Advogados temem que resistência da Justiça trabalhista em aceitar mudanças possa retardar implementação da lei
TAÍS HIRATA
DE SÃO PAULO
A Justiça do Trabalho avalia não aplicar parte das novas regras da reforma trabalhista por considerar que elas violam direitos previstos na Constituição ou em convenções internacionais.
O novo texto, que passará a valer no mês que vem, foi discutido detalhadamente por magistrados, procuradores e advogados, que se reuniram na segunda (9) e na terça-feira (10) em congresso da Anamatra (associação dos magistrados do trabalho).
"Comenta-se que os juizes não querem aplicar a lei, mas nosso papel é interpretar o texto, o que não pode ser feito de modo literal", afirma o presidente da associação, Guilherme Feliciano.
Os posicionamentos definidos no evento não vão valer como regra geral, mas como princípios norteadores. A tendência, porém, é que cada juiz faça a sua leitura.
A mobilização foi interpretada por advogados trabalhistas como uma prévia das dificuldades que vão acompanhar a implementação da nova legislação.
O posicionamento dos magistrados já era esperado, segundo Cássia Pizzoti, sócia da área trabalhista no Demarest. "Antes mesmo de a reforma sair, a Anamatra já se posicionava contra", diz ela.
A jurisprudência em torno da reforma, porém, pode demorar por causa da resistência de integrantes da Justiça trabalhista, afirma.
O processo já é lento, diz José Carlos Wahle, coordenador da área trabalhista do escritório Veirano. "A tramitação pode levar de dois a três anos nos tribunais regionais; de quatro a cinco anos nos tribunais superiores; e ainda mais tempo se for ao STF."
A discussão, porém, pode ter o efeito positivo de orientar os magistrados pelo país e tentar evitar interpretações divergentes, afirma Wahle.
A prevalência dos acordos coletivos sobre a legislação, um dos maiores pleitos das empresas durante a discussão da reforma, foi questionada pelos magistrados.
O novo texto já trazia restrições - direitos como salário e férias não poderão ser discutidos nos acordos. Os juizes, porém, consideram que há mais itens inconstitucionais.
Incluíram pontos como organização da jornada de trabalho, avaliação do grau de salubridade e remuneração por produtividade.
A terceirização também foi criticada. Acordou-se que funcionários diretos e terceirizados deveríam ter os mesmos salários e benefícios.
Pela nova lei, a igualdade de remuneração é opcional, o que violaria princípios de isonomia previstos pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), diz Feliciano.
"Na prática, isso pode barrar a terceirização da atividade-fim. A ideia é colocar terceirizados com salário menor na mesma função de empregados diretos", afirma.
O mesmo princípio da isonomia foi usado no caso de trabalhadores intermitentes.
Além do risco de discriminação, discutiu-se a possibilidade de as empresas transformarem todos os trabalhadores em intermitentes. Foi acordado que a contratação só valería para atividades intermitentes, como buffets de fins de semana. Negócios que operam diariamente, como restaurantes, foram excluídos.