O Conselho Nacional de Justiça
lançou no dia 23/08 o Movimento Nacional pela
Conciliação, convocando todo o Poder Judiciário a um
esforço concentrado em favor da Conciliação em Juízo.
A Justiça do Trabalho que trouxe em sua gênese o
espírito conciliatório poderá aproveitar o o clima
causado por este movimento nacional e investir no
aprimoramento do instituto através do treinamento dos
Juízes e outros servidores aptos a desempenhar o papel
de Conciliadores. A mediação, desenvolvida
internacionalmente como forma alternativa de solução de
conflitos, conta com vasta doutrina e instrumentos
práticos e eficazes compatíveis com a prática da
conciliação judicial que podem e devem ser
aproveitados no aprimoramento desta resultando no que
podemos chamar de mediação conciliatória. Não obstante
a primeira idéia sobre a conciliação seja desafogar o
Poder Judiciário, a condução apropriada da mesma, pode
propiciar resultados que vão muito além deste mister,
podendo inclusive, produzir efeitos construtivos e
transformadores nas partes, provocando mudanças de
atitudes e alcançando o fim social da pacificação.
O objetivo da conciliação não deve ser o ACORDO, o
acordo, na verdade é a consequência natural da
conciliação. Daí a necessidade de uma releitura da
conciliação anteriormente vista sob o ditado, "mais
vale um péssimo acordo do que uma boa sentença". Eu
diria que mais vale uma conciliação, ainda que não
resulte imediatamente em acordo. Para viabilizar uma
conciliação saudável é necessário pensar no conflito e
o que está implícito na lide.
A ação trabalhista , como primeiro passo para a
sistematização da lide, nem sempre traz expresso o
conflito em que se funda. Sào diveras as razões que
motivam a propositura da ação pelo titular do direito
material, ou seja, o fato motivador da procura do
advogado e/ou da Justiça e estes, dentre outros podem
ser: a) inconformismo com a dispensa; b) necessidade de
dinheiro, c) busca dos direitos; d) necessidade de
compensar injustiças, ofensas ou danos sofridos; d)
sentimento de que foram enganados, e) expectativas
fundadas em suposições decorrentes de informações
falsas ou verdadeiras, etc.. O conflito implícito em
uma ação trabalhista possui dimensões internas e
externas, pois além de estar presente dentro das
partes se exterioriza em busca de solução ou
compensação através do Judiciário.
Em uma primeira vertente o conflito pode parecer negativo mas dependendo como for manejado pode ser surpreendentemente positivo, daí a importância do papel do Juiz/Conciliador diante do conflito e a visão que este tem sobre o mesmo, para conduzir as partes a uma conciliação. Se o conflito for tratado de forma ruim, pode levar a desconfiança, ansiedade e insatisfação própria ou com os outros. Por outro lado, se for manejado com experiência e criatividade, o conflito pode trazer benefícios para todos, podendo estimular o interesse, aprimorar a comunicação, aumentar a produtividade e trazer mudanças sociais.
O primeiro passo para manejar bem um conflito é a percepção de que ele pode trazer mudanças positivas tanto para os individuos, quanto para as organizações de tal forma a transformar o sentimento sobre o mesmo, explorando o que ele pode agregar às partes envolvidas. Ao mediador/conciliador cabe inicialmente auxiliar as partes a entenderem que possuem um conflito que deve ser resolvido, aceitarem que o ponto de vista de cada um pode estar incompleto e distorcido, relembrarem que é necessário ouvir e tentar entender o ponto de vista do outro (ou empresa) e respeitar suas necessidades e problemas para conjuntamente encontrarem a melhor e mais viável solução.
A audiência inicial realizada no processo do trabalho e a audência conciliatória realizada no processo civil, podem ser mais, ou menos, útil dependendo da forma em que for conduzida e da capacidade do conciliador de tranformar o espírito da litigação em espirito conciliatório, para isto é necessária a mudança de algumas práticas e dogmas incrustados no espirito da litigação. A primeira é a criação de um ambiente de diálogo, onde não só o juiz e os advogados se manifestem, mas haja um convite às partes para expressarem suas razões relativas ao conflito sem medo ou receio de entregar o "jogo". Saliente-se que este diálogo exige a simplificação da linguagem, dentro da esteira já defendida pela Associação dos Magistrados Brasileiros. Outra prática que deve ser mudada é o medo de entrar no mérito sob suspeita de pré-julgamento, a mediação conciliatória, quer dizer, mediação em juízo, deve ser feita à sombra da lei e da jurisprudência, as partes podem conversar sobre o mérito e as perspectivas de sucesso para decidirem sobre suas propostas sem a necessidade do juiz mediador emitir seu Juízo.
O papel do conciliador deve ser,
inicialmente, o de criar uma atmosfera de diálogo,
onde as partes se sintam em equilibrio e livres para
discutir o conflito a ponto de analizá-lo
reciprocamente sob a perspectiva do outro e criarem as
possíveis soluções, ainda que sob a perspectiva de um
julgamento futuro pelo judiciário e com as informações
necessárias sobre a duração do rito processual e seus
recursos. A demora processual não deve ser um meio de
pressão para se obter o acordo, mas as partes deverm
ter consciência de todas as opções e caminhos que
dispõem diante da lide, para que assim possam tomar as
próprias decisões. O Conciliador deve abster-se
momentaneamente de expressar seu valores e convicções
para ouvir e adentrar ao universo das partes,
auxiliando-as na percepção do que elas entendem como
melhor para elas e qual o caminho para alcançar. A
posição do Juiz/conciliador deve ser a de permitir que
primeiramente as partes explorem as possíveis
soluções, podendo até formular sua proposta, mas no
momento certo, ou seja após o debate entre estas, já
que a proposta do Juiz, tanto pode ajudar, como
dificultar a conciliação e o consequente acordo.
O treinamento aliado à prática mostrará ao
conciliador a amplitude de um mundo inexplorado dentro
deste universo e a importância de seu poder que pode
ser dirigido a desenvolver o poder das partes de
solucionarem seus próprios conflitos de forma eficaz
com o auxílio e orientação do Estado conciliador. A
forma de lidar com o conflito pode ser chamada de
gerenciamento e os métodos deste gerenciamento em
equilíbrio pode levar a resultados surpreendentes como
a desistência da ação, a alteração do pedido, a
formulação de caminhos gradativos para a solução, o
entabulamento de acordo, etc., fazendo emergir o
verdadeiro conflito e melhor solução. A mediação
conciliatória, permite em vários casos, que as partes
encontrem prestação jurisdicional através da
construção da resposta ao conflito, sem abrir mão de
suas pretensões, inicialmente opostas, mas construindo
um caminho mais satisfatório do que suas pretensões
iniciais.
Existem várias formas de prestação jurisdicional e o Judiciário pode abranger várias delas, existem lides que devem ser julgadas e existem outras que o julgamento não soluciona, pode até aumentar o conflito, nestas, o Judiciário deve agir como Mediador e educador ajudando os indíviduos a serem cada vez mais capazes e independentes, inclusive no que concerne a seus próprios conflitos. O ambiente processual pode ser um espaço de atuação das partes, sob o comando do Juiz, que mantém o controle da legalidade e o poder da execução, para a busca, não só da solução da lide e efetividade do processo, mas da transformação do conflito em atributo de transformação social.
* Regina Maria Vasconcelos Dubugras - Juíza do
Trabalho da Segunda Região - São Paulo