O crescimento acentuado da construção civil, verificado nos últimos anos em todo o país, tem sido acompanhado pelo aumento do número de acidentes de trabalho e de mortes de operários, principalmente por soterramento, queda ou choque elétrico. O setor foi o foco da preocupação de auditores do trabalho, gestores públicos e especialistas da Justiça do Trabalho, presentes nesta segunda-feira (11) em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).
Conforme o desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, que representou o Tribunal Superior do Trabalho (TST) no debate, a cada dia de 2011, em média, 50 trabalhadores saíram do mercado por morte ou invalidez permanente, vítimas de acidentes de trabalho em todos os setores produtivos. Naquele ano, foram cerca de 18 mil acidentes registrados, que resultaram em morte ou invalidez permanente. E outros 300 mil acidentes de trabalho , também em 2011, causaram invalidez temporária de trabalhadores, número que pode ser muito superior, tendo em vista que não há registro para o mercado informal.
Pressão
Entre as causas de tantos acidentes, Sebastião de Oliveira apontou a falta da cultura da prevenção e um ritmo de trabalho cada vez “mais denso, tenso e intenso”.
– Imagina-se que o acidente faz parte da produção, que é obra do acaso. Não, o acidente é principalmente obra do descaso, da falta da cultura de prevenção – disse, observando ainda o aumento da tensão no ambiente do trabalho.
Nos canteiros de obra, essa pressão sobre o trabalhador se verifica pela redução do tempo para construção de um metro quadrado, que em 1995 era de 42 horas e hoje foi reduzido para 36 horas, conforme informações do auditor fiscal Francisco Luiz Lima, do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho.
Para ele, a improvisação presente na construção civil agrava o problema, verificado nas diferentes regiões do país, seja em construções de moradias incentivadas pelo programa Minha Casa, Minha Vida, ou em grandes obras para implantação das novas hidrelétricas e para os eventos esportivos que o país sediará.
Questionado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que presidiu o debate, Jeferson Seidler, representante do Ministério do Trabalho, disse que o número de acidentes nas grandes obras mantém a média dos últimos anos.
– Não teve um aumento em relação à média histórica, mas apesar de serem obras mais estruturadas, quando a equipe vai lá encontra muitas irregularidades – disse.
Insuficiência de auditores
No debate, também foram ressaltadas dificuldades de fiscalização, seja pelo número insuficiente de auditores fiscais, seja pelas más condições de trabalho e riscos que enfrentam esses profissionais.
– O dimensionamento do quadro funcional de inspetores é inadequado para atuar no combate ao trabalho infantil e trabalho escravo, que não é mais só no meio rural, mas também nas capitais. É também insuficiente para atuar contra a terceirização ilícita, um problema enorme no país, que a construção civil piora, pois hoje se terceiriza tudo dentro da construção civil – disse Francisco Lima.
Ao lado das dificuldades de fiscalização, Jeferson Seidler resaltou o desafio que o governo enfrenta de fazer chegar a todos, trabalhadores formais, informais e autônomos, as informações de prevenção e as condições de segurança no trabalho.
Na opinião do senador Ataídes de Oliveira (PSDB-TO), os treinamentos de mão de obra conduzidos no país são ineficientes, comprometendo a formação em segurança do trabalho. Para ele, essa ineficiência é resultado da má aplicação dos recursos arrecadados pelas entidades do Sistema S (Senai, Senac, Sesi, entre outros), responsáveis pela formação de trabalhadores.
– Em 2012, o Sistema S arrecadou 15 bilhões de reais para a tarefa de qualificar a mão de obra. Onde foram aplicados esses 15 bilhões? – questionou o senador pelo Tocantins.
No debate, o senador Paulo Paim lamentou a situação dos trabalhadores terceirizados, considerados pelos especialistas como mais expostos a acidentes que os demais.
– A cada dez acidentes, oito são com terceirizados. Tem algo errado – frisou o senador.
Ao comentar o assunto, Renato Henry Sant'anna, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) fez um apelo para que o Congresso defina regras claras para a regulamentação do trabalho terceirizado.
Cartilha
No início da audiência pública, foi lançada a cartilha do Trabalho Seguro e Saudável, da Anamatra. O presidente da entidade, Renato Sant'anna, explicou que a cartilha visa promover a cultura da prevenção de acidentes de trabalho e será distribuída a trabalhadores, empregadores e estudantes que se preparam para ingressar no mercado.
– O objetivo dos juízes do Trabalho com a cartilha é despertar para uma realidade que envergonha o Brasil e a Justiça – disse, referindo-se à quarta posição ocupada pelo país no ranking mundial de acidentes de trabalho.