Trabalho escravo: controle de convencionalidade em debate

Amatra 5 (BA)

Juíza Luciana Conforti foi uma das palestrantes do 31º Congresso de Magistrados Trabalhistas da Bahia, realizado pela Amatra 5 (BA)

“Trabalho decente contemporâneo: dignidade, liberdade, equidade e segurança”. Esse foi o tema do 31º Congresso de Magistrados Trabalhistas da Bahia (Comat), realizado pela Associação dos Magistrados do Trabalho da 5ª Região (BA), entre os dias 20 e 21 de outubro, em Salvador.

A vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luciana Conforti, representou a entidade no evento. A magistrada participou da abertura do congresso, conduzido pelo presidente da Amatra 5 (BA), Guilherme Ludwig.

Conforti também foi uma das palestrantes do congresso com o tema “Controle de Convencionalidade e Trabalho Escravo”. Na avaliação da magistrada, a questão deve ser analisada sob o prisma da violação ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável, afrontado pelas condições degradantes de trabalho e jornadas exaustivas, que colocam em risco não só a saúde e integridade dos trabalhadores, mas o direito à vida em muitas situações.

Em relação ao tema, a  magistrada fez uma análise da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em especial do Caso dos trabalhadores da Fazenda Brasil Verde (Pará, Brasil). No referido caso, pela primeira vez, um País foi condenado pela submissão de trabalhadores a tráfico de pessoas e escravização, com a responsabilização internacional. A Corte se manifestou sobre a discriminação estrtural histórica por pobreza e racismo, em razão do contexto no qual ocorreram as violações de direitos humanos das 85 vítimas.

"Foi considerado que o comércio de escravos esteve historicamente ligado ao trabalho forçado no Brasil. A pobreza e a concentração da propriedade das terras foram causas estruturais que provocaram a continuação do trabalho escravo no Brasil e, ao não terem terras próprias nem situações laborais estáveis, muitos trabalhadores no Brasil se submetiam a situações de exploração, aceitando o risco de cair em condições de trabalho desumanas e degradantes”, explicou.

Hermenêutica

O princípio constitucional da dignidade humana, explicou Conforti, fixou um novo paradigma hermenêutico na questão dos direitos humanos, em sintonia com a tendência internacional de aperfeiçoamento dos mecanismos de proteção de grupos sociais vulnerabilizados. “O novo modelo de constitucionalismo contemporâneo baseia-se na internacionalização dos direitos humanos e constitucionalização do Direito Internacional”.

Nessa linha, esclareceu, é importante lembrar que as normas internacionais trazem patamares mínimos civilizatórios, devendo cada país adotar o marco regulatório que mais atenda aos princípios e direitos fundamentais constituídos. “O Brasil deve cumprir a Convenção Americana de Direitos Humanos, entre outros instrumentos internacionais, estando sujeito também à jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, defendeu. O Brasil formalizou sua aceitação à jurisdição internacional da Corte em 1988 (Decreto Legislativo nº 89/98).

A vice-presidente também mencionou a Recomendação 123/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para a observância, nos julgamentos pelo Poder Judiciário, dos instrumentos internacionais de direitos humanos vigentes no Brasil e a utilização da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, bem como a necessidade de controle de convencionalidade das leis internas

Desafios

Para a magistrada, um dos principais desafios da contemporaneidade para a erradicação do crime reside na compreensão, por parte da jurisprudência brasileira, de que o conceito de trabalho análogo a de escravo no Brasil concebe a liberdade de modo amplo, dotando o cidadão de capacidade autônoma de agir e reagir, segundo as suas escolhas e vontades e não apenas limitada ao direito de ir e vir.

O debate jurisdicional em torno do conceito do crime acontece no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). No Recurso Extraordinário (RE) 1.323.708-PA, com repercussão geral, a Corte Constitucional deverá definir se é constitucional a diferenciação do crime em razão das condições ou do local em que o serviço é prestado e a desconsideração dos relatórios da fiscalização como meios de prova, sem apontar elementos concretos para afastá-los.

“Sabe-se que esse julgamento poderá servir de baliza para a análise de tais casos em todo o país", analisou Luciana Conforti. A Anamatra pleiteia ingresso como Amicus Curiae no processo, que está sob a relatoria do ministro Edson Fachin. O objetivo é alertar para o eventual entendimento restritivo para a configuração do crime – especialmente as condições degradantes de trabalho "no interior do país".

Participantes

Também integraram o painel a procuradora do Trabalho Ana Maria Villa Real (MPT10/DF-TO) e o procurador do Trabalho Gustavo Tenório Accioly (MPT2/SP). O painel teve como presidente da Mesa o desembargador Edilton Meirelles de Oliveira Santos (TRT5/BA), diretor da Ejud5, e como debatedora, a juíza do Trabalho Monique Fernandes Santos Matos (TRT5/BA).

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Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra
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