É escandaloso o nível atingido pelo assédio eleitoral nestas eleições. Em nenhuma outra houve tantas denúncias sobre empresários obrigando seus funcionários a votar em seu candidato, como se o Brasil ainda estivesse na República Velha e as empresas fossem currais eleitorais. Até o último final de semana, o Ministério Público do Trabalho (MPT) havia recebido 1.155 denúncias, o quíntuplo das recebidas em 2018. De acordo com o procurador-geral do trabalho, José de Lima Ramos Pereira, a tentativa de se assenhorear do voto do funcionário, quase sempre os de menor qualificação, é uma violência comparável ao assédio moral ou mesmo ao sexual.
O Sudeste, maior colégio eleitoral, contribui para a estatística de degradação institucional com 461 denúncias, relativas a 378 empresas. O Sul fica em segundo lugar, com respectivamente 335 e 273. Quase todas envolvem assédio para funcionários votarem no candidato Jair Bolsonaro (PL). É o caso da acusação contra a Altenburg, maior fabricante de travesseiros do Brasil, com 1.700 funcionários em Blumenau, Santa Catarina.
Assédio eleitoral:
O sindicato dos trabalhadores na empresa informa ter recebido dez denúncias de que o próprio dono da fábrica afirmou que os empregos estariam em risco caso Lula voltasse à Presidência. O proprietário, Ruy Altenburg, parou a fábrica, reuniu os trabalhadores e falou sobre uma série de questões da eleição. Até em demissão, caso o presidente não fosse reeleito, afirmou o presidente do sindicato, Carlos Maske. A Altenburg foi notificada pelo MPT para abster-se de obrigar ou induzir seus funcionários a votar em qualquer candidato.
Em Minas Gerais, segundo maior eleitorado do Brasil, onde Lula derrotou Bolsonaro no primeiro turno, o governador Romeu Zema (Novo) lidera os esforços para que o presidente vire o jogo no segundo. Em Passos, três empresários do comércio são acusados de um dos mais graves casos de assédio eleitoral. Em vídeo, Gilson Madureira (comércio varejista), Renato Mohallen (associação comercial) e Frank Lemos (clube dos dirigentes e lojistas) orientaram os associados a coagir funcionários a votar em Bolsonaro. A Justiça concedeu liminar, a pedido dos procuradores, proibindo o uso da estrutura das entidades no assédio eleitoral. Fixou multas de R$ 30 mil a R$ 1 milhão caso desobedecessem à determinação. Minas apresenta a maior quantidade de denúncias (301).
Propaganda eleitoral:
Há casos mais prosaicos, mas não menos inacreditáveis. Donas de casa de Quirinópolis, cidade de 51.300 habitantes no interior de Goiás, criaram no WhatsApp um grupo com o número do candidato Jair Bolsonaro para coagir empregadas domésticas e até comerciantes, em postagens ilustradas por vídeos com desinformação sobre o petista Luiz Inácio Lula da Silva.
É evidente que as multas e os Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) que os infratores assinam com o MPT não têm funcionado como dissuasão, simplesmente porque as penas são leves. A diretora da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Patrícia SantAnna, defende uma legislação que defina de forma mais clara as infrações e que as punições sejam mais duras. Alguns casos deveriam tramitar na esfera criminal, em que há a previsão de penas de até três anos de reclusão. Parece que só quando alguém for preso ou alguma candidatura for cassada, a legislação será levada a sério. Tudo está na lei, só falta aplicá-la.