Jornada de trabalho de 12 horas pode ser questionada pela Justiça, afirma Anamatra

Para presidente da entidade, proposta é inconstitucional e pode aumentar número de acidentes de trabalho

O presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), juiz Germano Siqueira, reagiu às declarações do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que afirmou, na última quinta-feira (8/9), que a reforma trabalhista que será encaminhada pelo governo Michel Temer ao Congresso Nacional vai oficializar uma jornada de trabalho de até 12 horas.

Para o magistrado, a proposta é algo impensável e afronta a Constituição Federal, que limita a jornada em oito horas, entre outras garantias mínimas. “Falar em 12 horas, como também segmentos empresariais já falaram em reduzir o intervalo intrajornada, é algo que não aceitamos do ponto de vista jurisdicional. São limites que não podem ser ultrapassados”, pondera.

 Germano Siqueira também alerta para o elevado número de acidentes do trabalho no país, o que coloca o Brasil no topo entre os países que mais matam no trabalho. Em 2014, foi registrada uma média de 54,6 mortes por semana em 2014, decorrentes de acidentes de trabalho no país. Naquele ano, foram 704.136 acidentes e 2.783 óbitos, total que não engloba as subnotificações, servidores e trabalhadores informais. “O número de acidentes de trabalho está ligado preponderantemente à jornada excessiva. Aumentar o número de horas de trabalho e reduzir intervalos é apontar para um aumento ainda maior de acidentes”, pontua o presidente.

O presidente da Anamatra lembra que o ministro do Trabalho e o presidente Michel Temer afirmaram que, na reforma trabalhista, não haveria decréscimo de garantias, mas que, uma reforma com esse viés, representa violação, ainda que por acordo, já que a convenção coletiva é feita para ampliar direitos mínimos que a lei já concedeu. “Os juízes são demandados em torno de anulação de acordos e convenções porque, dentro do formato normativo vigente, alguns acertos agridem normas de proteção à saúde e segurança do trabalhador e normas de legais que deferem direitos mínimos, na medida em que acordos devem prever mais e não menos”, explica.

O magistrado acredita a proposta de reforma parece querer nesse “novo ambiente de trabalho”, utilizar a convenção coletiva para reduzir o patamar de conquista dos trabalhadores. “Quando falamos em privilegiar o negociado a qualquer custo e regulamentar a terceirização sem limites, criamos esse risco: abrir uma possibilidade de precarização no campo do trabalho, sem nenhum modelo de controle efetivo”, afirma. Para o presidente, a consequência, ao contrário do que se espera, será um ambiente de extrema insegurança jurídica. “Haverá, sim, um volume de demandas na Justiça do Trabalho muito maior e mais autuações pelo próprio Ministério do Trabalho”, prevê.

Siqueira lembra que dados estatísticos relevam que 43,99% dos processos trabalhistas versam sobre o não pagamento de verbas rescisórias – só em 2014, 4 milhões de processos ingressaram na Justiça o Trabalho, que se somaram ao estoque de 4,4, milhões. “Na maioria dos casos, o empregador demite e não paga direitos rescisórios e também horas extras. Talvez por isso se pretenda agora tornar normal e banal o cumprimento de 12 horas diárias, para não pagar horas extras. Trata-se de uma reforma trabalhista medieval, que torna normais e regulares jornadas de fases já superadas pelas conquistas consolidadas no processo constituinte de 1988”, critica.

Agenda com ministro - A Anamatra pediu ao ministro do Trabalho uma agenda para discutir o tema. “Talvez o Ministro do Trabalho não tenha percebido que uma proposta de reforma trabalhista nesses termos vai dificultar o próprio ambiente de negócios e esteja ouvindo vozes não devidamente autorizadas e que não reverberam o pensamento do Judiciário Trabalhista. Seria de bom tom que o ministro dialogasse com a correntes representativas da Magistratura ”, afirma o presidente da Anamatra. 

 

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