Na história recente, há listas que salvam e listas que matam.
Nos anos da mais recente ditadura brasileira, o Departamento de Ordem Política e Social - DEOPS, elaborava, à revelia da lei e da ordem, listas de "comunistas", "intelectuais suspeitos" e "inimigos do regime", a partir das quais cidadãos honestos e ativos defensores do Estado de Direito eram investigados, perseguidos, presos e, não raro, mortos.
Durante o holocausto judeu, como restou registrado em conhecido filme com o mesmo nome, a "lista de schindler" possibilitou a salvação de centenas de homens e mulheres perseguidos pelo regime de plantão e jogados, para a morte, nos campos de concentração. Não é demais lembrar que a atuação horrenda do "III Reich" iniciou-se, também, em listas de judeus que seriam "personas non gratas" pelo governo alemão.
A portaria 540 do Ministério do Trabalho e Emprego vem realizando importante parcela da luta pela erradicação do trabalho escravo, com a divulgação dos nomes de empresários e empresas que explorem essa modalidade criminosa de utilização da mão-de-obra humana, dando a conhecer à sociedade os criminosos que assim procedem. A "lista suja" vem sendo utilizada pelas instituições de crédito, para não conceder empréstimos aos empresários e às empresas escravagistas, com o que combate o trabalho em condições desumanas e salva vidas.
Listas que matam, listas que salvam.
Recentemente, a OAB-SP publicou uma nova modalidade de lista: a lista infeliz e inútil.
A entidade, que firmemente combateu o regime não-democrático dos anos de chumbo, adotou a prática do DEOPS, relacionando as autoridades que, sob sua ótica, contrariaram interesses dos membros da corporação. São os novos "inimigos do regime" da advocacia. A lista, infeliz e inútil, vem acompanhada da ameça de que tais autoridades - que vão de servidores a juízes, passando por policiais, delegados e promotores - não conseguirão advogar em São Paulo, porque a entidade negará registro, quando solicitado.
A iniciativa é infeliz, porque recupera práticas hediondas de divulgação de listas-que-matam, desrespeitando a honra e a intimidade dos "listados", sem qualquer fundamento legal, previsão no direito ou respeito, mínimo que seja, aos ditames do devido processo legal e do direito de defesa, garantias do cidadão pelas quais justamente os advogados deveriam ser os primeiros a lutar ferrenhamente.
A iniciativa é inútil, porque a garantia constitucional de liberdade no exercício de quaisquer profissões não permitirá a vingança infantil dos dirigentes atuais da OAB-SP contra as autoridades-non-gratas. O Judiciário, atacado diretamente com a publicação da listinha, não faltará àqueles que, pretendendo advogar, venham a requerer inscrição nos quadros da histórica e importante seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil.
Impossível parece que os advogados, profissionais aguerridos na missão de assegurar as garantias do cidadão, concordem com a atitude ilegal, inútil e infeliz da oab-sp.
O mínimo que se espera, sem prejuízo das possíveis condenações em razão de dano moral impingido contra os "listados", é a pronta retratação da oab-sp, para que não se perca, em atitudes impensadas, o prestígio histórico que aquela entidade amealhou.
(*) Marcos Neves Fava, Juiz do Trabalho em São Paulo, diretor de direitos e prerrogativas da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, ANAMATRA, no biênio 2005-2007, até este momento não incluído na lista negra da oab-sp.