Magistrados debatem valorização das decisões do juiz originário

Painel do terceiro dia do evento reúne ministro do TST, desembargadora estadual e juiz do Trabalho de 1º grau

Três instâncias do Poder Judiciário reuniram-se na manhã desta quinta-feira (3/5) no 16º Conamat para debater a valorização das decisões do juiz originário. O ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Augusto César Leite de Carvalho, a desembargadora da Justiça Estadual Elaine Harzheim Macedo e o juiz do Trabalho da 4ª Região (RS) Ben-Hur Silveira Claus discutiram o tema sob a ótica do problema recursal do Poder Judiciário. A mesa foi coordenada pelo juiz Narbal Fileti, diretor de Formação e Cultura da Anamatra, e contou com as presenças, como convidados de honra, da diretora de Comunicação da entidade, Cléa Couto, e do ex-presidente da Associação Ivanildo da Cunha Andrade.
 
Primeiro a falar do tema, o ministro do TST destacou a importância do juiz de 1º grau como aquele que constrói a imagem do Poder Judiciário, que éinternalizada pelo jurisdicionado na mesa de audiência. “O sentimento de apatia contra aquele juiz que instruiu processo contrasta com o sentimento de resignação que perturba aquele que está do outro lado da mesa”, disse. César Leite definiu esse juiz como “a face exposta do Poder Judiciário”. Portanto, para o ministro, ele deve ser sereno. “O juiz arrogante transfere para o Poder Judiciário toda carga opressora de dominação que muitas vezes o trabalhador conhece no ambiente produtivo”, alertou.
 
O ministro falou de alguns princípios que prestigiam as decisões de primeira instância, a exemplo do fato das normas definidoras dos direitos fundamentais terem efeito imediato. “O conflito ainda se soluciona verdadeiramente enquanto ainda existe ou causa alguma perturbação emocional”. Segundo ele, tal configuração especial está atrelada ao princípio constitucional da duração razoável do processo. “Não obstante toda a sensação de desprestígio ao juiz originário, ele é o único que consegue alcançar o conflito, solucioná-lo e gerar justiça social”, disse. “Ele também precisa ser um juiz de coragem, de compreender que há valores elevados do Direito do Trabalho que precisam ser superestimados na hora de se realizar a jurisdição trabalhista. É o juiz que não se sente melindrado pelo fato de estar resolvendo conflitos, que percebe que sua decisão não é um rito de passagem”.

Na opinião do ministro, a Justiça do Trabalho vive um processo evolutivo, mas que precisa superar alguns “fetiches”, como a conspiração contra o duplo grau de jurisdição e a resistência ao não uso de outras fontes do Direito, a exemplo do Código de Processo Civil, quando existirem lacunas ideológicas. Também falou de outros mecanismos importantes, a exemplo dos incidentes de demandas repetitivas e a remessa oficial nos casos de tutela urgentes.

Ao final, ressaltou que o juiz que quer aplicar de imediato o preceito de sua sentença precisa necessariamente, por coerência, prestigiar o direito constitucional de ação. “Não tem como falar de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho sem lembrar que o direito constitucional de ação é costumeiramente ameaçado e vulnerável pela nossa jurisprudência”. E completou: “Às vezes me questiono sobre o que hoje nós propriamente estaremos a julgar. Penso que tradicionalmente decidimos sobre o preço do trabalho humano, o que sempre levou a nosso trabalho a um patamar superior. Após a Constituição de 88, descobrimos outros direitos fundamentais. O juiz do Trabalho sempre será indispensável enquanto perceber que a dignidade da pessoa humana está presente em todos os direitos trabalhistas.

Desvalorização
O juiz do Trabalho Ben-Hur Silveira Claus, da 4ª Região, iniciou sua intervenção falando sobre a função revisora dos tribunais e dos excessos do sistema recursal. “As decisões de primeiro grau não são valorizadas”, disse. O magistrado citou doutrinadores e jurisprudências que vão de encontro a esse cenário.

Segundo ele, valorizar a decisão do juiz de 1º grau é exceção dentro do sistema judicial vigente. “A regra vigente é de algum grau da efetividade das decisões de primeiro grau, na medida em que é possível fazer a execução provisória até a penhora. O instituto da antecipação de tutela e a possibilidade do provimento liminar nas ações de obrigação de fazer e não fazer constituem uma importante quebra dessa regra geral de desvalorização”.

Bem-Hur também criticou a prática costumeira de transformar o acórdão em uma nova sentença. “O juiz julga a ação, o tribunal o recurso. São atividades distintas com métodos distintos. O fato de a matéria ser devolvida na totalidade ao Tribunal não justifica que se profira uma ‘nova sentença’, como se a de primeiro grau inexistisse”, disse. Para o magistrado, a função revisora dos desembargadores deve levar em conta que ele não está na situação hermenêutica do juiz de primeiro grau. “A ‘nova sentença’ é a ideal do relator, mas que tende a ser a reforma da sentença razoável do juiz”.
O magistrado concluiu a sua intervenção falando que é necessário resgatar o princípio da imediatidade enquanto fundamento suficiente à confirmação da sentença quanto à matéria de fato. “As escolas judiciais têm um grande desafio pela frente, mas estão à altura do desafio”, finalizou.

Antes da sentença
A juíza Elaine Harzheim Macedo firmou sua intervenção falando do que acontece antes da sentença de primeiro grau e defendeu que mesmo com as mudanças da sociedade moderna, a tradição seja respeitada. “Na tradição republicana o Poder Judiciário entrou sempre como um poder e não como uma função. E isso foi recepcionado dentro da Constituição com nova formatação. O Judiciário é poder, mas como poder se trata muito mais dos seus agentes políticos e exerce um dever”, disse. Nesse novo cenário, a magistrada lembrou que os juízes são mandatários do povo e tem de prestar contas e exercer o dever. “A soberania nacional está nas mãos do povo”, completou.

A magistrada também fez uma distinção entre o direito que é produzido pelo legislador e o que é construído na sentença. “Enquanto o processo legislativo deve ser um espaço democrático predominantemente político, o processo judicial tem de corresponder a um espaço democrático predominantemente jurídico de construção do direito no caso concreto”. Nesse cenário, na visão da desembargadora, o desafio é desenvolver a democracia no processo judicial.

Harzheim Macedo também defendeu uma reforma urgente do sistema recursal. “Ele está atrelado à ideia de ordinariedade, do juiz declarando a vontade da lei. E isso não começa pela redução do recurso, mas sim a partir da petição inicial, do comprometimento de todos os agentes e das técnicas realizadas”.

Ao final de sua exposição, a juíza fez uma análise da conduta dos tribunais superiores. Para ela, o Supremo Tribunal Federal está exercendo o seu papel de corte constitucional, o que só foi possível a partir do momento em que os recursos extraordinários deixaram de ser um reexame em quarto grau de jurisdição. Também falou que há um movimento do Superior Tribunal de Justiça para que apenas os grandes temas sejam por ele enfrentados. Mas, para a desembargadora, o Tribunal Superior do Trabalho precisa evoluir mais na questão de criar filtros recursais. “Continuo confiante de que a grande reforma é na planície”, concluiu.

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