Professor fala dos limites da terceirização na França e do papel do Direito diante dessa realidade

Intervenção fez parte da programação do 9º Congresso Internacional da Anamatra

A terceirização da mão de obra, realidade mundial no panorama das relações trabalhistas, foi tema da intervenção do professor da Universidade de Paris Cyril WOLMARK, na tarde dessa terça-feira (21/2), no 9º Congresso Internacional da Anamatra. A mesa foi presidida pelo diretor de Informática da Anamatra, Rafael Nogueira, e pela diretora de Formação e Cultura da Anamatra, Silvana Abramo. 

No início de sua intervenção, o professor falou das grandes linhas gerais que, segundo ele, identificam o lugar da terceirizaçao no Direito francês. “O Direito do Trabalho construiu um grande número de regras a partir da valorização do capital”. O acadêmico explicou que a prática é caracterizada pelo controle do ciclo de produção, a unidade entre a empresa e a forma jurídica que a enquadra, a relação bilateral entre o trabalhador e aquele que utiliza a força de trabalho, e a autonomia jurídica das empresas terceirizadas. 

Para WOLMARK, o Direito na atualidade vem abordando a terceirização em três direções: a que separa o que é legal do que não é, a atribuição das responsabilidades nessa relação e a recolocação da qualificação jurídica. “O Direito acompanha essa liberdade na organização dessa produção”, explicou. Na França, a terceirização é permitida em todas as atividades da empresa. “Há limites mínimos à liberdade de organização, contudo há regras para coibir a terceirização fraudulenta. Nesse ponto, deu como exemplos a contração de empresa terceirizada não especializada para a atividade para a qual foi contratada, a intervenção do tomador de serviços na relação contratual (dando ordens diretas ao trabalhador), e o não pagamento das cotas sociais. 

Segundo o palestreante, outro dispositivo legal francês que ampara esses trabaladores é o da necessidade da continuidade no emprego. “Quando a atividade passa de uma empresa para a outra os contratos são, automaticamente, mantidos. Há uma estabilidade independentemente do empregador”, explicou. Outra regra a ser respeitada é da representação sindical. A questão da saúde do trabalhador terceirizado também é uma preocupação do Direito francês, que conferiu ao tomador de serviços a responsabilidade pelo descumprimento das normas dessa natureza. 

Já o “empréstimo de mão de obra” de um empregador para o outro é proibido. “Uma pessoa não pode usar o emprego de um trabalhador e vender a outro. As relações têm de ser sempre bilaterais”, explicou. Há exceções a essa regra, a exemplo das agências de modelos e das “relações triangulares” de trabalho, que têm o objetivo de ajudar empresas com pequenas estruturas a contratar trabalhadores, garantindo a segurança dos mesmos.

Controle pelo Direito do Trabalho - “É o Direito do Trabalho que decide o que é legal ou ilegal”, pontuou WOLMARK. Também é ele quem atribui algumas responsabilidades na área da terceirização. “Nós ultrapassamos a relação entre trabalhador e empregador e rompemos com a geografia jurídica da empresa”. O professor explicou que há três mecanismos para esse controle: de erro, de garantia e de vigilância. 

O mecanismo de erro prevê a responsabilidade da tomadora de serviço se a terceirizada cometeu um determinado erro. A garantia determina que a empresa tomadora é a responsável pelos direitos fundamentais dos trabalhadores, que podem recorrer à tomadora de serviço, por exemplo, para receber salário não adimplido. Também é a empresa tomadora a responsável pelo respeito às regras de saúde e segurança.  Já o mecanismo de vigilância, prevê um sistema de “alerta” onde há a possibilidade de denúncia por parte da tomadora de serviço ao sindicato, caso identifique irregularidades por parte a empresa de terceirização. “Se a empresa tomadora nada fizer, ela pode ser responsabilizada pelos prejuízos ao trabalhador e também ao meio ambiente”.  A lei também deve intervir nos casos em que houver um “envolvimento anormal” entre a tomadora e o trabalhador, avaliando as características dessa relação e podendo, se for o caso, integrar esse trabalhador como efetivo. 

Ao final de sua exposição, WOLMARK falou da plataforma digital Uber e de algumas regras do Direito do Trabalho francês dirigidas a esses trabalhadores, a exemplo da previsão do pagamento do seguro de acidente de trabalho pela empresa e da liberdade de criar sindicatos, com a ausência de represália em caso de greve. 

 Ao final de sua exposição, professor citou as três correntes doutrinárias que se dirigem aos trabalhadores terceirizados: a tentativa de melhorar a transição entre um trabalhador efetivo e um terceirizado, mantendo alguns direitos, a criação de um estatuto do trabalhador que seja parasubordinado e de uma base de direitos para esses trabalhadores. 


* Texto produzido com a colaboração da juíza Rosemeire Fernandes, presidente da Amatra 5 (BA). Confira abaixo comentário da magistrada sobre os principais aspectos da palestra:

"Ficou evidente que a regra basilar é a liberdade da organização produtiva, inclusive para a prática da terceirização. Todavia, esta liberdade não é absoluta e cabe ao Direito estabelecer os marcos legais. A terceirização é considerada ilícita, por exemplo, quando a contratada não traz know how próprio para agregar à contratante e quando consiste no mero empréstimo de mão de obra ou, quando há anormal interferência do tomador dos serviços na execução do contrato."


Foto: Alexandre Alves
 

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