Causa, no mínimo, estranheza e fascínio aos juristas, o tratamento que deva ser dispensado aos empregados que incorporam em suas atribuições hodiernas, alguns dos poderes de mando típicos do titular da entidade empresarial, pois torna-se cada vez mais controverso o seu enquadramento na seara da legislação trabalhista, a partir do instante em que passamos a confundir o empregado com seu próprio empregador.
a) Direito comparado:
No Sistema jurídico mexicano, os "empleados de confianza" são trabalhadores e estão submetidos a um regime especial, sendo assim considerados aqueles que desempenham uma função de confiança, isto é, as pessoas que tenham em suas mãos a marcha geral da negociação e das decisões vitais para a empresa.
Existem cinco tipos de grupos de empregados de confiança previstos na legislação mexicana, quais sejam "direción, vigilância, fiscalización, inspeción de las labores y empleados personales Del patrono dentro de la empresa".
Sem embargo, as palavras empregadas pela lei, se forem interpretadas literalmente, induziriam a erro, já que os termos "direção, fiscalização e vigilância" são demasiadamente amplos, pois em algumas empresas existem numerosos postos de direção, desde o chefe de seção até o gerente-geral.
Além disso, há menos postos de fiscalização e muitos de vigilância, como, por exemplo, os vigias ou as pessoas encarregadas de evitar a subtração de objetos e mercadorias das dependências das empresas.
Noutro ponto, os "empregados pessoais do patrão dentro da empresa" abarcariam os postos de inspeção, inclusive os empregados domésticos.
No Direito Alemão, a concepção de altos empregados está associada à posição especial que ocupam nas negociações, participando no trabalho próprio do empresário, seja porque contribuíram para impulsionar o empreendimento econômico, seja pela função de direção e vigilância que exercem sobre os demais empregados da mesma empresa.
No tratado de Hueck-Nipperdey se diz: "Na empresa moderna, não é possível ao empresário exercer, por si só, a função de direção, sendo, pois, obrigado a delegar uma parcela dessa função à determinados empregados, ocorrendo o mesmo com o poder de mando sobre os seus trabalhadores. Os altos empregados são aqueles que se encontram revestidos com o poder de mando do patrão e que, ademais, representam os interesses da empresa, com a conseqüente obrigação de defendê-los, em face aos trabalhadores. A doutrina não se põe de acordo sobre se é necessário que concorram os elementos, a saber, o poder de mando e a representação dos interesses da empresa ou se basta a existência de um deles".
No Direito Italiano, os artigos 2094 e 2095 do Código Civil Italiano de 1942 estabeleciam que os altos empregados não são patrões, trabalhadores ou empregados, integrando uma categoria distinta, o que implica na formação de associações profissionais próprias e de convenções coletivas de trabalho particulares.
No Direito Francês, não existia dispositivos especiais para tratar dos altos empregados, no entanto, a doutrina de Durand e Vitu identificava a independência dos altos empregados com a percepção de remunerações elevadas e, freqüentemente, dispondo de outras fontes financeiras além do seu salário. Sua remuneração não possuía caráter alimentício e era penhorável após certa quantia. Além disso, outra característica era o gozo de certa independência moral.
b) Conceitos e distinções entre altos empregados e cargo de confiança:
Segundo a doutrina de Cláudio Armando Couce de Menezes, os altos empregados são aqueles situados em patamares superiores da escala hierárquica patronal, independentemente da natureza do trabalho ou função.
Neste rol encontramos os diretores, administradores gerais, os gerentes, etc. Não obstante, os altos empregados estão adstritos aos critérios diretivos, ao menos gerais (ex: regulamento empresarial); além do que, em regra, a determinação da quantidade de energia de trabalho a despender, fica dentro da esfera do empregador, sendo que, em várias oportunidades, são encontrados sem atributos de representação e de gestão, que notabilizam seus "primos", os cargos de confiança.
Há quem fale até em contrato misto de trabalho e mandato na situação do alto empregado, o que nem sempre é real. De qualquer forma, são regidos pelas leis trabalhistas, com algumas particularidades, quando exercem cargos de confiança (arts. 62, 468, parágrafo único, e 499 da CLT).
Muitos são os que confundem altos empregados com exercentes de cargo de confiança. O equívoco é justificável, frente às conceituações diversas e confusas a respeito, contudo, não pode perpetuar-se.
Os altos empregados enquadram-se em cargos de direção de caráter permanente, administrativo (onde o titular representa o empregador ou a direção deste, com certa autonomia administrativa, denotando um exercício de função de confiança) e cargos de direção de natureza estritamente técnica (conferidos aos empregados especializados, que chefiam divisões, departamentos ou seções, sendo que, aqui, a autonomia é técnica, e, muitas vezes, inexistente ou rarefeita é a independência administrativa).
Os cargos de direção técnica se prendem ordinariamente à capacidade que o empregado demonstra no que diz respeito a um determinado ofício, arte ou profissão. Comumente, são destituídos de qualquer poder de representação, vinculando-se o seu comando ao aspecto puramente técnico. Daí por que o seu ocupante raramente controla o horário, admite ou pune empregados; quando muito, apenas comunica a falta de um obreiro ou indica quais os que merecem ser promovidos, contratados ou despedidos.
Logo, os altos empregados ocupantes de atribuições técnicas não representam, necessariamente, sinônimo de cargo de confiança.
Por outro lado, há cargos de especial fidúcia, que nada têm de direção, inexistindo, sequer, paralelo com os altos empregados (ex: pagador de banco ou de uma fábrica).
Obtempera o mestre Mozart Victor Russomano ao destrinchar a velha redação do art. 62 da CLT (antes da Lei 8.966/94), "Da mesma forma, os gerentes. Aí, a razão está no fato de ser o gerente investido de mandato e necessitar, muitas vezes, para fiel desempenho desse mandato e de suas atribuições, trabalhar fora das horas normais. Isso é inerente à sua função. O prejuízo econômico que tiver fica coberto pelo seu salário, que deve ser sensivelmente superior ao dos demais empregados, como estipula a alínea C. Se isso não acontecer, por qualquer motivo, o gerente também terá direito ao recebimento das horas extraordinárias efetivamente trabalhadas. A dificuldade que isso acarreta está em apurarmos, com rigor, quantas horas o gerente trabalha, porque, como empregado representante do empregador e chefe do serviço, quase sempre não está sujeito a ponto.
É importante assinalar-se que, no
art. 499, o consolidador não definiu o que se deva
entender como cargo de confiança. Fê-lo, porém, apenas
quanto ao gerente, no art. 62. A circunstância de se
exigir, para caracterização do gerente, poderes de
gestão, mandato formal e salários elevados não
significa que esses requisitos se estendam a todas as
hipóteses do art. 499.
Há, na Consolidação, uma idéia de confiança
progressivamente crescente, que pode ser enunciada em
quatro níveis: a) confiança genérica, comum a todos os
contratos de trabalho, que pressupõem um mínimum de
fidúcia, de parte do empregador; b) confiança
específica, relativa aos bancários, segundo a
exemplificação do parágrafo 2o., do art. 224; c)
confiança estricta (art. 499); d) confiança
excepcional, que é aquela que enquadra o gerente na
alínea C, do art. 62".
Calha trazer à lume o posicionamento do ínclito Ministro Arnaldo Sussekind acerca dos altos empregados e dos exercentes de cargo de confiança, verbis: "Os gerentes e diretores-empregados, de que cogita o art. 62 da CLT, tal como definido no seu parágrafo único, são os investidos em cargos de gestão pertinentes à administração superior da empresa, enquanto que os chefes de departamentos e filiais são os que, no exercício desses cargos de alta confiança, têm delegação do comando superior da empresa para dirigir e disciplinar os respectivos setores. Mas, para excluí-los da aplicação do capítulo "Duração do Trabalho", a nova lei exige ainda que os salários não sejam inferiores aos dos correspondentes cargos efetivos acrescidos de 40%. Esse plus pode concernir a gratificação de função ou estar embutido, a qualquer título, no salário do cargo de confiança".
Sob o aspecto objetivo, os empregados exercentes de cargo de confiança e os altos empregados seriam aqueles que desempenham uma função de confiança excepcional, a qual compreende um complexo de tarefas, atribuições e poderes, subrogando-se ao status de proprietário do empregador, com o desiderato de permitir a existência da empresa e de promover a lucratividade do negócio.
Enquanto o aspecto subjetivo do conceito de cargo de confiança e altos empregados está atrelado ao modo com que se apresenta a sua relação de emprego no mundo fenomênico, isto é, a subordinação é adelgaçada e a onerosidade é excessiva, pois extrapola o caráter alimentar do salário, a fim de compensar a alta hierarquia do seu cargo e a confiança especial gozada.
c) A velha e a nova redação do art.
62 da CLT:
Antes da alteração trazida pela Lei 8.966 de
27/12/1994, a alínea b)possuía a seguinte redação: "os
gerentes, assim considerados os que, investidos de
mandato, em forma legal, exerçam encargos de gestão, e,
pelo padrão salarial mais elevado de vencimentos, se
diferenciem dos demais empregados, ficando-lhes,
entretanto, assegurado o descanso semanal".
Nos dizeres do ilustre juslaboralista Maurício Godinho Delgado, "considerava-se firme a intenção da lei de restringir a noção de cargo/função de confiança àqueles postos que deferissem a seus ocupantes uma tríade de requisitos: a) função e poderes elevados de gestão com respeito à dinâmica da empresa; b) função e poderes de representação com outorga de mandato; c) inequívoca distinção remuneratória a seus detentores, em face dos demais empregados da mesma organização".
Portanto, nesse conceito restritivo de cargo de confiança, havia a supressão de algumas garantias e benefícios trabalhistas à esses trabalhadores e, além disso, alheava do seu âmbito aqueles empregados que, embora detivessem poderes de gestão, tivessem alcançado essa alta posição, mediante regras ditadas por um regulamento empresarial, num verdadeiro plano de carreira.
Outro ponto interessante é a menção
expressa na lei da necessidade de um contrato de
mandato, o qual, ulteriormente, foi erradicado do
texto do art. 62 da CLT pela Lei 8.966/94.
Deveras, alguns doutrinadores sustentam a
desnecessidade do requisito do poder de representação,
em virtude da retirada da expressão "investidos de
mandato, na forma legal" do novo texto do art. 62 da
CLT, para a caracterização do cargo de confiança.
Entrementes, entendemos que persiste o requisito do poder de representação, pois, apesar da lei não condicionar o cargo de confiança à celebração de um contrato de mandato, de alguma maneira, o empregado, quando se reveste do ofício de alta hierarquia, incorpora os poderes derivados de sua função de confiança, mediante outorga implícita do empregador para substituí-lo em seus afazeres rotineiros dentro da empresa.
Com a promulgação da Lei 8.966/94, a redação do art. 62 da CLT restou modificada, além da adição de um parágrafo único, nestas tintas: "os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial. Parágrafo único: O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratificação de função, se houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo, acrescido de 40% (quarenta por cento)".
Primeiramente, tornou-se hialina e perfeitamente perceptível a distinção entre empregados exercentes de cargo de confiança e altos empregados, porquanto os diretores e chefes de departamento ou filial, equiparados aos exercentes de cargo de confiança são, na verdade, altos empregados.
Em seguida, em que pese o novo texto legal não indique o direito ao descanso semanal remunerado, impende ao jurista fazer uma interpretação histórica do novo artigo 62 da Consolidação para integrá-lo à remuneração do obreiro, de sorte que, o legislador não teve a intenção de suprimi-lo, mas o de não ser redundante, já que o art. 7o., inciso XV, da CF/88 dispõe que o repouso semanal remunerado é direito de todo trabalhador.
Não é despiciendo ilustrar esse trabalho com o pertinente comentário do insigne mestre Maurício Godinho Delgado, acerca da nova redação do artigo 62 da CLT, verbis: "A referência a chefes de departamento é, de fato, inovatória, em contraponto à interpretação que anteriormente se fazia sobre o status desse cargo de confiança. Não há dúvida de que chefe de departamento não tende a deter poderes tão elevados quanto aqueles exigidos pela leitura inspirada, por exemplo, em Mario de La Cueva (que falava em alter ego do empregador). Porém, de qualquer modo, os poderes desse chefe departamental têm de ser significativos no contexto da divisão interna da empresa. É que se não o forem, tal chefe quedar-se-á submetido a um tipo de fiscalização e controle empresariais tão intensos que não irá se diferenciar dos demais empregados a ele submetidos, para os fins do artigo 62 da CLT. Ora, o preceito celetista quer excluir as regras relativas à jornada de trabalho quanto aos detentores de cargo de confiança, por considerar tais regras incompatíveis, em face dos amplos poderes desses altos empregados. Houve, pois, uma atenuação no requisito, mas não tão extremada como inicialmente pareceria".
Noutro giro, insta ressaltar que o parágrafo único do artigo 62 da Consolidação não só determinou mais um requisito para a verificação do cargo de confiança, qual seja o elevado padrão salarial correspondente à um acréscimo de no mínimo quarenta por cento ao seu respectivo salário efetivo, mas também erigiu verdadeira norma finalística, já que o seu escopo real foi o de coibir a fraude às normas trabalhistas.
Antes da Lei 8.966/94, era muito comum casos de patrões que recorriam ao engodo de promover os seus empregados à um cargo de confiança, pagando um valor muitas vezes inferior ao que usualmente percebe os demais empregados da empresa, apenas para deixarem de pagar as suas horas extras.
Neste ensejo, é curial trazer à lume a forma de cálculo da remuneração mínima do alto empregado, pois, apesar de aparentar uma questão pueril, é um ledo engano compartilhar essa opinião, como será demonstrado alhures.
Destarte, o cotejo percuciente do aludido parágrafo único do artigo 62 da CLT conduz, outrossim, à ilação assombrosa, de que não há base de cálculo do alto padrão salarial do empregado exercente de cargo de confiança.
Na verdade, o legislador obliterou do texto legal a base de cálculo constante da redação avelhantada do artigo 62 da Consolidação, menoscabando a sua importância para a própria coerência da sua semântica.
Assim sendo, anteriormente, a disposição legal do art. 62 era "pelo padrão mais elevado de vencimentos, se diferenciem dos demais empregados, logo, o ponto referencial era o salário-base dos demais empregados, pois a ele era comutado um plus, ao qual faziam jus pelo desempenho da função de confiança.
Antevendo os comentários equivocados que se poderiam fazer da expressão "ao valor do respectivo salário efetivo" utilizada na nova redação legal do art. 62 da CLT, passamos a contrapor os possíveis argumentos.
Em primeiro lugar, se o comando
legal determina a soma de quarenta por cento, ao valor
do respectivo salário efetivo, a dúvida emergente é: o
que se quer dizer com "salário efetivo"?
Embora a jurisprudência tenha firmado o entendimento
de que "salário efetivo", reporta-se ao salário do
cargo que o obreiro ocupava antes da promoção ao cargo
de confiança, carece de solidez essa idéia, porquanto
existem empregados que são recrutados externamente e
alçados diretamente ao cargo de confiança e, nem mesmo
por isso, deveriam receber quarenta por cento de um
nada, já que não ocupavam nenhum cargo antes da
admissão nos quadros da empresa.
Ao final, sendo a base de cálculo do padrão salarial
elevado, o salário efetivo dos demais empregados,
indaga-se: o que se deve entender por "demais
empregados"?
Ora, quando o rotundo artigo 62 da CLT referia-se aos "demais empregados", não era à todos os empregados com a exclusão dos altos empregados, posto que existem funções que já compreendem uma parcela de poderes e que gozam de uma fidúcia especial do empregador, logo não poderiam ser incluídos no termo "demais empregados".
Desta feita, pode-se citar, por exemplo, um promotor de vendas, o qual deve prestar um serviço de inspeção e fiscalização do estoque de mercadorias na empresa, possuindo, pois, poder de fiscalização, além das suas atribuições e tarefas normais.
Nessa linha de raciocínio, é lógico que o salário do promotor de vendas deverá ser superior ao de um simples vendedor e tanto isso é verdade que o art. 8o. da Lei 3.207/57 institui um adicional de 1/10 sobre a sua remuneração.
Portanto, seria um bis in idem pretender acrescer quarenta por cento (40%) à sua remuneração, em face da fidúcia excepcional de seu contrato de trabalho, se já existe um adicional (ex: 1/10) à sua remuneração, decorrente da fidúcia especial do seu contrato de trabalho.
Assim, o termo "demais empregados" relaciona-se apenas com o universo de empregados na empresa que desempenham função, consistente num conjunto integrado de atividades e atribuições, sem quaisquer poderes.
E, finalmente, se porventura existem vários cargos, em que predominam exclusivamente atribuições e atividades na função, máxime se faz aplicar a regra hermenêutica da favorablia odiosa restringenda, ou seja, interpreta-se extensivamente o que for favorável ao empregado e restritivamente o que lhe prejudica, logo, a melhor solução é tomar o maior salário dentre os cargos destituídos de poderes na empresa para servir de base de cálculo do padrão salarial elevado do cargo de confiança.
d) Efeitos do cargo de confiança
Em suma, os efeitos do cargo de confiança são restritivos de direito e garantias consagradas aos empregados comuns, excluindo a aplicação das normas celetistas concorrentes à estabilidade (art. 499/CLT), a irredutibilidade de salários e a inalterabilidade da função ou do cargo (art. 468, parágrafo único, da CLT), o pagamento de horas extras após a oitava hora de trabalho (art. 62, II, da CLT) ou após a sexta (art. 224, parágrafo segundo da CLT).
Com o escopo de compreender com mais acuidade os efeitos do cargo de confiança atinentes ao não-enquadramento na jornada normal de trabalho, é imprescindível analisar pormenorizadamente o proêmio do artigo 62 da CLT transcrito a seguir: "Não são abrangidos pelo regime previsto neste Capítulo".
Primacialmente, o artigo 62 está inserido no Capítulo II - Da Duração do Trabalho na CLT, sendo que esse Capítulo subdivide-se na Seção I - Disposição preliminar; Seção II - Da jornada de trabalho; Seção III - Dos períodos de descanso; Seção IV - Do trabalho noturno; Seção V - Do quadro de horário; Seção VI - Das penalidades, logo, à primeira vista, os empregados exercentes de cargo de confiança não fariam jus à horas extras, ao repouso semanal remunerado e ao adicional noturno.
Sem embargo, apenas as horas extras não são devidas à esses empregados, porque com o advento da Constituição Federal de 1988, houve uma derrogação do art. 62 da CLT, quanto ao repouso semanal (art. 7o., XV, da CF/88) e ao adicional noturno (art. 7o, IX, da CF/88).
No tocante às horas extras, o artigo
7o., inciso XIII da Constituição Federal é
perfeitamente compatível com o caput do art. 62 da
CLT, conforme ensina magistralmente o eminente ministro
Arnaldo Sussekind, verbis: "A circunstância de ter a
Constituição de 1988 limitado a "duração do trabalho
normal" "a oito horas diárias e quarenta e quatro
semanais" (art. 7o., XIII) não se atrita com essas
disposições de caráter excepcional, como não vulnerou a
redação anterior do art. 62. Primeiro, porque, como
adverte, com argúcia, Octavio Bueno Magano, o adjetivo
"normal" concerne a "trabalho" e não a "duração".
Depois, porque os empregados a que alude o inciso I do
dispositivo em foque prestam serviços sem subordinação
a horário e fora do controle do empregador, enquanto
que os gerentes, diretores e chefes de departamento ou
filial, desfrutam de posição singular na empresa, nela
exercendo o poder de comando (diretivo e
disciplinar)".
Noutro aspecto, o parágrafo único do art. 468 da CLT
preceitua que a reversão do empregado exercente de
cargo de confiança ao seu cargo de origem, não
constitui alteração contratual unilateral do
empregador, todavia o antigo Enunciado 209 do TST
garantia ao empregado de cargo comissionado na empresa
as vantagens salariais inerentes ao mesmo, desde que
tivesse permanecido no cargo por 10 ou mais anos
ininterruptos.
O E. 209 do TST foi cancelado pela RA 81/85 do TST, mas, atualmente, a jurisprudência retomou o curso de outrora, mediante a criação da OJ 45 da SDI do TST, a qual ressuscitou o entendimento do referido Enunciado.
Por derradeiro, o empregado
exercente de cargo de confiança pode ser transferido
de localidade sem a sua aquiescência (art. 469,
parágrafo primeiro, da CLT), no entanto o Enunciado 43
do TST estabeleceu uma presunção juris tantum de
abusividade da alteração contratual objetiva, caso não
haja real necessidade do serviço, invertendo o ônus da
prova para o empregador.
Além disso, a percepção do adicional de
transferência do parágrafo terceiro do art. 469 da CLT
para esses empregados está condicionada à
provisoriedade da mudança de localidade, visto que, em
caso contrário, não será devido, segundo informa a OJ
113 da SDI do TST.
Resta salientar ainda que a promoção do empregado carreirista para o cargo comissionado na empresa, implica em suspensão do seu contrato de trabalho, não se computando o tempo de serviço desse período, salvo se permanecer a subordinação jurídica inerente à relação de emprego, conforme está preconizado no Enunciado 269 do TST.
e) Isonomia salarial x Cargo de confiança:
No que tange ao problema da remuneração, o artigo 461 da Consolidação insculpiu o princípio do trabalho igual corresponde a um salário igual, não obstante, a sua invocação para os empregados exercentes de cargo de confiança é impossível, pois a designação de um gerente ou diretor geral depende de suas qualidades e porque a sua retribuição tem as características atribuídas aos honorários de um profissional liberal.
Pretender criar um estandarte para a retribuição dos altos empregados, equivaleria à negar os títulos que os tornam merecedores do talento e da confiança, ante ao público e ao próprio proprietário.
No mesmo sentido, defende o conspícuo jurista Fernando Américo Veiga Damasceno: "quando o empregado ocupa cargo de confiança técnica, a despeito do alto grau de poder técnico-decisório que possui, a lei não o exclui do tratamento comum a qualquer outro empregado. Portanto, aplica-se-lhe o princípio "trabalho igual, salário igual", desde que preenchidos os requisitos do art. 461.
Mas, tratando-se de real cargo de confiança, nos termos suprafixados, parece impossível medir a identidade de valores. Se a contratação laboral se dá com base na confiança do empregador no empregado, e não apenas na capacidade técnica, torna-se imensurável o seu valor. A confiança é exclusivamente subjetiva, decorrendo de ligações quase que pessoais entre empregado e empregador, escapando à possibilidade de verificação do quantum qualitativo e quantitativo".
Encampa a mesma vertente doutrinária o renomado jurisperito Nélio Reis, nestas indeléveis tintas: "Ora, já vimos nos comentários dos capítulos anteriores, que a investidura nos cargos de confiança se processa - com exclusão dos de confiança técnica - por outras vias que o puro exame da capacidade profissional ou eficiência técnica. Mesmo no de confiança técnica, o elemento profissional não é o único determinante da eleição patronal, como no lembrado caso do Caixa de Banco em que a empresa confia não só na capacidade profissional, como igualmente nos demais predicados de honestidade, vida privada incensurável, etc. Não nos parece possível assim, determinar, com justiça, a existência da igualdade criadora da equiparação porque são elementos psicológicos, morais, de foro íntimo, que não admitem confronto, como o vício, a virtude, a inteligência ou a estupidez. Assim sendo, nos filiamos à corrente dos que entendem que não cabe a equiparação salarial nos casos dos exercentes de cargos de confiança de qualquer natureza".
f) Cargos de confiança técnicos dos bancários:
Consoante o parágrafo segundo do art. 224 da CLT e o E. 232 do TST, os empregados que exerçam funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes ou que desempenhem outros cargos de confiança, desde que o valor da gratificação percebida não seja inferior a um terço do salário do cargo efetivo, não estão subsumidos ao regime especial do bancário estribado no proêmio do artigo 224 da CLT.
Assim, a sua jornada de trabalho é a
do trabalhador comum estadeada no art. 7º. , inciso
XIII, da Constituição Federal de 1988 (oito horas
diárias e carga semanal não excedente a quarenta e
quatro horas), logo, serão consideradas
extraordinárias, as horas laboradas além da oitava.
Compreendem-se no cargo de confiança especial do
parágrafo 2o. do art. 224 da CLT: os chefes (E.
233/TST); os subchefes (E. 234/TST); os gerentes
(E.287/TST); os subgerentes (E. 238/TST) e os
tesoureiros (E. 237/TST).
Finalmente, se o cargo ocupado pelo
bancário for de confiança excepcional e exigir amplos
poderes de mando e gestão, o empregado será regido
pela norma do art. 62, II, da CLT e não a contida no
art. 224, parágrafo 2º. da CLT.
g) Sócio-empregado:
No que concerne ao sócio-empregado, a regra geral é a de que são compatíveis a figura do sócio e a do empregado, pois a sociedade possui personalidade jurídica própria e o art. 63 da CLT reza que a participação em lucros ou comissões não elimina a sua condição de empregado, exceto se a participação for em lucros sociais da empresa, isto é, quando houver distribuição de dividendos ao final do exercício financeiro da sociedade e retirada pro labore mensal, por exemplo.
Contudo, numa sociedade de pessoas, se prevalecer a affectio societatis do sócio sobre o elemento subordinação da relação empregatícia e, numa sociedade de capital, se o empregado obtiver participação acionária majoritária ou for o acionista controlador da sociedade, ficará prejudicada a sua condição de empregado, pois esse passou, doravante, a assumir o papel de empregador.
h) Conclusão:
É indubitavelmente atual a temática ventilada neste parco e singelo estudo sobre a forma e a regulação do contrato de trabalho desses empregados, cuja base está arraigada numa fidúcia especialíssima depositada pelo empregador e da qual depende essencialmente o sucesso e a prosperidade do negócio lançado no competitivo mercado econômico.
No palco de ardorosos embates
doutrinários e ante a coexistência de multifárias
vertentes interpretativas, os juízes e os tribunais se
deparam com o desafio da uniformização da aplicação da
lei ao caso concreto, em prol da segurança das
relações jurídicas dos seus jurisdicionados.
Ao final, não pretendíamos desbravar todos os
meandros dessa polêmica matéria, porquanto a
mutabilidade e a riqueza da realidade dos fatos são
empecilhos inexpugnáveis ao esgotamento do assunto e à
previsão legal de todas as hipóteses, todavia, ousamos
açular o espírito crítico do leitor com mais
indagações, ao revés de dar respostas às que já
existem.
Bibliografia:
BARROS, Alice Monteiro de; Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho; São Paulo; LTr, 2001.
CUEVA, Mario de; Derecho Mexicano Del Trabajo; México: Porrua, 1959.
DAMASCENO, Fernando Américo Veiga; Equiparação Salarial; São Paulo; LTr. 1980.
DELGADO, Maurício Godinho;
Alterações Contratuais Trabalhistas; São Paulo;
LTr, 2000.
DELGADO, Maurício Godinho; Curso de Direito do Trabalho; São Paulo: LTr, 2002;
MENEZES, Cláudio Armando Couce de; Altos Empregados - Cargos e Funções de Confiança; Ravista LTr, vol. 59, Fevereiro, pgs 175-181.
REIS, Nélio; Contratos Especiais de Trabalho; São Paulo: Liv. Freitas Bastos, 1955.
RUSSOMANO, Mozart Victor; Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho; Rio de Janeiro, Forense, 1983;
Sussekind, Arnaldo; Instituições de Direito do Trabalho; Vol. 2, São Paulo, LTr, 1996.