Mudança abriria espaço para folga de R$ 27 bi no Orçamento de 2020 e faz parte do pacote de medidas que deve ser apresentado na próxima semana. Ações incluem fim de licença especial de servidor e de férias de dois meses para juízes
MANOEL VENTURA E MARCELLO CORRÊA
BRASÍLIA
O ministro da Economia, Paulo Guedes, finaliza os detalhes do pacote de medidas que pretende apresentar na próxima semana. O anúncio formal deverá ser na terça-feira, quando Guedes deve ir pessoalmente ao Congresso entregar as propostas. O conjunto de medidas tem o objetivo de aumentar o controle sobre os gastos públicos, alterar regras sobre o Orçamento e ampliar os repasses federais para estados e municípios. Também será apresentada a reforma administrativa, que irá mexer nas regras sobre funcionários públicos.
Benefícios fiscais
Uma das medidas em elaboração prevê um corte nos incentivos tributários atualmente em vigor. Segundo fontes a par da formulação do pacote, a medida deve significar uma folga de R$ 27 bilhões no Orçamento do próximo ano.
A proposta de Guedes prevê corte linear de 10% nos "gastos tributários", incentivos a setores da economia por meio da redução de impostos, segundo fontes. Isso inclui programas como o Simples Nacional. O corte pouparia apenas incentivos regionais, como a Zona Franca de Manaus.
Em 2020, o Orçamento prevê uma renúncia total de cerca de R$ 330 bilhões com gastos tributários. Os cálculos do governo excluem dessa base os benefícios reginais, que serão preservados. Sem eles, a renúncia soma R$ 270 bilhões. A partir desse número haveria um corte de 10% em todos os benefícios, liberando um espaço de R$ 27 bilhões.
A medida prevê ainda um controle maior sobre os incentivos fiscais. A ideia de Guedes é que todos os incentivos passem por uma avaliação pelos próximos quatro anos. Após essa avaliação, caberia ao Congresso manter ou rejeitar cada um deles. Isso é parte da defesa que Guedes faz de dar maior poder à classe política na definição do Orçamento público.
Por enquanto, Guedes prevê mandar três propostas de Emenda à Constituição (PEC) sobre Orçamento, além da reforma administrativa. Uma das PECs deve desvincular, desobrigar e desindexar parte do Orçamento federal e dos estados e municípios. O mesmo texto poderá ainda incluir medidas para aumentar repasses para os governos regionais.
Outra PEC irá criar o "Estado de Emergência Fiscal" para União, estados e municípios, com previsão de corte de gastos em todas as esferais. Haverá ainda uma terceira proposta, para alterar os fundos públicos. O governo contou 280 fundos, dos quais alguns serão eliminados. O dinheiro que está acumulado nesses fundos deve ser destinado para abater a dívida pública. Os fundos constitucionais de Centro-Oeste, Norte e Nordeste serão poupados.
Licença de três meses
Na reforma administrativa, o governo avalia avalia acabar com a licença especial de três meses a que servidores públicos têm direito. O objetivo é rever uma série de benefícios que, na avaliação dos técnicos, reforça um sistema de privilégios no funcionalismo.
O beneficio da chamada licença-capacitação consiste em um período de afastamento, no qual o funcionário público pode participar de curso de capacitação em sua área. A licença pode ser tirada a cada cinco anos de trabalho. O sistema substituiu a antiga licença-prêmio, extinta em 1997 e que garantia uma folga de três meses, também a cada cinco anos, como gratificação pela assiduidade, sem exigência de realização de curso de capacitação.
A ideia da equipe econômica é que servidores que ingressarem no funcionalismo após as novas regras não possam mais ter esse tipo de benefício. A medida não afetaria quem está na ativa atualmente.
Judiciário
Nessa mesma proposta, Guedes pretende acabar com a regra que hoje permite que servidores públicos e magistrados do Poder Judiciário tirem férias de dois meses. Hoje, as regras sobre férias dos servidores não estão previstas na Constituição. Magistrados têm direito ao benefício graças à Lei Orgânica da Magistratura Nacional, editada em 1979, que garante "férias anuais, por sessenta dias, coletivas ou individuais". Já a lei que regula os servidores em geral, de 1990, prevê que servidores em geral têm direito a 30 dias de férias.
A Constituição prevê que só o Supremo Tribunal Federal (STF) pode propor alteração nessa legislação. No entanto, como se trata de uma PEC, a mudança será feita no próprio texto constitucional. A ideia é que o novo texto uniformize as regras, deixando claro que nenhum servidor terá direito a férias de mais de 30 dias.
Técnicos do governo avaliam que a mudança não configura interferência do Executivo em outros Poderes, mas há risco de contestação.
- Aceitar emenda constitucional que por via indireta tenta alterar a lei orgânica é como se a gente fizesse uma gambiarra legislativa. Isso afeta a harmonia, independência e equi-distância da separação de Poderes - afirmou Noemia Porto, presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra).
Tramitação
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro defendeu aproveitar projetos que já estão na Câmara para acelerar a tramitação da reforma administrativa. A ideia seria que parlamentares aliados ao governos apresentassem emendas a propostas em tramitação.
- Tem reforma tramitando na Câmara, tem a nossa, que vai ficar pronta, devo despachar com o Paulo Guedes, com toda a certeza, na segunda-feira. Na minha opinião, vamos aproveitar a que está andando e buscar via parlamentares ligados a nós emendar. No meu entender, a tramitação é mais rápida- disse, na saída do Palácio da Alvorada, ao ser perguntado sobre o envio da proposta.
Colaboraram Daniel Gullino e Gustavo Maia