Anamatra defende amplo debate sobre trabalho escravo e terceirização

Em audiência no Senado, entidade alerta para projetos de lei que trazem retrocesso social

A terceirização e o trabalho escravo foram temas de duas audiências públicas subsequentes, realizadas nesta terça-feira (15/12), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado Federal, que contou com a participação da Anamatra. Na ocasião a entidade, representada pelo vice-presidente, Guilherme Feliciano, reforçou seu posicionamento contra os projetos de lei que tratam da regulamentação precarizante do trabalho terceirizado no setor privado (PLC nº 30/2015) e que tentam descaracterizar o conceito legal de trabalho escravo (PLS nº 432/2003).

Sobre a terceirização, Guilherme Feliciano condenou a tentativa de se retroceder no sistema brasileiro de proteção de direitos sociais, tal como construído ao longo de cem anos. “Isso inclui a mínima integridade da estrutura da Justiça do Trabalho que, historicamente, foi criada para conter, nas tensões entre capital e trabalho, os desmandos que se estabelecem em uma relação contratual na qual a vulnerabilidade econômica do trabalhador o coloca em uma situação de inferioridade, a ponto de voluntariamente ceder ao poder hierárquico patronal, abaixo de níveis que agridem a dignidade humana”, disse.

O magistrado também destacou que os projetos de lei que dispõem sobre a regulamentação da terceirização no Brasil, notadamente o PLC nº 30/2015, não avançam na questão; muito pelo contrário, provocam um “panorama de desmonte dos direitos sociais e evidente retrocesso social”. Por outro lado, Feliciano elogiou o PLS nº 554/2015, apresentado pelos senadores Paulo Paim e Randolfe Rodrigues, a partir de sugestões da Anamatra, na medida em que regulamenta a terceirização com critérios minimamente civilizatórios (isonomia salarial, vedação de terceirização de atividade-fim, entre outros).

O presidente da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho (ALJT), Hugo Melo Filho, ex-presidente da Anamatra (gestão 2001/2003), defendeu a importância dos debates para a sociedade. “Essas audiências despertaram não apenas os movimentos sindicais para a luta, mas toda sociedade brasileira, na conscientização dos malefícios que a terceirização vem trazendo, e continuará, caso seja aprovado o projeto de lei na forma proposta”. O magistrado vem participando de diversas audiências públicas no Brasil, promovidas pela CDH do Senado, para discutir o tema.

Trabalho Escravo
Na audiência subsequente, Feliciano levantou a bandeira histórica da Anamatra no combate ao trabalho forçado e, especialmente, a luta de mais de dez anos para a aprovação, em 2014, da Emenda Constitucional 81, que trata da desapropriação de propriedades urbanas e rurais onde é flagrada a exploração do trabalho análogo ao de escravo. Nesse sentido, reforçou a necessidade de amplo debate com a sociedade civil sobre o tema, pedindo que se retire o regime de urgência do PLS nº 432/2003 e se estabeleça amplo debate, nas diversas comissões do Senado, com a sociedade civil e as instituições.

“A Anamatra é contra a exclusão do conceito de trabalho degradante para efeito de desapropriação de propriedades por exploração do trabalho escravo contemporâneo; e pede, por isso, que o debate seja reaberto, que se retire a urgência do projeto e que ele volte às comissões para um amplo debate com a sociedade civil”, ressaltou Feliciano, ao manifestar a preocupação da Anamatra com propostas legislativas que têm como objeto a regulamentação da EC 81, entre elas o PLS 432/2013. Lembrou, ainda, o fato de que o conceito de trabalho degradante a rigor sequer precisa de regulamentação, à vista do que dispõe o artigo 149 do Código Penal e do que em torno dele já se construiu, hermeneuticamente, na Justiça do Trabalho e na Justiça Federal.

Após a audiência, o presidente da CDH, senador Paulo Paim, seguiu com participantes da audiência pública para a Presidência do Senado Federal, para pedir ao senador Renan Calheiros que os projetos que prejudicam os trabalhadores não sejam votados e retornem à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ao final, o relator do PLC nº 432/2013, senador senador Romero Jucá (PMDB-RR), assentiu com o pedido de Paim e das entidades envolvidas para que seja retirada a urgência da proposta e devolvido à CCJ para melhor debate. 

Orçamento
O vice-presidente da Anamatra fez um paralelo das tentativas de desconstrução dos direitos sociais com a proposta do Orçamento da União para 2016. Nesse sentido, fez duras críticas ao relatório do relator-geral do projeto na Comissão Mista de Orçamento, deputado Ricardo Barros (PP-PR), que impôs cortes desproporcionais no orçamento da Justiça do Trabalho e os apresentou como "estímulo" para que os juízes do Trabalho "reflitam" sobre a maneira como julgam empregadores. "Trata-se de verdadeira chantagem institucional que se emparelha com o PLC 30 na tentativa de minar o Estado social brasileiro”, criticou Feliciano.

Feliciano pontuou que, da mesma maneira que o direito social, a Justiça do Trabalho sofre com a ameaça de desmonte. “A Justiça do Trabalho tem sobrevivido, ano a ano, com orçamentos apertados, que dificilmente têm atendido às suas necessidades. Para 2016, porém, nós tivemos a notícia de cortes nas despesas da ordem de 60% para custeio e de 90% para investimento, o que muito nos preocupa”, disse Feliciano.

Sobre esse tema, a Anamatra divulgou, na noite de ontem (14/12), nota pública na qual criticou o relatório do deputado Ricardo Barros (Clique para ler).

 

 

 

 

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