As decisões monocráticas do STF (Supremo Tribunal Federal) que afastaram a competência da Justiça do Trabalho sobre ações trabalhistas e fraudes acabaram prejudicando relações de trabalho.
Essa é uma das conclusões de pesquisa divulgada nesta quinta-feira (5), pela Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) e o Grupo de Pesquisa e Extensão Trabalho além do Direito do Trabalho, vinculado ao Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo).
O estudo foi apresentado durante o seminário Jurisdição Constitucional e Competência Material da Justiça do Trabalho: 35 anos da Constituição de 88, realizado pela Anamatra na Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, na Barra Funda, em São Paulo.
A pesquisa analisou decisões monocráticas do STF que afastaram a competência da Justiça do Trabalho para avaliar a temática de reconhecimento de vínculo de emprego.
Foram analisadas mais de 300 ações. Em parte delas, empresas que haviam perdido os processos encaminharam ao STF reclamações de que as decisões não deveriam valer porque as causas não eram de competência da Justiça do Trabalho. Em 85% desses casos, segundo a pesquisa, ministros, em decisões individuais, aceitaram as reclamações.
A incidência de reclamações constitucionais no STF afastando a competência a Justiça do Trabalho é crescente, explica o coordenador do Grupo de Pesquisa e ex-presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano.
"Tudo isso ocorre contrariando a jurisprudência do próprio STF, que historicamente vinha entendendo que as reclamações constitucionais não podem ser utilizadas como recursos 'per saltum', nem permitem revolver fatos e provas", afirma Feliciano.
Muitas vezes, são casos envolvendo fraudes, nas quais o STF termina por afastar a competência da Justiça do Trabalho sem considerar as questões fáticas, ou impropriamente as considerando em uma reclamação constitucional. Não raramente, outrossim, utilizam precedentes que não têm aderência ao caso concreto para afastar a aplicação do art. 114 da Constituição Federal.
Entre as ações analisadas pela pesquisa estão processos relativos a trabalhadores plataformizados, motoristas autônomos de cargas (MEI/ caminhoneiros), parceiros em salões de beleza, corretores de imóveis, médicos, representantes comerciais e advogados associados. O estudo também debate os fenômenos da "pejotização" e da terceirização.
Para a presidente da Anamatra, juíza do trabalho Luciana Conforti, os dados relevados pelo estudo corroboram a realidade de se defender e preservar a competência constitucional da Justiça do Trabalho pelo STF.
Segundo Luciana Conforti, o cenário impõe maior aproximação e diálogo institucional, a fim de que eventuais divergências interpretativas possam ser superadas e haja maior entendimento no cenário das transformações trazidas no mundo do trabalho com as tecnologias, além das novas configurações do trabalho.
O desafio é definir o melhor enquadramento jurídico, para que as essas trabalhadoras e trabalhadores não fiquem à margem de qualquer proteção. Os direitos sociais, afinal, estão previstos como cláusula pétrea na Constituição.
Seminário
O evento contou com o apoio institucional da Ejud 2, do TRT 2, da Associação dos Magistrados do Trabalho da 2ª Região (Amatra 2/SP), da Associação Nacional das Procuradoras e Procuradores do Trabalho (ANPT) e da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat).
Conduzido pela presidente Luciana Conforti e pelo juiz do trabalho Guilherme Feliciano, o seminário trouxe exposições dos pesquisadores e falas dos convidados: o professor da PUC-PR José Affonso Dallegrave Neto, a procuradora Nacional de Trabalho e Emprego da Advocacia-Geral da União (AGU), Mônica de Oliveira Casartelli, e o advogado Mauro Menezes.
Também integraram as exposições a presidente do TRT 2, desembargadora Beatriz de Lima Pereira, o presidente do TRT 15 (Campinas e Região), desembargador Samuel Hugo Lima, a desembargadora aposentada Silvana Abramo Ariano, vice-coordenadora da pesquisa, o subprocurador-geral do Trabalho André Royer Spies, a procuradora Vera Lúcia Carlos, da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, o presidente da ANPT, José Antonio Vieira de Freitas Filho, o presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de SP (AATSP), Afonso Paciléo, o diretor do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait)m Renato Bignami, e os representantes da Abrat e da Força Sindical, respectivamente, Otávio Pinto e Silva e César Augusto de Mello.
Pela Anamatra, também participaram do evento o vice-presidente, Valter Pugliesi, a diretora de Cidadania e Direitos Humanos, Patrícia Sant'Anna, o diretor de Formação e Cultura, André Dorster, o juiz Felipe Calvet, diretor de Informática, e o juiz Márcio Amaral, integrante do Conselho Fiscal. O presidente da Amatra 2 (SP), Bruno Perusso também participou do evento.