A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho(Anamatra) defendeu, na 107ª Conferência Internacional do Trabalho, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, que a reforma trabalhista tolhe a autonomia da magistratura. O ponto atacado foi a exigência de aplicação literal da nova CLT, que ameaçaria a independência judicial e a proteção aos direitos humanos e trabalhistas.
O argumento foi defendido pela vice-presidente da Anamatra, Noemia Porto, e pela diretora de Cidadania e Direitos Humanos da entidade, Luciana Conforti, e uma carta aberta foi distribuída. No texto, a entidade afirma ainda que sofre represália por parte do governo brasileiro.
"Por essa razão, supõe-se que a Anamatra tenha sido excluída da delegação do Governo Brasileiro, nesta 107ª Conferência Internacional do Trabalho - após integrá-la por 8 anos -, em aparente retaliação política."
A premissa tem sido defendida pela Anamatra ao longo da discussão sobre a reforma trabalhista. No congresso da entidade, em 5 de maio, a categoria aprovou entendimento de que os juízes do trabalho são livres para interpretarem a reforma trabalhista conforme a convicção, motivada, que tiverem e não podem ser tolhidos nas suas decisões.
Em carta aberta distribuída em Genebra, elas consideraram importante ressaltar não se tratar de um "boicote", já que foi levantado, segundo o texto, que a posição se enquadra em uma espécie de desobediência civil.
"Esclarece a Anamatra que não há 'boicote' dos juízes e juízas do Trabalho brasileiros na aplicação da nova lei, como sequer poderia haver. Reiteram, porém, a sua independência funcional no ato de interpretar a legislação em vigor, com fundamento na Constituição e nas normas internacionais de proteção ao trabalho e aos direitos humanos dos trabalhadores", diz a nota.
O texto argumenta que a reforma é questionada em 21 ações diretas de inconstitucionalidade, o que demonstra controvérsia sobre a matéria, que a existência e autonomia da Justiça do Trabalho é essencial para a pacificação dos conflitos e redução de desigualdades sociais e que a reforma trabalhista trouxe "visível precarização das relações de trabalho".
Uma das ocasiões em que a carta foi entregue foi durante reunião promovida pela Confederação Latino-Americana e Caribe dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Estatais. O encontro debateu "O Futuro do Trabalho no Serviço Público". A vice-presidente da Anamatra manifestou-se na reunião e tratou dos temas da carta. Na avaliação de Noemia Porto, a fala foi recebida com preocupação pelos presentes.
"É dever da Anamatra publicizar, debater e denunciar todas as formas e os instrumentos que tenham por finalidade agredir a independência judicial, seja mediante ameaças de extinção da Justiça do Trabalho, seja por matérias da mídia que classificam pejorativamente a atuação da magistratura. Defender a independência técnica dos juízes e das juízas é o mesmo que defender a democracia e o Estado de Direito".
Na mesma linha, Luciana Conforti defendeu que "o tema da independência de atuação institucional, compromissária da Constituição e das normas internacionais, revela-se sensível para os organismos internacionais. De fato, o funcionamento independente das instituições, livres de quaisquer ameaças, é vista como fundamental para coibir desequilíbrios e a permanência das desigualdades, aspectos centrais para a qualidade da democracia brasileira", avaliou a diretora de Cidadania e Direitos Humanos.
Lista suja
Na terça-feira, a OIT decidiu incluir o Brasil na lista dos 24 casos que entende como as principais violações de suas convenções trabalhistas no mundo. Segundo o organismo, a reforma trabalhista viola convenções internacionais. O Brasil é signatário de 80 convenções da OIT. Desde então, entidades interessadas no tema têm se manifestado a respeito.
Não é unânime o entendimento de que a reforma tem irregularidades. A Confederação Nacional da Indústria declarou na terça que a Lei 13.467/2017 "busca fomentar o diálogo entre empresas e empregados", cumprindo as convenções 98 e 154 da OIT.
Em nota oficial direcionada ao diretor-geral do organismo, Guy Ryder, o ministro do Trabalho, Helton Yomura, acusa a OIT de politização da análise da reforma trabalhista. Para o chefe da pasta, o Comitê de Peritos examinou a situação brasileira "fora do ciclo regular sem justificação objetiva, transparente e adequada para tanto".
Em resposta, a Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat), afirma que o Ministério do Trabalho cometeu equívocos e tenta se escusar de ser avaliado pela OIT. A associação acusa o governo brasileiro de tentar controlar o órgão controlador.