Acesso à jurisdição justa pressupõe conhecimento e mapeamento de vulnerabilidades sociais, aponta presidente da Anamatra

Associação participou do “II Democratizando o acesso à Justiça: Justiça social e o Poder Judiciário no Século XXI”, promovido pelo CNJ

 

A presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Noemia Porto defendeu, nesta segunda-feira (22/02), que os desafios enfrentados pelos direitos sociais sejam reconhecidos para que iniciativas construídas no intuito de assegurar o acesso à Justiça possam avançar.

“São 14 milhões de desempregados, recordes de informalidade, trabalhadores intermitentes sem garantia salarial e novas formas de trabalho sem um marco regulatório protetivo. Alguns poderiam dizer que são questões de direito material, mas estão interseccionadas com o procedimento de se garantir o acesso justo à Justiça. Sem conhecer e sem mapear as vulnerabilidades sociais, e também as sociais trabalhistas, não se consegue construir soluções de acesso a uma jurisdição justa”, sustentou Noemia Porto, na abertura do “II Democratizando o acesso à Justiça: Justiça social e o Poder Judiciário no Século XXI”.

Promovido pela Comissão Permanente de Democratização e Aperfeiçoamento dos Serviços Judiciários do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o evento teve como objetivo dar continuidade aos debates com vistas à construção de projetos destinados ao combate da discriminação, do preconceito e de outras expressões da desigualdade de raça, gênero, condição física, orientação sexual, religiosa e de outros valores ou direitos protegidos ou que comprometam os ideais defendidos pela Constituição Federal de 1988.

Para a presidente da Anamatra, que representou a Associação na abertura do evento, algumas questões estratégicas não podem escapar das lentes da sensibilidade em prol de uma sociedade igualitária e inclusiva. “Existe um paradoxo entre a universalidade da Justiça e uma falta de inclusão digital, de maneira universalizante, para todas as cidadãs e cidadãos do Brasil. E essa inclusão não se dá apenas através do acesso aos recursos tecnológicos. Não é apenas o sinal da internet. É a ideia sobre o conhecimento, a qualificação sobre o uso das ferramentas disponíveis”, defendeu Noemia para quem se não houver o mapeamento das vulnerabilidades sociais, e também das sociais trabalhistas, não será possível construir soluções de acesso a uma jurisdição justa

Debates  - A diretora da Formação e Cultura da Anamatra, Luciana Conforti, também participou do evento. A magistrada foi uma das painelistas, abordando a temática da  democratização do acesso à Justiça no cenário de uma cultura de antidiscriminação, segundo a Corte Interamericana de Direitos Humanos, centrada em dois direitos fundamentais e humanos previstos na Constituição Federal: a assistência jurídica integral e gratuita e a inafastabilidade da jurisdição.

Nesse cenário, a magistrada falou das barreiras impostas pela Lei 13.467/2017 (reforma trabalhista) ao acesso à Justiça do Trabalho. “A reforma, alterando mais de 100 pontos da CLT, trouxe a fragilização da proteção dos direitos sociais e impôs barreiras econômicas aos trabalhadores para o ajuizamento das ações trabalhistas, com violações à Constituição e à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, analisou Conforti, apontando o deficit do número de ações ajuizadas na Justiça do Trabalho desde a edição da referida Lei.

Entre essas “barreiras econômicas” está o recolhimento de custas em caso de processos arquivados de forma injustificada e a determinação do pagamento de honorários periciais sucumbenciais, mesmo no caso de trabalhadores beneficiários da justiça gratuita com o desconto de créditos obtidos judicialmente, ainda que em outro processo. “Essas e outras restrições impostas pela reforma trabalhista violam o princípio da igualdade e o dever de não discriminação previstos no art. 5º da Constituição Federal e ao art. 24 da Convenção Americana de Direitos Humanos”.

“A maior parte das ações trabalhistas são motivadas pelo desemprego, cujo índice é altíssimo no país e pelo desrespeito aos direitos mais básicos”, alertou Conforti, que também falou de sua preocupação com o momento da pandemia.

Para Conforti, a solução do problema passa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), onde diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade relativas à reforma trabalhistas foram ajuizadas, bem como à observância da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e dos princípios e garantias da Convenção Americana de Direitos Humanos.  Para a dirigente, faz-se necessária uma maior divulgação das decisões das Cortes de Direitos Humanos e da formação das magistradas e magistrados com base nessa jurisprudência.

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