Congresso aprovou PEC que cria quatro novos TRFs, e Barbosa é contra.
Em resposta à declaração do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, de que as entidades que reúnem magistrados atuaram de forma "sorrateira" ao apoiar a criação de quatro novos tribunais regionais federais, as associações de juízes divulgaram nota oficial nesta terça-feira (9) na qual afirmam que Barbosa foi "desrespeitoso" e "grosseiro".
O modo como tratou as Associações de Classe da Magistratura não encontra precedente na história do Supremo Tribunal Federal, instituição que merece o respeito da magistratura." Nota oficial divulgada pelas entidades de magistrados
"O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo que ocupa. Ao permitir, de forma inédita, que jornalistas acompanhassem a reunião com os dirigentes associativos, demonstrou a intenção de dirigir-se aos jornalistas, e não aos presidentes das associações, com quem pouco dialogou, pois os interrompia sempre que se manifestavam", afirma a nota - veja a íntegra no fim da reportagem.
Barbosa se reuniu na segunda com os presidentes da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Jornalistas puderam acompanhar a audiência. O presidente do STF é contra a criação dos TRFs sob o argumento de que o custo é elevado e que caberia ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidir sobre novos tribunais.
Segundo a nota das entidades, Joaquim Barbosa "mostrou sua enorme dificuldade em conviver com quem pensa de modo diferente do seu, pois acredita que somente suas ideias sejam as corretas".
"O modo como tratou as Associações de Classe da Magistratura não encontra precedente na história do Supremo Tribunal Federal, instituição que merece o respeito da magistratura", afirmam as entidades. As associações disseram que mantiveram respeito com o presidente.
"Como tudo na vida, as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do Supremo Tribunal Federal contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes."
Perguntado sobre o episódio antes da sessão de turmas do STF nesta terça, o ministro do tribunal Ricardo Lewandowski disse que não comentaria o episódio. "Cada qual responde por seus atos e palavras", afirmou.
OAB
Também nesta terça, a Ordem dos Advogados do Brasil se manifestou de forma crítica sobre as declarações de Barbosa, que durante a discussão, disse que R20;os tribunais vão servir para dar emprego para advogados". Em nota, a entidade disse que as afirmações "causam espécie".
"O Conselho Federal da OAB entende do seu dever refutar e repudiar tais declarações, por inexatas, impertinentes e ofensivas à valorosa classe dos advogados", diz a nota. A Ordem, que apoiou a criação dos tribunais, disse que a aprovação da emenda constitucional observou o processo legislativo, incluindo a realização de audiências públicas.
"Não faz sentido nem corresponde à relevância do tema supor que a criação de novos Tribunais Regionais Federais objetive criar empregos, muito menos para os advogados. Em momento algum cuidou-se de favorecimento à classe dos advogados ou de interesses que não fossem os do aprimoramento da Justiça Federal no Brasil", reitera a nota.
No Senado, o relator da PEC, Jorge Viana (PT-AC), lamentou as declarações de Barbosa. "Não foi de maneira sorrateira. Foi embasada numa sede por justiça que nós temos. Os tribunais regionais federais ou são implantados ou o caos se instala no judiciário federal", disse.
Segundo o senador, atualmente 70 milhões de pessoas dependem de um único tribunal federal, que é o da Regional da Primeira Região - inclui estados do Centro-Oeste, Norte e Nordeste.
Discussão tensa
Durante a discussão, o ministro Joaquim Barbosa argumentou que o CNJ não foi ouvido sobre os novos TRFs e que as associações induziram o Congresso ao erro - veja no vídeo ao lado.
"Pelo que eu vejo, vocês participaram de forma sorrateira na aprovação. [...] São responsáveis, na surdina, pela aprovação."
E Ivanir César Ireno Junior, da Ajufe, rebateu de forma dura: "Sorrateira, não, ministro. Sorrateira, não. [De forma] Democrática e transparente."
Joaquim Barbosa travou uma tensa discussão, então, com o vice-presidente da associação. "O senhor abaixe a voz que o senhor está na presidência do Supremo Tribunal Federal." O vice reagiu afirmando que estava só argumentando. E Barbosa completou: "Então só me dirija a palavra quando eu lhe pedir."
Em outro momento do debate, Joaquim Barbosa disse que as entidades defendiam os novos tribunais porque criariam empregos. "É muito bom para a advocacia a criação de quatro novos tribunais com mais milhares de empregos de juízes. [...] Mas isso não é o interesse da nação", disse.
Quando Nino Toldo afirmou que queriam apresentar um estudo sobre o tema, Barbosa ironizou: "Esses tribunais vão ser criados em resorts, em alguma grande praia."
O encontro começou tenso porque o presidente do STF não queria que todos os presentes participassem, como diretores e vice-presidentes das entidades. No entanto, acabou liberando a entrada. Ao término do encontro, pediu que "da próxima vez", compareçam apenas aqueles que pediram a audiência.
Confira a íntegra na nota:
"A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), entidades de classe de âmbito nacional da magistratura, considerando o ocorrido ontem (8) no gabinete do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), vêm a público manifestar-se nos seguintes termos:
1. O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo que ocupa.
2. Ao permitir, de forma inédita, que jornalistas acompanhassem a reunião com os dirigentes associativos, demonstrou a intenção de dirigir-se aos jornalistas, e não aos presidentes das associações, com quem pouco dialogou, pois os interrompia sempre que se manifestavam.
3. Ao discutir com dirigentes associativos, Sua Excelência mostrou sua enorme dificuldade em conviver com quem pensa de modo diferente do seu, pois acredita que somente suas ideias sejam as corretas.
4. O modo como tratou as Associações de Classe da Magistratura não encontra precedente na história do Supremo Tribunal Federal, instituição que merece o respeito da Magistratura.
5. Esse respeito foi manifestado pela forma educada e firme com que os dirigentes associativos portaram-se durante a reunião, mas não receberam do ministro reciprocidade.
6. A falta de respeito institucional não se limitou às Associações de Classe, mas também ao Congresso Nacional e à Advocacia, que foram atacados injustificadamente.
7. Dizer que os senadores e deputados teriam sido induzidos a erro por terem aprovado a PEC 544, de 2002, que tramita há mais de dez anos na Câmara dos Deputados ofende não só a inteligência dos parlamentares, mas também a sua liberdade de decidir, segundo as regras democráticas da Constituição da República.
8. É absolutamente lamentável quando aquele que ocupa o mais alto cargo do Poder Judiciário brasileiro manifeste-se com tal desprezo ao Poder Legislativo, aos Advogados e às Associações de Classe da Magistratura, que representam cerca de 20.000 magistrados de todo o país.
9. Os ataques e as palavras desrespeitosas dirigidas às Associações de Classe, especialmente à Ajufe, não se coadunam com a democracia, pois ultrapassam a liberdade de expressão do pensamento.
10. Como tudo na vida, as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do Supremo Tribunal Federal contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes.
Brasília, 9 de abril de 2013.
NELSON CALANDRA
Presidente da AMB
NINO OLIVEIRA TOLDO
Presidente da Ajufe
JOÃO BOSCO DE BARCELOS COURA
Presidente em exercício da Anamatra"