Magistrada defendeu a regulamentação do trabalho infantil artístico
A Anamatra participou nesta segunda-feira (16/10) de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) que discutiu formas inaceitáveis de trabalho, como o trabalho escravo, o infantil e outras relações laborais. A entidade foi representada pela vice-presidente, Noemia Porto. A audiência é uma iniciativa da subcomissão da CDH criada para discutir e formatar uma nova legislação trabalhista ou um Estatuto do Trabalho, como propôs o senador Paulo Paim.
Na ocasião, a vice-presidente falou do PLS 231/15, que visa regulamentar a atividade artística para crianças e adolescentes. Ela criticou a dificuldade que o país ainda enfrenta no combate ao trabalho infantil e destacando a necessidade de conferir visibilidade a várias das suas variantes, incluindo o trabalho infantil artístico. Recentemente, a entidade entregou no Senado Federal moção pública do FNPETI (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil) que defende a competência da Justiça do Trabalho para apreciar pedidos de autorização relativos à participação de crianças e adolescentes em representações artísticas. “O trabalho infantil artístico, como excepcionalidade, é admitido na Convenção nº 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), mas desde que a atividade seja autorizada pela autoridade competente. No Brasil, trata-se de autorizações judiciais, que procuram fixar garantias mínimas a fim de que o trabalho seja desenvolvido dentro patamar de proteção.
A magistrada ressaltou que uma das grandes confusões que se percebe hoje em dia é a tentativa de descaracterizar o trabalho infantil artístico como trabalho. “Prevalecendo essa ideia, a criança não seria protegida. Ao contrário disso, as crianças e os adolescentes são cidadãos, verdadeiros sujeitos de direitos. No trabalho infantil artístico ocorre a sujeição dessas pessoas – que são frágeis, estão em estágio de desenvolvimento – ao cansaço e à irritabilidade, além do convívio com o mundo adulto e a sujeição às regras próprias do ambiente laboral. Tudo isso pode trazer várias consequências à infância, não necessariamente positivas, como o amadurecimento precoce. Quando não se pretende que o trabalho infantil seja visto como realmente é, ou seja, um trabalho, a intenção é de invisibilizar situações que estão implicadas no trabalho infantil artístico, o qual causa deslumbramento na sociedade. Sem proteção a essa condição de trabalho, os pais ou responsáveis podem ser levados ao consentimento em situações de exploração, especialmente no caso das famílias mais pobres”.
Sobre o PLS, Noemia Porto defendeu ser importante, de fato, a construção de um marco regulatório. Todavia, externou preocupação com os termos da proposta quando se observa a pretensão de "uma ausência estatal e uma presença de autorização apenas de pais e responsáveis, numa consideração de que esse tipo de atividade não seria trabalho". Noemia Porto falou da experiência internacional com a regulação do trabalho infantil artístico e elencou alguns aspectos que não podem ser desprezados em futuro marco regulatório legislativo. "É necessário observar a carga horária máxima para essa atividade. A autorização judicial não pode ser retirada e substituída apenas pela autorização dos pais. As autorizações devem contemplar questões mínimas de segurança e proteção, como duração da jornada, condições ambientais, e isso sempre com a manifestação do Ministério Público do Trabalho, que deve atuar como fiscal da lei para evitar irregularidade”.
A vice-presidente destacou ainda que “deve-se analisar, numa futura regulamentação, a imprescindibilidade que exista um contrato formal para evitar as contratações informações, além da necessidade de prévia autorização de representantes legais e concessão de alvará para cada novo trabalho que a criança desenvolver, com caducidade para todas as autorizações anteriores. Mesmo em atividades supostamente glamourosas, de divertimento, há riscos para crianças e adolescentes. O marco regulatório brasileiro é importante e urgente, mas não no modo como têm sido conduzidas essas discussões. A proposta legislativa em curso está longe de alcançar esses patamares mínimos de proteção. Um futuro código do trabalho precisa incorporar esse debate para conferir visibilidade à essa situação”, disse.