Segundo a entidade, a Constituição estabelece a irredutibilidade salarial e a garantia do salário-mínimo como direitos humanos
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) afirmou que a medida provisória editada no domingo pelo governo Jair Bolsonaro é inconstitucional, além de "inoportuna e desastrosa". A entidade afirmou que a medida significa lançar "os trabalhadores à própria sorte".
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O texto da MP autoriza a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, durante o período de enfrentamento do coronavírus.
Para a entidade, a "MP nº 927, de forma inoportuna e desastrosa, simplesmente destrói o pouco que resta dos alicerces históricos das relações individuais e coletivas de trabalho, impactando direta e profundamente na subsistência dos trabalhadores, das trabalhadoras e de suas famílias, assim como atinge a sobrevivência de micro, pequenas e médias empresas, com gravíssimas repercussões para a economia e impactos no tecido social".
A Anamatra diz ainda que, "em pleno contexto de tríplice crise - sanitária, econômica e política", a MP "lança os trabalhadores e as trabalhadoras à própria sorte". "Afirma-se a possibilidade de se prolongar a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sem qualquer garantia de fonte de renda ao trabalhador e à trabalhadora, concedendo-lhes apenas um curso de qualificação, que dificilmente poderão prestar em quarentena, e limitando-se a facultar ao empregador o pagamento de uma ajuda de custo aleatória, desvinculada do valor do salário-mínimo", disse.
Par a associação, a decisão de Bolsonaro vai "na contramão de medidas protetivas do emprego e da renda que vêm sendo adotadas pelos principais países atingidos pela pandemia", como França, Itália, Reino Unido e Estados Unidos, classificados pela entidade como "centro do capitalismo global".
A entidade afirma que MP impõe apenas "o sacrifício individual das pessoas que necessitam do trabalho para viver" e aponta outras medidas que poderiam ser tomadas pelo governo: como a taxação sobre grandes fortunas, a redução dos juros bancários, inclusive sobre cartão de crédito e isenção de impostos sobre folha de salário e sobre a circulação de bens e serviços, de forma extraordinária, para desonerar o empregador.
Também afirma que "a forte, e necessária participação estatal, assumindo parte dos salários, não aparece como solução" e que há um "silêncio injustificável" do governo em relação "à proteção aos trabalhadores e às trabalhadoras informais
A Anamatra argumenta ainda que as inconstitucionalidades da MP "são patentes". "A Constituição de 1988 deve ser invocada sobretudo nos momentos de crise, como garantia mínima de que a dignidade dos cidadãos e das cidadãs não será desconsiderada", diz.
Segundo a entidade, a Constituição estabelece a irredutibilidade salarial e a garantia do salário-mínimo como direitos humanos e adota o regime de emprego como sendo o capaz de promover a inclusão social.
A nota é assinada pela presidente da Anamatra, Noemia Porto. Ao todo, a associação representa quase 4 mil magistrados do Trabalho de todo o Brasil.
(Conteúdo publicado originalmente no Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor)
Por Isadora Peron, Valor -- Brasília