Corregedor diz que desentendimento entre Gilmar e Sanctis é normal
Leila Suwwan e Gustavo Paul
BRASÍLIA. Na contramão de várias interpretações de que está deflagrada uma crise institucional no Judiciário com o embate entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e o juiz federal Fausto de Sanctis no caso Daniel Dantas, o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, Murilo Kiling, considera que o desentendimento e a troca de farpas é uma demonstração saudável de que as "vozes" da magistratura brasileira estão vivas, são livres e têm identidade própria, o que fortalece a democracia e a liberdade no país.
Kiling, responsável pela corregedoria no Conselho Nacional de Justiça na ausência de seu titular, o ministro César Asfor Rocha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), reiterou que não foi solicitado - nem será aberto - qualquer processo de apuração sobre essa questão, mesmo com o protesto público e manifestos de juízes federais.
- A corregedoria não se sente instada a apurar qualquer coisa. Falar em crise é um certo exagero. Não houve qualquer falta de cortesia entre juízes ou entre os Poderes. O que houve foi uma demonstração de autonomia, harmonia e liberdade. A magistratura demonstra que é livre e tem identidade pública, sua voz está viva. É evidência da força da instituição dentro da democracia - disse Murilo Kiling.
Ele explicou ainda que é normal e corriqueiro o envio de "cópia" de decisões judiciais sem que exista qualquer demanda para apuração, especialmente em casos de grande importância ou repercussão para a sociedade. Segundo Kiling, a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça (presidido por Gilmar Mendes), "acompanha tudo".
Porém, para o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares Pires, o envio de cópia para "fins estatísticos" causa estranhamento. Segundo ele, o conselho já tem essa atribuição independentemente da remessa de documentação:
- O ministro Gilmar é um homem sério e ético, mas ele mandou para quê essa documentação? Seria inadmissível e custo a acreditar que tenha a intenção de pedir a abertura de um processo contra algum juiz. Se for isso, não vamos aceitar. Medidas como essas podem fragilizar a Justiça. A sociedade não pode ter juízes medrosos.
Mais de cem juízes federais também assinaram na semana passada um manifesto em defesa do juiz De Sanctis, para registrar "indignação com a atitude" do ministro Mendes - que criticou em ofício a decisão do juiz de prender Daniel Dantas após a concessão do habeas corpus. Ontem, a Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho (ALJT) divulgou nota pública em que "manifesta preocupação e absoluta rejeição" ao ato do presidente do Supremo. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que representa mais de 3.500 juízes brasileiros, também se manifestou no mesmo sentido.