O Brasil tem até novembro deste ano para apresentar informações à OIT sobre a reforma trabalhista. A Organização Internacional do Trabalho quer saber se a nova lei fere normas internacionais do trabalho. A reforma, tema da Reportagem Especial desta e da próxima semana, também é questionada na justiça brasileira. Cabe ao Supremo Tribunal Federal decidir sobre mais de 20 ações de inconstitucionalidade apresentadas sobre pontos da nova lei.
Em 2018, o comitê de especialistas do OIT, Organização Internacional do Trabalho, que acompanha a aplicação das convenções da entidade pelos países-membros pediu ao Brasil mais informações a respeito da adequação da Reforma Trabalhista aos direitos previstos nas normas da entidade.
Entre os pontos questionados, estão as novas regras de negociação coletiva e individual entre patrões e empregados. Sobre esses temas, a OIT pediu, ainda, que o Brasil examine a possibilidade de revisar essas normas de modo a adequá-las à convenção da OIT que trata do assunto.
Além do Brasil, outros 23 países receberam esse pedido de mais informações para que o Comitê avalie se as normas da OIT estão sendo devidamente cumpridas. Na visão do ex-ministro do Trabalho Helton Yomura a inclusão do Brasil nessa chamada lista curta, que também foi chamada pela imprensa de “lista suja da OIT”, foi uma decisão político-partidária.
Helton Yomura: “Fui a Genebra fazer uma defesa técnica e muito entusiasmada desse nosso ponto de vista e a conclusão da comissão de aplicação de normas da OIT foi simplesmente a de pedir mais informações ao Brasil até novembro. Então nós vamos avaliar esse relatório, essa conclusão da OIT e vamos prestar as informações a seu tempo e modo devido. Prestadas as informações, o caso está encerrado.”
O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho teve assento na última reunião da OIT, realizada de maio a junho de 2018. Segundo um de seus representantes, Alex Myller, o Brasil está na lista pela suspeita de que alguns pontos da Reforma Trabalhista estejam em conflito com determinações do órgão internacional.
Alex Myller: “Existem convenções da OIT sobre negociação coletiva que têm um óbvio intuito de que a negociação seja para garantir mais direitos e, com a Reforma Trabalhista, aparentemente, o recado que está na norma é de que se poderiam negociar situações para reduzir os direitos dos trabalhadores. Se isso for para ser permitido, isso viola as convenções que o Brasil assumiu e, portanto, essa norma não teria vigor porque essa convenção tem uma validade no Brasil, um status que se chamaria de supralegal; ela só está abaixo da Constituição.”
O Brasil tem até novembro deste ano para apresentar as informações solicitadas pela OIT.
Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal tem a missão de decidir a respeito de mais de 20 ações de inconstitucionalidade apresentadas sobre pontos da Reforma Trabalhista. Entre as regras em debate estão aquelas relacionadas ao afastamento de gestantes e lactantes de atividades insalubres, ao trabalho intermitente, à negociação coletiva e à gratuidade da Justiça.
Somando as demandas da OIT, as mais de 20 ações de inconstitucionalidade, uma medida provisória editada, mas não aprovada e as promessas do governo de edição de decreto para alterar novamente as leis trabalhistas, o que se tem, na visão do vice-procurador-geral do Ministério Público do Trabalho, Luiz Eduardo Bojarto, é a impossibilidade de se definir claramente os novos conceitos.
Luiz Eduardo Bojarto: “A gente não consegue ter um entendimento. Essa é a dificuldade de compreensão que a sociedade tem e que nós temos. Quem está fazendo está fazendo por sua conta e risco. Vale? Não sei. Tem certeza que vale? Não. Não vale? Não sei. Tem certeza que não vale? Não. É lícito fazer dessa forma? Não sei. É constitucional? Talvez, quem sabe, não sei. Não veio lei, não veio decreto, não veio nada que nos desse alguma segurança e não virá nada que possa dar uma segurança na medida em que toda a questão jurídica vai levar muitos anos para se sedimentar. Quem está fazendo, quem está implementando está fazendo por sua conta e risco. Ousadia.”
O deputado Rogério Marinho, do PSDB do Rio Grande do Norte, que relatou o projeto da Reforma na Câmara, diz que é natural haver divergências na interpretação da nova lei, mas que elas já começaram a ser pacificadas pelo Supremo Tribunal Federal.
Rogerio Marinho: “No mundo inteiro, quando há intervenções desse porte na legislação do trabalho, é necessário que as eventuais dissensões sejam dirimidas e pacificadas pela jurisprudência dos tribunais superiores. Na Espanha e Portugal, por exemplo, isso demorou quase três anos. No Brasil, a gente já começou a votar, com menos de sete meses, a primeira ADI ofertada.”
No dia 29 de junho, por 6 votos a 3, o Supremo declarou a constitucionalidade do fim da obrigatoriedade da contribuição sindical. Assim, fica valendo a mudança imposta pela Reforma Trabalhista de só se fazer a cobrança da contribuição sindical quando houver autorização prévia e expressa do empregado.
Em outubro de 2017, a Anamatra, Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, divulgou documento com 125 enunciados sobre a interpretação e a aplicação da Reforma Trabalhista. O texto foi debatido e aprovado por mais de 600 juízes, procuradores e auditores fiscais do Trabalho, além de advogados e outros operadores do Direito. O que o documento diz, em resumo, segundo o presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, é que esses profissionais vão interpretar a Reforma Trabalhista à luz da Constituição e das convenções e tratados internacionais assinados pelo Brasil.
A prevalência do negociado sobre o legislado e o fim do imposto sindical obrigatório são duas das mudanças mais polêmicas da reforma trabalhista. Entenda no próximo capítulo.
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