Minha luta é para que, sendo negra, eu não seja barrada no meu Tribunal, porque não me reconhecem, afirma magistrada

Foto: Érica França

Bárbara Ferrito discutiu 'Gênero, identidade e diversidade' com deputada Robeyoncé Lima e professores Camila Nicácio e Pedro Nicoli

No último painel desta quinta (28), a 20ª edição do Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Conamat) discutiu o tema 'Gênero, identidade e diversidade no Poder Judiciário'. Atuaram como painelistas a juíza do Trabalho da 1ª Região (Rio de Janeiro) e integrante da Comissão Anamatra Mulheres, Bárbara Ferrito, a coordenadora da Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) professora Camila Silva Nicácio, a deputada Robeyoncé Lima (PSOL/PE) e o professor da UFMG Pedro Gravatá Nicoli.

Atuando como presidente da mesa, a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Delaíde Arantes abriu os trabalhos parabenizando a realização do evento, citando a celebração dos 80 anos da Justiça do Trabalho. "Gostaria de registrar a minha crescente admiração quanto às juízas e juízes vocacionados e dedicados à magistratura trabalhista brasileira", congratulou.

Em sua participação, a juíza do Trabalho Bárbara Ferrito discutiu as questões de gênero e raça, passando pela discussão de questões como as intersecccionalidades de opressões, o problema da representatividade das minorias no judiciário e o mito da autonomia. Além disso, a juíza ressaltou que a luta antirracista vai além da questão de identidade, ou seja, das negras e dos negros se verem como são, mas é uma luta por justiça social, que envolve todos.

“A minha luta é para que, sendo negra, eu não seja, por exemplo, barrada no meu tribunal, porque as pessoas não me reconhecem como magistrada. Para que eu não escute incessantemente um advogado dizendo: ‘mas cadê o juiz?", quando eu estou de toga na frente dele. A minha luta é por justiça social, para que ser negro não tenha um significado de subalternidade, de exclusão, de predestinação do meu destino, dos meus lugares e potencialidades”, enfatizou a juíza.

Busca pela real igualdade

O ponto de vista abordado pela professora Camila Nicácio foi a dinâmica de mudanças - do direito e no direito - em relação ao tema. Para ilustrar sua reflexão, a docente citou uma crônica sobre o impacto do patriarcado na sociedade, e demonstra como a estrutura familiar foi alterada radicalmente ao longo dos últimos anos, evidenciando a ineficácia das construções legislativas e da aplicação do direito no que se refere às mulheres e às crianças e adolescentes.

Na visão de Nicácio, a forma como os operadores do direito veem minorias - as mulheres, a população LGBTQIA+, os negros, crianças e adolescentes, entre outras - precisa mudar, para que se tenha uma verdadeira igualdade, sem que esses operadores fiquem reféns da 'letra fria da lei'. “O direito não quer e não faz nada. Homens e mulheres é que mobilizam o direito e constroem e imaginam as relações a partir dele vem a imaginação que faz andar ou travar a marcha da mudança”, apontou.

Defesa da comunidade LGBTQIA+

Na sequência, a deputada Robeyoncé Lima (PSOL/PE), falou sobre o atual cenário político e social brasileiro, que, segundo ela, é marcado pelo discurso de ódio e pela LGBTQIA+fobia, com extrema violência e desrespeito aos direitos humanos, à diversidade de gênero e orientação sexual. Nesse sentido, a parlamentar ressaltou a importância de trazer essa temática ao debate.

Robeyoncé citou diversos exemplos práticos de como a justiça vem trabalhando em prol da defesa dos direitos da população LGBTQIA+, inclusive na esfera trabalhista, mas ressaltou que há muito que ser feito. “A gente precisa atuar junto aos Poderes Legislativo e Executivo, para que tenhamos uma cidadania plena, com uma sociedade que cada vez mais debata e discuta o respeito à diversidade humana e à orientação sexual a todas as pessoas, independente da origem de cada uma delas”, refletiu.

Aspectos relacionados à população LGBTQIA+ também foram tratados pelo professor Pedro Nicoli, que parabenizou a organização do evento, pela sensibilidade e coragem de discutir de maneira séria e central um tema tão caro, sinaliza em favor de vidas que, segundo ele, nunca importaram muito para a reflexão jurídica. “Ao promover esse debate, a Anamatra coloca magistradas e magistrados ao lado dessas pessoas, como aliadas de enorme importância. Algo que tem uma força ainda maior quando a gente considera como essas pessoas têm sido atacadas nos últimos quatro anos”, destacou.

Em sua exposição, Nicoli trouxe aspectos sobre a relação entre trabalho e identidade de gênero e sexualidade, falando da negatividade de como o trabalho vem historicamente sendo um espaço de violência, de negação e de mortificação para pessoas LGBTQIA+. O professor afirma que o trabalho regulado e as formas de proteção social são fundamentais para a expansão das possibilidades de se ser LGBTQIA+ no mundo. “Direitos trabalhistas são direitos LGBT”, alerta.

O Conamat

Promovido pela Associação Nacional de Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), o 20º Conamat foi aberto na quarta (27/4) e segue até o sábado (30), em Porto de Galinhas, município de Ipojuca (PE), com a participação de mais de 400 integrantes da magistratura do trabalho de todo o Brasil. Os painéis, debates e conferências contam também com professores, jornalistas, pesquisadores, advogados e procuradores ligados às áreas do direito do trabalho e de direitos humanos brasileiros e estrangeiros.

Confira a programação o site do evento e assista tudo na íntegra via Youtube.

O 20º Conamat é realizado em parceria com a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 6ª Região (Amatra 6), que congrega juízes da área trabalhista de todo o Estado de Pernambuco. As fotos do 20º Conamat estão disponíveis no Flickr da Anamatra.


Assista ao painel na íntegra:




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