Fábio Mazzitelli
Promovida pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho reuniu na semana passada 600 juízes, procuradores, auditores fiscais do Trabalho, advogados trabalhistas, entre outros operadores do Direito, para debater a aplicação da lei da reforma trabalhista (13.467/2017), que entrará em vigor em 11 de novembro.
Da jornada surgiram teses que levantaram pontos controversos da reforma trabalhista, passíveis de contestação de constitucionalidade e que erguem um cenário complexo para a aplicação da nova lei, de acordo com a Anamatra.
O resultado dos debates e das teses será reunido em um documento a ser divulgado nesta semana pela associação dos magistrados. O principal temor é que a aplicação da reforma trabalhista leve insegurança jurídica às relações de trabalho, gerando Brasil afora interpretações diferentes para casos semelhantes.
A Coluna do Fraga exemplifica abaixo parte dos pontos considerados controversos durante a jornada da Anamatra.
Terceirização da atividade principal de uma empresa: os estudos indicaram que pode gerar uma distorção em relação a salários entre dois funcionários que desempenhem as mesmas funções, na mesma companhia e na mesma cidade, dependendo do tipo de vínculo do trabalhador. Exemplo: um empregado direto de uma fábrica pode ganhar R$ 3.000 mensais e um colega que trabalha na mesma função pode ser contratado por uma terceirizada ganhando a metade do salário. Com base no princípio da igualdade perante a lei, a própria CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) prevê no artigo 461 que “sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário”.
Gestantes em trabalho insalubre: mulheres grávidas ou que estão amamentando, hoje proibidas de trabalhar em qualquer tipo de atividade insalubre, terão de apresentar atestado médico para garantir o afastamento para amamentar e, em alguns casos, também durante a gestação. A brecha para o trabalho insalubre da gestante ou da lactante feriria a garantia de integridade à criança.
Trabalho intermitente (descontínuo): nesse caso, trabalhadores recebem apenas por horas trabalhadas, mediante convocação prévia do empregador; no entendimento da jornada realizada pelos magistrados, admitindo-se a constitucionalidade desse ponto, só poderia ser aplicado em atividades igualmente intermitentes, como por exemplo em serviços pontuais em buffet ou em trabalhos em um festival de rock. Se aplicado a uma atividade econômica não intermitente (contínua), entraria em choque com convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da qual o Brasil é país signatário.
Jornada de trabalho: a reforma trabalhista faz a previsão da possibilidade de acordo individual, do trabalhador diretamente com a empresa, para a jornada 12x36 (12 horas trabalhadas por 36 horas de descanso). A Constituição submete a jornada de trabalho apenas a acordo ou convenção coletiva, feita por sindicato (não individualmente).
Negociado sobre o legislado: nesse item, a reforma trabalhista traz mais de um ponto considerado contraditório pelos juízes; um exemplo é a permissão para negociar, mediante acordo coletivo de trabalho, prorrogação de jornada em ambientes insalubres ao mesmo tempo em que a nova lei afirma que normas de saúde e segurança do trabalho são direitos inegociáveis.
Benefício da Justiça gratuita aos pobres: se faltar a uma audiência sem justificar, o trabalhador beneficiário da gratuidade poderia ter de pagar custas de um processo –-mesmo tendo comprovado ser pobre. Além disso, a reforma trabalhista também fixa um teto para a Justiça gratuita --só que, por ser uma lei ordinária, não poderia sobrepor-se ou tornar mais restrito preceito da Constituição.