03/07/24

Revista Trabalhista: prorrogado o prazo para envio de artigos para a 68ª edição

Novo prazo para envio de sentenças e acórdãos é 05 de agosto de 2024
03/07/24

Corregedor Nacional de Justiça arquiva PP que questionava decisões da Justiça do Trabalho em contratos de franquia

Anamatra solicitou ingresso no feito, como terceira interessada, e teve posicionamento considerado na decisão
02/07/24

Anamatra discute atuação em torno da prevenção e combate à violência doméstica contra magistradas e servidoras

Presidente Luciana Conforti participou de roda de conversa promovida pela Ejud 6 e Esmafe 5, em Pernambuco (PE)
02/07/24

Toma posse a nova Diretoria da Amatra 4 (RS) para o biênio 2024/2026

Associação gaúcha será liderada pelo juiz Tiago Mallmann Sulzbach

As ruas e as salas de audiência

Mônica Sette Lopes (*)

Um aluno enviou-me uma pergunta e uma frustração. Iniciando a carreira de juiz do trabalho, pergunta como diminuir a animosidade e controlar reações (as suas, as das partes e as dos advogados) nas audiências. Respondi que, após dezessete anos de carreira, me sentia, muitas vezes, angustiada com o resultado de uma audiência e com a sensação de que poderia ter feito melhor. Prometi-lhe dicas. Este é o objetivo deste artigo.

O processo do trabalho é caracterizado pela oralidade. A sua destinação, hoje tendência do processo geral, é de que as questões sejam postas na audiência, sejam ali debatidas e que, preferencialmente, haja uma composição de interesses e de diferenças pelo acordo. Isto que, do ponto de vista abstrato, é de uma clareza solar, constitui um processo de grande complexidade porque deve ser desenvolvido em todas as audiências do dia (entre dez e dezoito) e em todos os dias da semana. Cada vez que o microfone soa e a porta se abre é um mundo novo que avança para a percepção dos sentidos. Não há uma única regra que possa conter essa variedade e ela entorna sobre a mesa uma outra face da realidade do direito: a versão com que cada um dos que ali ingressam o entende ou quer que ele seja entendido.

Uma mesma explicação pode gerar a completa assimilação dos riscos reais do caso ou uma agressividade virulenta que o juiz tem que conter e muitas vezes não consegue. Nem sempre o ouvido do intérprete se abre para os entraves de cada situação. E o alerta não é decodificado. E o problema fica mais grave porque ganha um novo complicador que decorre do processo que existe para solucioná-lo.

A sala de audiências é a porta através da qual o direito encontra a rua. É ela, que enfrenta a longa fila, pega o elevador, aguarda na ante-sala e atende ao chamado do microfone. É a rua descrita por João do Rio: "Nas grandes cidades a rua passa a criar o seu tipo, a plasmar o moral dos habitantes, a inocular-lhes misteriosamente gostos, costumes, hábitos, modos, opiniões políticas" (RIO, João do. A alma encantadora das ruas. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 66).

E a rua deve ser recebida como uma visita de cerimônia, destas que se trata polidamente, mas com as quais não se tem (nem se pode ter) intimidade. É preciso paciência para ouvi-las, cuidado para acolhê-las, bom humor para tentar amenizar o desconforto de estar ali. Mas o tempo é curto, os processos são muitos e nem sempre é possível tratar cada situação peculiarmente como que ela merece. A acomodação do conflito pela oralidade exige um debate longo para que as diferenças possam se assentar. A isto soma-se o fato de que nem sempre as partes estão dispostas a desvendar todos os minúsculos elementos de sua história comum. Há ódios recíprocos que vão normalmente além da linha biunívoca do crédito e do débito que se coloca como objeto dos pedidos. Para resolver o problema estritamente jurídico, com freqüência, é preciso ultrapassar, candidamente, fatores exorbitantes como a mágoa de uma palavra ríspida, que jamais será esquecida (para resumir, basta se pense numa sala de audiências das varas de família e se considere a simplicidade estrutural das regras básicas de direito de família).

A experiência dos vários juízes e advogados mostra que, nem sempre, é a natureza questão que torna uma audiência difícil. É um acaso, um descuido, um diminutivo que um advogado paulista toma por ofensivo e não por um mero vezo da fala mineira e sobe nas tamancas. Outras vezes é a testemunha cuja mentira se detecta sem que se ache o caminho para lavrar esta percepção formalmente na ata, de modo a que possa ser apreciada no futuro.

Não há, portanto, um formulário de condutas a ser transmitido com um receituário.

Nos últimos tempos, procuro adotar, com algum sucesso, mas não com sucesso total, a postura da fala franca e, sempre que possível, mansa. Tento exercitar uma paciência pedagógica: aquela que é usada nas salas de aula para ensinar a pensar e a ter dúvidas. Isto naturalmente implica mostrar o que não sei ? principalmente a incerteza quanto à melhor solução onde o quadro de fato não é exato. Admitir a dúvida é, naturalmente, enfatizar que o juiz não tem o dom da onipresença e da onisciência e que a construção do direito é um processo participativo e contínuo que envolve a intervenção corriqueira de todos. Pode ser que os anos de casa tragam uma facilidade de interlocução que os mais novos não têm e aí reside um outro fator a ser construído: é preciso a consciência de que o direito se faz por várias mãos e que ele tem a humanidade que nos caracteriza a todos. Se ninguém nasce sabendo, é preciso que todos contribuam para o amadurecimento dos que iniciam a caminhada principalmente quando são partícipes do processo ? e aqui me refiro a advogados e a juízes em especial.

A sala de audiências não é lugar para grito, movimentos bruscos, atos de bravata ou para que as partes e seus advogados se fustiguem com seu medo e sua raiva. Ele deveria ser um lugar de um recolhimento quase sagrado, um lugar para analisar cada pequeno ângulo da questão, para enfrentar com a mais candente ousadia as fraquezas do direito e as dificuldades para a implantação de uma Justiça rápida. Um lugar cheio de porquês falados de olhos francos e recebidos com calma no diálogo absoluto que torna o ser humano mais humano.

Nada disto é fácil e a tensão do juiz, dos advogados e das partes volta a cada abertura da porta quando microfone proclama o nome do próximo conflito e ele entra, se assenta, fala ou fica mudo deglutindo seu rancor.

A única dica para o aluno querido que se encontra para lá de todas as montanhas é que ele tente perceber o gosto e a beleza que há na humanidade inteira que se reúne à volta da mesa e no mistério da rua que invade cada juiz com seus gostos, costumes, hábitos, modos, opiniões políticas. E que o faça silenciosamente, como quem observa a paisagem da janela que descerra o mundo da vida.

_______________________________________ ___
(*) Juíza da 12ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Professora dos cursos de graduação e de pós-graduação da Faculdade de Direito da UFMG, Doutora em Filosofia do Direito pela FDUFMG

SHS Qd. 06 Bl. E Conj. A - Salas 602 a 608 - Ed. Business Center Park Brasil 21 CEP: 70316-000 - Brasília/DF
+55 61 3322-0266
Encarregado para fins de LGPD
Dr. Marco Aurélio Marsiglia Treviso
Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra
Utilizamos cookies para funções específicas

Armazenamos cookies temporariamente com dados técnicos para garantir uma boa experiência de navegação. Nesse processo, nenhuma informação pessoal é armazenada sem seu consenso. Caso rejeite a gravação destes cookies, algumas funcionalidades poderão deixar de funcionar.