O chamado estoque de processos —volume de litígios à espera de solução— nas Varas do Trabalho de todo o país registrou a primeira queda em cinco anos. A retração foi de 6,4% em fevereiro deste ano.
Pode parecer pouco, mas desde 2014, ano em que a série histórica está disponível nos relatórios do TST (Tribunal Superior do Trabalho), o volume de processos crescia.
Entre 2014 e 2017, o estoque passou de 1,5 milhão para 1,8 milhão de processos. Ao final de fevereiro, porém, havia 1,7 milhão de ações no aguardo de sentença na primeira instância. No país, há 1.587 varas.
A redução do estoque ocorre principalmente por causa da queda no ingresso de novos processos. Entre dezembro e fevereiro de 2018, as varas receberam 48,3% menos ações em relação à passagem de 2016 para 2017 — 295,5 mil ante 571,5 mil. A reforma trabalhista entrou em vigor em novembro.
“Com a redução na entrada de novos processos, foi possível fixar uma agenda de trabalho mais racional, e isso se reflete no estoque”, diz Flávio Roberto Batista, professor de direito do trabalho da USP.
De acordo com Batista, o maior gargalo na Justiça do Trabalho é a fase de cumprimento da decisão judicial. “Com a queda de novos processos, somada à questão de a ação trabalhista, em geral, ser julgada na audiência, as coisas vão ficando em dia”, afirma Batista.
De janeiro a fevereiro, foram iniciadas quase 104 mil execuções —queda de 14,3% ante 2017— e encerradas 90,7 mil, uma redução de 7% em relação ao ano anterior. Fevereiro fechou com 2,6 milhões de execuções pendentes, recuo de 0,6% sobre o mesmo período de 2017.
A projeção entre os especialistas é que esse novo ritmo abre uma perspectiva positiva para o tempo de tramitação. “Nesse caminho, a Justiça do Trabalho vai desafogar em curto espaço de tempo”, diz o professor de direito do trabalho da FGV Direito SP Paulo Sergio João.
SEM PRESSAO volume menor de processos não significou, no entanto, que os julgamentos foram acelerados em igual proporção. Entre dezembro de 2017 e fevereiro deste ano, o juízes trabalhistas proferiram quase 2% menos sentenças. Os casos julgados caíram de 490,2 mil para 481,4 mil.
“A tendência seria produtividade maior tendo em vista a queda”, diz Orlando Antonio Mongelli Neto, do Mongelli e Ferraresi Advogados.
Para Noemia Porto, vice-presidente da Anamatra (associação dos juízes do trabalho), há insegurança quanto às novas regras. “A lei da reforma alterou mais de cem dispositivos da CLT, é um impacto estrutural na legislação do trabalho. Esse é um momento de cautela para todos”, diz.
Especialistas estimam, porém, que a redução de novos processos não se sustentará no longo prazo. “Haverá reequilíbrio. Hoje, muitas ações estão represadas nos escritórios”, diz Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht.
Procurado, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) disse que não iria se pronunciar.
'AÇÃO AVENTUREIRA'
Alterações na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que tornaram o trabalhador passível de responsabilidade por pagamentos como perícias e honorários de sucumbência —indenização para cobrir os custos da parte vencedora com advogados— ajudaram a reduzir “ações aventureiras” na Justiça, avaliam advogados da área.
“A situação ficou menos cômoda para o empregado em alguns casos, como no adicional de insalubridade. Antes, se o trabalhador pedisse adicional de periculosidade, por exemplo, e perdesse, tudo bem, era a empresa que arcava com o custo da perícia”, diz Nelson Mannrich, do escritório Mannrich e Vasconcelos e professor da USP.
“Agora, isso mudou, se o empregado solicitou e o perito não encontrou agente agressivo, é o trabalhador que vai arcar com o custo”, afirma Mannrich.
Nos dois primeiros meses de 2018, o assunto mais recorrente entre novos processos que entraram nas Varas do Trabalho foi o pedido de aviso prévio. Foram 57,7 mil novas ações sobre o tema.
Em segundo está a solicitação de multa de 40% do FGTS (47,1 mil processos), seguida pela multa do artigo nº 477 da CLT, de atraso no pagamento das verbas rescisórias (46 mil processos). Adicional de insalubridade ficou em 15º lugar, somando 16,7 mil ações.
Para Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht, o menor número de “ações aventureiras” pode explicar a dificuldade de os juízes acelerarem os julgamentos. “Elas eram mais fáceis de serem
sentenciadas, com maior o número de improcedência. Hoje, o juiz precisa se debruçar mais sobre processo.”