Procurei nos gramáticos e não encontrei o sufixo "log", mas isto deve ter por explicação o fato de que a língua portuguesa não esteja conseguindo acompanhar os constantes avanços da modernidade, o que, aliás, é oportuno para pôr em questão a viabilidade de se manterem as regras gramaticais. Ora, já que a economia não suporta o formalismo da língua portuguesa por que se deve perder tempo estudando língua portuguesa? O que importa é "estar indo" em frente para "ir ficando bem" posicionado economicamente...
Pois bem, o que os gramáticos ainda não sabem é que surgiu um novo sufixo na língua portuguesa, o sufixo "log", que tem como função alterar a identificação do objeto, embora o objeto continue sendo exatamente o mesmo. Assim, há a água e a agualog, as duas compostas por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio, mas para algumas situações, como matar a sede, usa-se água, para outras, como lavar carro, usa-se agualog, para que ninguém tenha peso na consciência de usar tão valioso elemento da natureza, essencial para a sobrevivência humana, deixando o seu carrinho mais bonito.
Claro, este novo sufixo, rapidamente, passa a ser incorporado ao mundo do direito, como forma de se mascarar a essência das relações jurídicas. Quem lançou a idéia foi a VARIG, que agora não é mais VARIG, é VARIGLOG. Com isto, dizem os adeptos da corrente da adaptação das regras gramaticais e dos institutos jurídicos à modernidade, quem tinha alguma relação jurídica com a VARIG não a mantém com a VARIGLOG, que são coisas distintas. Se alguém tinha uma dívida com a VARIG nenhuma relação jurídica possui com a VARIGLOG. Claro, não se diz isto assim de forma tão ampla, na verdade, tenta-se fazer crer que os ex-empregados da VARIG, que foram dispensados, sem receber seus direitos, não podem buscar o adimplemento desses direitos perante a VARIGLOG, devendo fazê-lo apenas com relação à VARIG. Ou seja, se quiserem lavar carro, terão que usar agualog.
Dizem que isto é necessário para preservar a continuidade da atividade empresarial que era desenvolvida pela "antiga" VARIG. Não se diz que a VARIG não tem dinheiro para arcar com os débitos trabalhistas e que a VARIGLOG tem, mas isto faz parte do jogo da recuperação da empresa. Aliás, vale reparar, os ex-empregados, que foram alijados da empresa, com a qual contribuíram com seu trabalho durante vários anos, são "convidados", sem opção de recusa, a colaborar com a recuperação da empresa. É com o dinheiro desses ex-empregados que a VARIGLOG tenta se reerguer. Na concepção jurídica que se criou, mais ou menos na linha do sufixo log, passa a existir a proteção dos "direitos humanos" da empresa que se põem em posição superior aos direitos humanos do trabalhador. São os "direitos humanoslog" (aqui o sufixo log é utilizado com o sentido de potencializar o sentido do mesmo nome. Para se ver que, futuramente, os dicionários trarão o sufixo com mais de um significado).
É evidente que não se precisa ir muito longe com argumentos de ordem lógica e jurídica para demonstrar a falácia de tudo isto, mas é importante verificar que não se trata apenas de uma falácia, trata-se de uma agressão à inteligência das pessoas, pelo menos daquelas que não se transformaram ainda em pessoaslog.
Aliás, por falar nisto, já pensaram que interessante, pessoas, que são devedoras de obrigações de pagar junto a Bancos, locadores de imóveis, lojas do comércio, companhias aéreas etc, indo ao Cartório de Registro Civil para alterarem os seus próprios nomes, acrescentando a estes o sufixo log, e, assim, obtendo como resultado deixarem de ser sujeitos passivos da obrigação, ou seja, em português bem claro, não deverem mais nada a ninguém. O José da Silva, que não recebeu suas verbas rescisórias da VARIG, e que por isto ficou devendo ao Banco, ao supermercado, às Casas Bahia, ao condomínio, ao clube etc., pode livrar-se das dívidas; basta que mude seu nome para José da Silvalog.
* Juiz do Trabalho, titular da 3a. Vara de Jundiaí e professor de Direito do Trabalho da USP.