“Igualdade não pode ser apenas um discurso de esperança, entoado como retórica”, afirma vice-presidente da Anamatra

Ascom/Ajufe

Juíza Noemia Porto participa de seminário sobre a trajetória e os desafios das mulheres no sistema de Justiça

A vice-presidente da Anamatra, Noemia Porto, participou, nesta quinta (8/3), da segunda edição do “Seminário Mulheres no Sistema de Justiça: Trajetórias e Desafios”, evento promovido, em Brasília, pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal (Amagis). Em sua intervenção, a magistrada lembrou o cenário de desigualdade de gênero, não apenas no sistema de Justiça ou em uma respectiva classe social, e defendeu a efetivação de projetos na área.  “A igualdade não pode ser apenas um discurso de esperança, entoado como retórica", disse.

 

Em sua intervenção, a magistrada apresentou dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que demostram que as mulheres representam 37,3% dos magistrados em atividade em todo o país, dado este que contrasta com o fato de que, pelo menos nos últimos 30 anos, as mulheres vêm se destacando na formação escolar. Segundo dados do IBGE, na população acima de 25 anos, com ensino superior completo, os homens aparecem com 13,5%, abaixo das estatísticas femininas, que apontam 16,9% (clique aqui e saiba mais sobre o levantamento do Instituto).


Segundo a juíza, ainda que uma leve curva ascendente favoreça a constatação de uma maior formação formal das mulheres, a Magistratura ainda é predominantemente masculina. “Masculina não apenas na presença majoritária, mas no modo como se organiza e se moldam as experiências do que é ser juiz. Desta constatação derivam outras tantas sobre a recusa de promoções na carreira que impliquem deslocamento para outras cidades; a falta de estrutura física nos fóruns e demais locais para atendimento de crianças em idade que exige cuidado mais próximo; as práticas sexistas de preferências masculinas pelo trabalho de homens em razão da possível gravidez das mulheres; dentre outros tantos aspectos que poderiam ser ressaltados, na medida em que a discriminação de gênero não está diretamente vinculada a uma ou algumas classes sociais ou confinada apenas a algumas profissões”, destacou.

 
Noemia Porto defendeu a necessidade de se considerar, também, as incontáveis "jornadas" femininas entre a casa e a família, além das "prisões" emocionais femininas, forjadas numa cultura que as valoriza como cuidadoras e articuladoras das famílias. “As mulheres sofrem ao se perceberem ‘abrindo mão’ dos papéis de cuidadoras que lhes foram atribuídos. A questão, no entanto, deve ser encarada como cultural e não como natural”, disse.

 

Boas práticas - Acerca das boas práticas do Judiciário que vão ao encontro de uma maior equidade de gênero no sistema de justiça, a vice-presidente da Anamatra citou a Resolução nº 3 de 2017 do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que aprovou política de gênero, raça e diversidade, com previsão de criação e de funcionamento de Comitê Gestor de Equidade de Gênero, Raça e Diversidade. Também mencionou o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT), que implementou, em maio de 2015, uma Política de Gestão da Diversidade e Inclusão no âmbito da instituição, em moldes semelhantes à política do Judiciário Trabalhista gaúcho.


“O Poder Judiciário Trabalhista, no entanto, conta com 24 Tribunais Regionais e, pelo que se nota, a preocupação institucional, formalizada no compromisso com uma política interna de promoção da igualdade, apenas aparece em raros casos”, alertou. Na avaliação da juíza, essas iniciativas poderiam servir de norte para alertar que a equidade não ocorre pela simples passagem do tempo. “Ela precisa ser colocada como uma pauta e como um princípio norteador na construção das estruturas organizacionais internas dos tribunais. Assim, importante registrar a sugestão, como boa prática, de formalização de programas e de comitês que estejam voltados ao compromisso de realização a contento do primado da igualdade”, defendeu.

 

Ações prioritárias -  Para a vice-presidente da Anamatra, a partir dessas experiências pioneiras, é possível extrair a indicação das ações ou atuações prioritárias, sendo elas: ações de comunicação e divulgação interna e externa; ações de formação, qualificação e gestão e/ou desenvolvimento de conhecimento, atitudes ou aptidões, promoção do bem-estar e da qualidade de vida, voltadas para servidores e magistrados; extensão da política, sempre que possível, para trabalhadores terceirizados, estagiários e comunidade jurídica e acadêmica; promoção de atos, solenidades e cerimônias institucionais que permitam dar visibilidade às ações empreendidas;  e  ações de Saúde e Qualidade de Vida de Servidores e magistrados.


Na avaliação da magistrada, uma política institucional exitosa depende da interconexão de diversos setores. “No âmbito da comunicação, deveria se traçar como objetivos o aperfeiçoamento interno e externo da linguagem inclusiva; a conscientização sobre questões de gênero, raça e diversidade; a propagação de imagens e mensagens que rompam com estereótipos sobre papéis e comportamentos socialmente impostos; a conscientização da importância de uma prática de igualdade. Neste aspecto, haveria se indagar se os setores de comunicação dos tribunais trabalhistas recebem formação suficiente para o trato adequado dessas questões”, analisou.

 

Formação - A formação de juízes e servidores também foi lembrada pela vice-presidente, que defendeu que o tema seja adotado como obrigatório, nos módulos inicial e continuado, tanto para juízes quanto para servidores. “Na atualidade, na Escola Nacional de Formação e de Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT) e nas Escolas Judiciais dos Tribunais Regionais (EJUDs), não há, ressalvadas algumas exceções, a inclusão de cursos, módulos ou outras atividades curriculares que incorporem a temática de gênero”, alertou.


Noemia Porto citou alguns exemplos de órgãos que se dedicaram à temática na área de formação, como o TRT da 4ª Região, com o “Curso Política e Equidade de Gênero, Raça e Diversidade”; e  iniciativa de magistrada da Vara do Trabalho de Dianópolis, no estado do Tocantins, vinculada ao Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, da criação de ambientes que possibilitam o acolhimento dos filhos menores das trabalhadoras, o que viabiliza que possam comparecer e participar das audiências trabalhistas. “Esta iniciativa considera que o acesso à justiça não pode ser apenas formal, mas substancial”, opinou.

 

A vice-presidente citou ainda a existência de uma Rede de Direitos Humanos do Sistema de Justiça e Segurança, com matriz interinstitucional, com representantes da Defensoria Pública, da Justiça do Trabalho, da Justiça Estadual, do Ministério Público, entre outros.  O grupo, explica a magistrada, comporta comitê interdisciplinar para a harmonização dos Programas de Educação e Promoção de Direitos Humanos nos diferentes órgãos/entidades integrantes da Rede de Justiça e Direitos Humanos no Rio Grande do Sul. “A formação de redes similares, com a participação de diversos atores, pode contribuir para que a pauta da equidade não esteja presente apenas em algumas experiências esporádicas e consiga conectar as realidades diversas dos vários órgãos integrantes do sistema de justiça”, defendeu.

Receba nossa newsletter

SHS Qd. 06 Bl. E Conj. A - Salas 602 a 608 - Ed. Business Center Park Brasil 21 CEP: 70316-000 - Brasília/DF
+55 61 3322-0266
Encarregado para fins de LGPD
Dr. Marco Aurélio Marsiglia Treviso
Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra
Utilizamos cookies para funções específicas

Armazenamos cookies temporariamente com dados técnicos para garantir uma boa experiência de navegação. Nesse processo, nenhuma informação pessoal é armazenada sem seu consenso. Caso rejeite a gravação destes cookies, algumas funcionalidades poderão deixar de funcionar.