Relator da Comissão Mista acolheu 81 das 301 emendas apresentadas por parlamentares, atingindo direitos trabalhistas e sociais
A Comissão Mista que analisa a medida provisória (MP) 881/2019, conhecida como MP da Liberdade Econômica, aprovou, nesta quinta-feira (11/7), o relatório do deputado Jeronimo Goergen (PP-RS). O projeto de lei de conversão (aprovado quando uma MP é modificada no Congresso) será analisado, em seguida, pelos Plenários da Câmara e do Senado antes de ir para a sanção do presidente da República. A votação da MP tranca a pauta do Plenário da Câmara após o recesso parlamentar, a partir do dia 1º de agosto. A MP perde a validade no dia 10 de setembro, caso não seja votada pelas duas Casas do Congresso até essa data.
Durante os debates na Comissão, nesta quinta, parlamentares criticaram a intenção do texto, que coloca o liberalismo econômico como saída para a crise econômica. “A medida provisória faz uma nova reforma trabalhista. Na verdade, tira-se mais direitos. Eu não entendo como as micro e pequenas empresas vão crescer com uma população desempregada e sem salário. Quem vai comprar das micro e pequenas empresas?”, questionou o deputado Enio Verri (PT-PR).
A presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, lamentou o resultado. Segundo a magistrada, o relatório alterou substancialmente o texto original da MP afetando, em vários aspectos, os direitos trabalhistas. O relator acolheu 81 das 301 emendas apresentadas por parlamentares, alterando mais de 100 pontos do texto original. “Além disso, o texto ameaça a segurança jurídica do país, considerando jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF)”, alerta Noemia Porto. O Supremo, no julgamento da ADI 5127, declarou a inconstitucionalidade de emenda parlamentar em projeto de conversão de MP em lei, por conteúdo temático distinto daquele originário.
A Anamatra, juntamente com a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat), encaminharam ofício, nessa quarta (10/7), ao senador Dário Berger (MDB-SC), e se reuniram com parlamentares da Comissão, requerendo o adiamento da votação ocorrida hoje e apontando mudanças preocupantes na legislação trabalhista, mas o pleito das entidades não foi considerado.
Segundo as associações, o texto da MP 881, nos termos do relatório da Comissão Mista, afronta a Constituição Federal, normas internacionais do trabalho, a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. “As regras constitucionais estão absolutamente atreladas à dignidade da pessoa humana e qualquer alteração que vise a livre iniciativa deve se dar por causa da garantia dessa dignidade e não da garantia tão e somente da ordem econômica como vem estampado no texto, que elimina regras de segurança e saúde no trabalho”, alertam.
Mudanças na legislação trabalhista - Entre as preocupações das associações está a previsão de regimes especiais de contratação, suspendendo leis, atos normativos infralegais, acordos e convenções coletivas, que vedam o trabalho aos finais de semana, incluindo sábados, domingos e feriados. Também ficam suspensos diversos artigos da CLT que estabelecem jornadas especiais de trabalho, por exemplo, para bancários, jornalistas profissionais, entre outros, inclusive com restrições à remuneração diferenciada de horas extras.
A texto aprovado amplia, ainda, a possibilidade da duração de contratos de trabalho por prazo determinado, atualmente, de acordo com a CLT, restritos a, no máximo, dois anos. Também está entre as preocupações das associações a possibilidade aberta pela MP de se firmar contratos de trabalho regidos pelas regras do Direito Civil, sendo as de Direito do Trabalho, dispostas em lei, consideradas todas subsidiárias.
Questões relativas às normas de segurança e medicina do trabalho também são afetadas pela MP 881 na redação dada pelo relatório da Comissão Mista. Isso porque torna-se facultativa a constituição de Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA). “Em um país que registra, de acordo com estatísticas oficiais, uma morte por acidente em serviço a cada três horas e 40 minutos, é inaceitável. Não se trata de uma questão econômica, mas sim de saúde pública”, aponta a presidente da Anamatra. De acordo com estatísticas do Observatório Digital do MPT/OIT, com dados oficiais da Previdência Social, entre 2012 e 2018, foram registrados no Brasil 17.683 acidentes fatais e 378.060.049 dias de trabalho perdidos por afastamento. O gasto nesse período, incluindo benefícios iniciados em anos anteriores, supera R$ 84 bilhões.
A fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista e previdenciária também é afetada pelo texto aprovado. Pelo relatório da MP, as empresas ficam dispensadas de encaminharem cópia da Guia da Previdência Social ao sindicato representativo da categoria profissional mais numerosa entre seus empregados.
*Com informações da Agência Senado