18º Conamat: Leandro Karnal fala do papel do juiz em uma sociedade em constante mudança

Historiador fala dos medos, esperanças e transformações da Magistratura no mundo atual

Com o tema “Magistratura e sociedade: medos e esperanças”, o historiador Leandro Karnal proferiu, nesta quinta-feira (28/04), a conferência de abertura do segundo dia do 18º Conamat. O professor abordou aspectos relacionados ao papel da Justiça e do juiz do Trabalho, direitos e deveres, o cenário político atual em uma sociedade cada vez mais mutável, fazendo contrapontos entre a história atual e a passada das relações humanas. O evento segue até sábado (30/4) em Salvador (BA).

Karnal iniciou sua fala lembrando de um reconhecimento medieval de que a Justiça só é necessária em sociedades desiguais. “Em sociedades iguais, onde se desconhece a noção de propriedade privada ou de hierarquia política definida, não há advogados, promotores ou juízes. Nessa autoridade só existe a questão carismática do líder, fruto de sua habilidade. Quando nós criamos uma sociedade baseada na desigualdade, como tem sido nos últimos milênios, surge a figura do advogado, do juiz, do jurista”.

Sobre a ideia medieval de desigualdade, o historiador apontou os papéis do juiz do Trabalho na observância dos direitos dos trabalhadores. “Até hoje o juiz trabalhista está sentado administrando uma sociedade que reconhece o seu direito legal de propriedade privada e reconhece o valor social dessa propriedade na Constituição”. Para Karnal, a justiça,
desde o mundo Romano criou uma concepção baseada em três valores: “ela deve ser vendada para não ser parcial; não deve ver para distribuir independente de saber a quem; deve utilizar uma balança sem fiel, porque fiel é a própria Justiça e deve distribuir equitativamente; e tem uma espada, porque Justiça sem força não existe”.

Partindo para o momento atual, Leandro Karnal destacou que todos esses valores antigos de Justiça estão “diluídos” em um “mundo líquido” que, segundo ele, é descrito pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman, por não ter forma, definição, e mudar inteiramente de valores. “É um mundo de uma velocidade enorme, muito tranquilo para jovens, mas um desafio pra quem nasceu em um mundo sólido. O mundo líquido é onde eu diluo a autoridade, onde as realidades são rápidas. Vivemos mudanças permanentes e as mudanças não dependem da minha consciência, da minha vontade ou não vontade e só tenho duas opções: ou eu me transformo rapidamente junto ou eu paro e a transformação passa por mim”.

Sobre a defesa de direitos fundamentais, o conferencista fala dos limites estabelecidos em lei e até onde vai essa defesa, e reforçou a ideia de fuga do essencialismo. “Eu posso defender tudo, menos o crime e, nesse caso, tenho que ser absolutamente conservador, independente da época. A ideia que se estabeleça o que é uma sociedade claramente a partir de uma essência é uma ideia ingênua. O essencialismo é quando eu acho que existe um único modelo para todas as coisas. Feliz ou infelizmente ser um legislador, um juiz, um advogado no mundo líquido significa permanentemente ter que fazer casar o texto seco, frio, histórico da lei, a um momento específico, às vezes com maior ou menor grau de eficácia”.

Ainda sobre direitos e deveres, Karnal enfatizou que estamos vivendo uma época de reconhecimento de direitos. “Esta é uma época em que quase todas as pessoas sabem que estão amparadas em uma lei e buscam seus direitos cada vez mais, mas elas não conseguem mais ver os deveres, o pêndulo foi para o outro lado. Direitos e deveres, por mais simples que pareçam, devem ser equilibrados, e este é um desafio enorme”.

Ao falar dos medos inerentes ao exercício da Magistratura, o historiador disse ainda que “o medo leva a uma prudência covarde, de não ousar ou não fazer nada. Para inovar eu preciso passar por cima de medos, inclusive com a chance de errar. Todo projeto novo tem que enfrentar resistências. O medo é o pior inimigo da espécie humana, pois impede a inovação. Um pouco de medo é prudente, mas muito medo paralisa. O medo tem que existir para impedir excessos, mas tem que ser controlado, pois o grande aliado de toda ação é a esperança. A esperança é a tarefa que diariamente eu vou fazer o melhor possível e voltar no dia seguinte, enfrentar crises constantes e, depois de fazer bem o seu trabalho, ainda receber a agressividade daqueles que deviam agradecer o seu trabalho. Enquanto cada um de nós cumprirmos nossa função, há esperança”, finalizou.

Acompanhe a cobertura fotográfica do 18º Conamat pelo Flickr da Anamatra. Clique aqui e confira as fotos do evento.

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