs 5353/09 1128/11) que, segundo ela, podem auxiliar o Parlamento no futuro. O primeiro projeto define a questão das dispensas coletivas, e o segundo confere balizas que protegem os empregados públicos contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa. “Há se retomar, em algum momento, essa lógica da proteção à totalidade dos trabalhadores, e não apenas aos empregados; o regime de emprego precisa se incorporar à linguagem do Parlamento, do Judiciário e do Executivo; o incremento da responsabilidade civil dos empregadores pelo meio ambiente de trabalho deve-se afirmar com uma responsabilidade objetiva; e, por fim, é fundamental avançar na direção de uma efetiva proteção contra a dispensa”, finalizou.
Sobre a Subcomissão - Presidida pelo senador Telmário Mota (PTB-RR), a subcomissão foi instalada em agosto de 2017. É composta por três senadores titulares e três suplentes e conta com o auxílio de um grupo de especialistas da área. O colegiado funciona no âmbito da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e tem o objetivo de criar um Estatuto do Trabalho para substituir a construção de uma nova Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), legislação essa que foi alterada recentemente pela chamada “Reforma Trabalhista”.
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Reunião - Sobre o mesmo tema, também no dia de hoje, a Anamatra participou, no Senado Federal, da reunião da audiência sobre o Estatuto do Trabalho. O diretor de Assuntos Legislativos da entidade, Paulo Boal, apresentou aos presentes aspectos processuais da proposta de norma, elaborados pela entidade. O senador Paulo Paim, que coordenou o evento, ressaltou e agradeceu o "belíssimo trabalho da Anamatra".