Vista inicialmente com desconfiança pela imensa maioria dos juízes e ao mesmo tempo como a resposta redentora de todas as mazelas da Justiça no Brasil, a criação de um órgão de controle do Judiciário com a participação não restrita a juízes, acabou aos poucos sendo politicamente viabilizada e conseguiu a adesão até de seguimentos da carreira da magistratura, como os juízes do trabalho, representados pela sua entidade nacional a Anamatra. A entidade chegou até mesmo a apresentar proposta para sua constituição e a escolha de seus membros.
O Conselho Nacional de Justiça que surgiu da Emenda Constitucional 45 /04 estava longe de ser o órgão que a entidade defende, especialmente pela sua composição e a forma de escolha, esta última excessivamente concentrada nas cúpulas dos Tribunais. No entanto é forçoso reconhecer que cinco meses após a sua instalação o Conselho já tem apresentado um excelente trabalho ao fazer com que o Judiciário, sua estrutura concentrada e arcaica em muitos locais, seja repensado e discutido por toda a sociedade.
Do ponto de vista interno, a determinação de que as promoções por merecimento sejam feitas por voto aberto foi uma importante vitória para a transparência desse processo nos Tribunais. A fixação de critérios objetivos para a promoção por merecimento, ainda em gestação, consolidará ainda mais o aspecto democrático e dará visibilidade e fundamentação às escolhas, dando efetiva aplicação aos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. A resolução, que apenas dava eficácia ao texto constitucional, encontrou resistência entre dois integrantes da magistratura no âmbito do próprio Conselho e poucas fora dele.
Seguindo as mesmas diretrizes o Conselho expediu resolução que visa extinguir no Judiciário uma das suas maiores mazelas, o nepotismo. A resolução surgiu a partir de um requerimento da Anamatra para a revogação de ato do Tribunal Superior do Trabalho que reconhecia o direito adquirido de parentes de juízes permanecerem nos cargos, mesmo após a edição da Lei 9421/96. A resolução acabou sendo mais ampla e estabeleceu prazo para a demissão dos funcionários parentes dos magistrados que se encontrassem nas condições ali previstas, mas agora em todo o Judiciário Nacional.
As reações já eram esperadas, mas o que se viu ultrapassou qualquer limite da razoabilidade, com magistrados dando vazão a irracionalismos como a recusa ao cumprimento da resolução pura e simplesmente. Essa reação parte, quase que exclusivamente, dos desembargadores de Tribunais de Justiça, por certo carregando o peso de quinhentos anos de cultura que sempre considerou obrigação a proteção aos seus, desde que com o uso da coisa pública.
Essa postura não corresponde ao pensamento da imensa maioria da magistratura, especialmente dos juízes da União e da própria sociedade. Representa, isso sim, o pensamento mais conservador e retrógrado que não traz nenhum ganho para a eficiência da prestação jurisdicional.
Para a manutenção do que já existe invocam argumentos de juridicidade duvidosa. Eles vão desde a impossibilidade do CNJ poder deliberar sobre o tema até o direito adquirido daquilo que nunca foi um direito e jamais poderia ser adquirido, pois em oposição aos princípios constitucionais. Até mesmo uma obscura entidade que diz representar parte da magistratura surgiu do nada para questionar perante o STF a constitucionalidade da resolução.
Na realidade as resistências que se apresentam a essa resolução e a outras iniciativas do Conselho mais do justificam sua criação, quando não para expor à sociedade quem são e onde ficam as resistências às mudanças do Judiciário, à sua democratização e à sua transparência.
Por outro lado também expõe a todos que existe um outro Judiciário, ouso crer majoritário, que não se conforma com a situação atual e quer mudanças para que ele se torne verdadeiramente respeitado e até mesmo querido pela população brasileira. Isso só se tornará possível quando expusermos e enfrentarmos claramente nossos problemas e eliminarmos definitivamente as nódoas que nos afligem. O nepotismo pode ser apenas o primeiro passo.