Manifesto pela democracia repudia 'aventura política, que visa a perenizar uma crise institucional artificialmente criada'. Além de associações da magistratura, governadores preparam resposta à iniciativa de Bolsonaro
ANDRÉ DE SOUZA
Um dia depois de o presidente ]air Bolsonaro ter enviado ao Senado um pedido de impeachment contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação dos Juizes Federais do Brasil (Ajufe) e um grupo de dez ex-ministros da Justiça e da Defesa se manifestaram contra a iniciativa. Moraes é o relator de inquéritos no STF que envolvem Bolsonaro, aliados e apoiadores. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já indicou que deverá rejeitar o pedido.
"O Superior Tribunal de Justiça vem a público expressar sua preocupação com o pedido de impeachment apresentado contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, no pleno exercício de suas atribuições constitucionais", informou o STJ em nota, destacando que os Poderes são independentes e harmônicos entre si. O texto ressalta que a atividade do Judiciário está "diretamente vinculada ao fortalecimento da democracia e do Estado de Direito", e que "a convivência entre os Poderes exige aproximação e cooperação", respeitados seus limites e a Constituição.
Um grupo de dez ex-ministros da Justiça e da Defesa divulgou um "manifesto em defesa da democracia" pedindo que Pacheco rejeite o impeachment. Segundo eles, Bolsonaro segue "o roteiro de outros líderes autocratas ao redor do mundo que, alçados ao poder pelo voto, buscam incessantemente fragilizar as instituições do Estado Democrático de Direito, entre as quais o Poder Judiciário".
Para os ex-ministros, o pedido é destituído de "justa causa", sendo "mero capricho do mandatário do país a transformar o Senado Federal em instrumento de perseguição pessoal e de meio para tumultuar a nação". O documento é assinado por Miguel Reale Júnior, José Eduardo Cardoso, José Gregori, José Carlos Dias, Aloysio Nunes Ferreira, Tarso Genro, Celso Amorim, Eugênio Aragão, Jacques Wagner e Raul Jungmann.
Segundo eles, "essa aventura política, que visa a perenizar uma crise institucional artificialmente criada, deve ser cortada em seu nascedouro". Para os ex-ministros, o prosseguimento de um processo de impeachment contra Moraes terá "efeitos nocivos à estabilidade democrática, de vez que indicará a prevalência de retaliação a membro de nossa Corte Suprema".
Bolsonaro também ameaça apresentar outro pedido de impeachment contra o ministro Luís Roberto Barroso, integrante do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Defensor das urnas eletrônicas, Barroso se contrapôs aos ataques sem provas promovidos por Bolsonaro contra o sistema de votação usado no Brasil. O ex-ministros também criticaram Bolsonaro por pôr em dúvida a segurança das urnas.
NA PAUTA DE GOVERNADORES
Em nota de repúdio conjunta, os presidentes da AMB, Renata Gil,e da Ajufe, Eduardo André Brandão, disseram ter certeza de que "as instituições em especial, o Senado Federal - saberão reagir a toda e qualquer tentativa de rompimento do Estado de Direito e da ordem democrática". Afirmaram que o pedido de impeachment de Moraes "representa um ataque frontal à independência e à harmonia entre os Poderes", contrariando a Constituição, e que "decisões judiciais devem ser contestadas no âmbito do Poder Judiciário e jamais por meio de instrumentos políticos".
O presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Antonio Colussi, disse que pedidos de impeachment contra ministros do STF feitos por outros Poderes "infringem de forma visceral" o artigo da Constituição que prevê Poderes independentes e harmônicos entre si.
Amanhã, está previsto o IX Fórum Nacional de Governadores, com a presença confirmada de 24 deles, como informou o colunista do GLOBO Lauro Jardim. Na pauta, entre outros itens, está a "defesa da democracia".
- Com os governadores que se sentirem à vontade, vamos defender a democracia, que o país mantenha suas instituições e condenado qualquer flerte ou iniciativa autoritária no país - disse João Doria, governador de São Paulo, durante visita ao Rio, sobre o encontro, articulado por ele e pelo governador do Piauí, Wellington Dias (PT).
Os governadores do Rio, Cláudio Castro, do Paraná, Ratinho Júnior, e do Tocantins, Mauro Carlesse, ainda não confirmaram presença.
---
"O presidente segue o roteiro de outros líderes autocratas ao redor do mundo que, alçados ao poder pelo voto, buscam incessantemente fragilizar as instituições do Estado Democrático, entre as quais o Poder Judiciário'
Manifesto de dez ex-ministros da Justiça e da Defesa