Por metas estruturantes
Por Gabriel Napoleão Velloso Filho (*)
*Presidente da Amatra 8 (PA) e coordenador do grupo de trabalho da Anamatra
1. As metas não são gravadas em bronze ou esculpidas em mármore; muito ao contrário, a metodologia administrativa em voga nos Tribunais – o BSC – caracteriza-se justamente pela possibilidade de visualizar as deficiências e alterá-las a tempo nas Reuniões de Avaliação da Estratégica - RAEs, modificando a estratégia e as metas, quando necessário, para adaptação à realidade. Tanto é assim que uma das quatro perspectivas dessa metodologia é o feedback e o aprendizado. E, para o Poder Judiciário, um dos mecanismos mais eficazes para motivar a necessária mudança é a participação das associações, representando expressiva categoria de interessados ("stakeholders") que acumula o maior nível de conhecimento na instituição: os juízes.
Os juízes são a parcela mais importante do capital intelectual do Poder Judiciário. Em um mundo onde as organizações acumulam valor pela eficiente gestão do seu conhecimento, devem ocupar um lugar de destaque na avaliação do resultado das metas e nas correções que necessitam ser feitas.
Não há como assegurar comprometimento dos magistrados e sua adesão espontânea quando não ocorre sua efetiva participação na elaboração e execução das prioridades institucionais, como determina a Resolução nº 70 do Conselho Nacional de Justiça.
2. A implantação da política de metas no Poder Judiciário teve o inegável mérito de permitir a melhor aferição da produtividade e eficiência dos órgãos judiciários. Cada vez se sedimenta mais a noção de que é necessário envolver o magistrado, como gestor, da formulação e execução da definição das prioridades de trabalho, que lhe afetam diretamente.
Contudo, um efeito nocivo da política de metas foi o estabelecimento de indicadores e metas que não, levaram em consideração a realidade dos órgãos judiciários, nem perocuparam-se em dotá-los de melhores condições de trabalho.
Para a metodologia de trabalho adotada, tão precioso quanto saber quais as metas atingidas, é saber quais não foram alcançadas e qual a razão. É também preciso detectar se as metas estão servindo para que se sejam atingidos os objetivos traçados e se permanecem alinhadas com os valores institucionais, a missão e a visão do Poder Judiciário. Não se trata de alcançar a meta a qualquer custo, mas de saber, quais as razões e obstáculos encontrados, a fim de que possa ser corrigido o plano de ação e a estratégia. Ou, se for o caso, propor que a meta seja reformulada ou excluída.
Não é esta, contudo, a realidade de grande parte dos Tribunais. Uma vez assentadas as metas de produtividade, segue-se que elas devem ser cumpridas, o que gera resistência e desestímulo que alcança a próprio iniciativa de implantação do planejamento estratégico, visto como algo imposto sem a necessária discussão.
3. A participação dos juízes pode desencadear a correção dos planejamentos regionais para inserir um tema caro aos magistrados e ausente da maior parte das metas regionais: as condições de trabalho, que compõem as chamadas metas estruturantes.
A primeira objeção comumente lançada à proposta de metas estruturantes é de ordem técnica: não se tratam propriamente de metas; seriam planos de ação, estabelecidos como forma do atingimento de um resultado expresso em um indicador mais amplo.
Por exemplo: não seria meta a alocação de um assistente para o juiz substituto, na medida em que este não é um fim em si mesmo; metas poderiam ser a redução do prazo médio processual em 30 dias, a elevação do número de julgamentos em 15% e a prolação de 70% das sentenças líquidas. Para chegar-se a esses resultados, faria parte do plano de ação a alocação de um assistente para cada juiz.
Realmente, o sistema do balanced scorecard é bastante rigoroso na exigência de indicadores que servirão de critérios de cumprimento das metas; contudo, nada limita que as metas sejam voltadas a indicadores ligados ao resultado do trabalho.
O que distingue uma meta é que ela obedece a cinco requisitos(*): a) deve ser específica, não deixando dúvidas sobre seu alcance; b) deve ser mensurável, para que se possa aferir se foi cumprida; c) deve ser algo que possa ser alcançado(**); d) deve tratar de um tema relevante para a instituição; e) deve estabelecer um prazo para ser cumprimento. A literatura técnica não exige que verse apenas sobre índices de produtividade.
Esses requisitos podem ser satisfeitos estabelecendo-se “metas estruturantes”. É uma meta válida “alocar um assistente para 100% dos juízes substitutos, até 31 de dezembro de 2011”, porque atende aos cinco requisitos. É também válido: “Lotar pelo menos x servidores nas Varas com mais de 1.500 processos em média nos últimos cinco anos, até 31 de dezembro de 2012”. Muitas outras podem ser elaboradas: detenho-me somente neste exemplo.
A segunda objeção realizada à introdução de metas estruturantes é de ordem política: não seria interessante estabelecê-las porque o foco do planejamento, no âmbito público, é o jurisdicionado. As metas servem para divulgar e esclarecer o público das atividades do Poder Judiciário e é irrelevante para a sociedade saber se o juiz tem ou não assistente ou se a Vara possui ou não número de servidores proporcional ao seu movimento processual.
Na verdade, a crítica parte de um ponto de vista equivocado: o sentido da meta não é comunicar ao público de nossas atividades e sim de apoiar e dar condições ao Poder Judiciário de cumprir sua missão de realizar justiça, com respeito aos valores institucionais e em observância aos objetivos estratégicos.
Por outro lado, explicar ao cidadão “reduzir o congestionamento processual em 40%” ou “aumentar a largura da banda entre as unidades judiciárias e a sede para pelo menos 1 Mbps” pode ser um desafio bem maior que esclarecer sobre o caráter e a necessidade das metas estruturantes referidas como exemplo.
Esta última meta leva à superação da última objeção: não há ineditismo na proposta, pois o aumento da velocidade de acesso à rede, por exemplo, converteu-se em meta nacional do Poder Judiciário e é inegável seu caráter estruturante, muito embora voltada às condições tecnológicas de trabalho. É o tempo de dirigir a prioridades para as necessidades de condições de trabalho dos juízes e servidores.
Estabelecer metas estruturantes é, uma correção necessária na política de metas, incorporando como tema estratégico e prioridade institucional o fornecimento das condições adequadas e necessárias de trabalho.