A Anamatra protocolou ontem (3/2), no Supremo Tribunal Federal (STF), Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, para que sejam tornados sem efeito os cortes discriminatórios que constam no orçamento da Justiça do Trabalho, aprovados na Lei Orçamentária Anual (Lei Federal nº 13.255/2016). No pedido, a entidade condena as restrições orçamentárias promovidas por mera “retaliação” ao Judiciário Trabalhista e afirma que o corte é discriminatório, desproporcional e infundado. Clique aqui e leia a peça na íntegra. A ação tramita sob o número 5468 e tem a relatoria do ministro Luiz Fux.
Na ação a Anamatra lembra que o relator do orçamento, ao invés de promover de um debate técnico, econômico e financeiro para realizar o ajuste do que haveria de ser aceito ou não, impôs deliberadamente dois cortes na proposta orçamentária da Justiça do Trabalho, visando ao cancelamento de 50% (reduzido para 29,4%) das dotações para custeio e 90% dos recursos destinados para investimentos no setor.
Além disso, a entidade defende que a discriminação com a Justiça do Trabalho foi clara e manifesta, com o inaceitável objetivo de rediscutir as bases do Direito do Trabalho e a atuação dos magistrados, enquanto os cortes propostos e aprovados para o Poder Legislativo e demais órgãos da Justiça da União foram menores que os empreendidos à ao Judiciário Trabalhista. O próprio relatório fazia menção ao papel "punitivo" dos exagerados cortes, para a "reflexão" dos juízes do Trabalho.
O presidente da Anamatra, Germano Siqueira, afirma que a expectativa da entidade com a ADI é positiva. “Além da uma afronta à independência entre os Poderes, os cortes são uma ameaça ao Poder Judiciário como um todo. Não demora e mais tarde uma iniciativa como esta, restritiva do Orçamento, pode voltar-se contra a jurisdição eleitoral e contra o próprio STF, apenas porque não se ‘gosta’ do modo como os seus magistrados estão aplicando o Direito”.
Em que pese a redução do percentual, na avaliação do presidente da Anamatra, trata-se ainda de tratamento diferenciado imposto à Justiça do Trabalho, sem nenhuma razão de ser. “Em um cenário de crise não se justifica cercear a carga operacional de um ramo importantíssimo do Poder Judiciário. Estamos falando de um patrimônio comum da Magistratura e do povo brasileiro: a Justiça e o Direito do Trabalho”, registrou Germano Siqueira.
A advocacia da Anamatra, juntamente com o vice-presidente, Guilherme Feliciano, foram recebidos nesta quinta (4/2) em audiência pelo relator da ADI para expor o problema.
Para reforçar os pedidos feitos ao STF, a Anamatra também divulgou nesta quinta-feira (4/2), nota pública repudiando os “cortes discriminatórios e sem precedentes” aprovados na Lei Orçamentária Anual de 2016. A nota tem como objetivo alertar para os prejuízos à prestação jurisdicional e pedir providências urgentes quanto ao orçamento da Justiça do Trabalho. Confira a íntegra da nota abaixo:
Nota Pública
Tendo em vista cortes discriminatórios e sem precedentes, quanto ao método e justificativa, patrocinados pelo relator do PLOA 2016 (Lei n. 13.255/2016), comprometendo fortemente o funcionamento regular do Judiciário Trabalhista, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) vem a público externar o seguinte:
1. Em face da grave crise econômica que se abateu sobre o País, com elementos combinados de recessão, inflação e contingenciamento orçamentário do exercício anterior, o relator do PLOA 2016 promoveu cortes em vários segmentos do sistema público de Justiça (incluídos, aqui, todos os ramos do Poder Judiciário e do Ministério Público).
2. Em relação à Justiça do Trabalho, entretanto, fez especialmente pesar a mão, de modo desproporcional e discriminatório; e por razões nada republicanas. Enquanto os cortes médios no Ministério Público foram da ordem de 7% (sete por cento) e no restante do Poder Judiciário de 15% (quinze por cento), à Justiça do Trabalho o relator reservou cortes médios de 90% (noventa por cento) nos investimentos e de 50% (cinquenta por cento) nas verbas de custeio. Esses últimos, após intensa demanda por tratamento igualitário com os demais segmentos, foram apenas “minorados” para 29,4% (vinte e nove vírgula quatro por cento), em termos médios, remanescendo a desigualdade.
3. Essas medidas foram inaceitavelmente justificadas, pelo relator, como represália institucional a uma suposta atuação “protecionista” dos juízes do Trabalho e pela necessidade de se alterar a legislação trabalhista brasileira, tida por ele como excessivamente condescendente para com os empregados. Daí que a restrição orçamentária foi deliberadamente imposta à Justiça do Trabalho não por estrita necessidade fiscal, mas “como forma de estimular uma reflexão sobre a necessidade e urgência de tais mudanças”.
4. Fato é que em nenhum país democrático do mundo um Poder pode impor, a outro, tal sorte de constrangimento, a exigir imediata correção, sob pena de se consolidar perigoso precedente e adiante desfechar proporções ainda mais graves.
5. Não se trata, portanto, de “defender” a Justiça do Trabalho, ou apenas a Justiça do Trabalho. Trata-se de defender o Estado Democrático de Direito. Do mesmo modo como não pode o Poder Executivo, por meio de vetos, p.ex., reduzir à metade o orçamento do Congresso Nacional, com o propósito de chamar os senhores parlamentares à “reflexão” sobre determinada temática decidida contra os interesses pessoais da Presidência da República, não poderia o Parlamento, com finalidades “pedagógicas”, interferir no orçamento do Poder Judiciário.
6. O resultado da desproporcional intervenção no orçamento da Justiça do Trabalho já revela, a propósito, sensíveis prejuízos para a população: construções e alugueis de fóruns comprometidos, vagas abertas de desembargadores, juízes e servidores que não se podem preencher, horários de atendimento aos jurisdicionados indesejavelmente reduzidos em praticamente todas as vinte e quatro Regiões do Trabalho (ante as reais dificuldades para fazer face às despesas de funcionamento da estrutura) etc.
7. A não haver imediata reação — e, para tanto, a ANAMATRA protocolizou, na data de ontem, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.468/DF, colimando desfazer o gravíssimo desvio de finalidade havido na atuação legiferante —, em futuro próximo poderá ser a Justiça Eleitoral a figurar na mira de cortes orçamentários de fundo ideológico, por certa jurisprudência não “palatável”; ou o próprio Supremo Tribunal Federal, caso suas decisões sejam mal avaliadas por relatores de orçamento com instinto persecutório. Far-se-á tábula rasa dos artigos 2º e 99 e da Constituição da República.
8. Em síntese, pela primeira vez na história recente do Parlamento brasileiro, a peça orçamentária anual foi explicitamente utilizada como instrumento de retaliação a uma instituição pública; e, mais, como ameaça a um corpo de Magistrados, punindo-os pelo modo como, supostamente, têm interpretado as fontes formais do Direito. Em países mais afeitos aos valores democráticos e às suas garantias — como são a independência judicial e a autonomia dos tribunais —, tal relatório (e a lei que dele derivou) não seria, nessa parte, nada menos que escandaloso. Espera a ANAMATRA, pelo apreço que tem aos pilares democráticos e republicanos que sustentam a atual ordem constitucional, obter para logo providência jurisdicional capaz de restabelecer, para a Justiça do Trabalho e para os seus milhões de jurisdicionados, dignidade e justiça orçamentária.
Brasília, 4 de fevereiro de 2016.
GERMANO SILVEIRA DE SIQUEIRA
Presidente da Anamatra
Foto: Gil Ferreira/ SCO STF
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