Brasília esteve mais movimentada no
dia 22 de novembro, quando o Movimento Negro celebra a
morte de Zumbi dos Palmares, o líder da raça,
libertador de escravos e fundador dos primeiros
quilombos. Cento e vinte anos depois da Lei Áurea,
institutos de pesquisa divulgaram dados sobre a
realidade social e econômica da população negra que
muito nos envergonha. Os números, longe de mostrar
avanços com as políticas públicas implementadas nos
últimos anos, expõem com mais dureza uma ferida ainda
grande no seio da sociedade.
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho (Anamatra) não pode ficar alheia a essa
realidade. Cabe a nós, juízes do trabalho, uma grande
parcela de responsabilidade para a redução das
desigualdades raciais no Brasil. Uma das nossas
contribuições é pressionar o Congresso para aprovação,
ainda este ano, do Estatuto da Igualdade Racial, que
estabelece, no âmbito da Justiça, atendimento gratuito
e tramitação preferencial para os casos de crime
racial, embutidos no apartheid social que vigora no
Brasil desde a Colônia.
No dia-a-dia de nossas funções nos fóruns
trabalhistas, devemos estar atentos, também, ao
preconceito e à discriminação racial embutidos no
descumprimento puro e simples das leis trabalhistas
quando o empregado é negro. Dados divulgados na Semana
da Consciência Negra mostram que os homens negros
ganham menos do que as mulheres brancas, e que as
mulheres negras ganham em média menos do que o salário
mínimo. A maioria delas trabalha como domésticas, em
que o regime de semi-escravidão ainda impera.
Os baixos salários dos negros vêm da baixa
escolaridade, mas a baixa escolaridade vem de todo um
conjunto de ações da sociedade que marginaliza a
população negra. Os dados deixam claro que o
preconceito racial agrava a questão da pobreza,
mostrando o quanto é justo, necessário e urgente a
aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, que
determina a implantação de cotas nas universidades, nos
partidos políticos (reserva de pelo menos 30% dos
cargos para candidatos negros) e nas empresas (pelo
menos 20% nas empresas com mais de 20 empregados).
Muitas vozes já se levantaram contra a política de
cotas, mas ela é fundamental para acelerar o processo
de inserção do negro no exercício pleno de cidadania.
É de um político negro - senador Paulo Paim (PT/RS) -
o Estatuto da Igualdade Racial. Se mais negros houvesse
no Congresso, possivelmente o Estatuto não estaria
tramitando na casa desde 2000. As cotas são ações
positivas de inserção que devem ter todo o apoio dos
juízes do trabalho.
A Anamatra esteve com o presidente da Câmara para
cobrar da Casa urgência na aprovação de outra lei que
vai ajudar o Brasil a promover mais rápido a igualdade
de direitos que os negros reivindicam: a aprovação da
PEC que trata da expropriação de terras onde existe
trabalho escravo ou de semi-escravidão. A expropriação
para a reforma agrária, e a aplicação de indenizações
por dano moral para o trabalhador escravizado são lutas
que a Anamatra vem travando em parceria com a OIT, o
Ministério Público do Trabalho e as Delegacias
Regionais do Trabalho.
Embora não seja direcionada à população negra, a PEC
vai contribuir também para reverter, a curto prazo, os
abusos que ainda se cometem contra os menos
favorecidos no Brasil. Nas fazendas onde o trabalho
escravo tem sido desmascarado pelas ações conjuntas do
Ministério Público do Trabalho, da Anamatra e da OIT,
também os negros são as principais vítimas.