03/07/24

Revista Trabalhista: prorrogado o prazo para envio de artigos para a 68ª edição

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03/07/24

Corregedor Nacional de Justiça arquiva PP que questionava decisões da Justiça do Trabalho em contratos de franquia

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Toma posse a nova Diretoria da Amatra 4 (RS) para o biênio 2024/2026

Associação gaúcha será liderada pelo juiz Tiago Mallmann Sulzbach

Ampliação da competência da JT

Luciano Atayde (diretor financeiro da Anamatra), Grijalbo Coutinho (presidente da Anamatra), Reginaldo Melhado (comissão legislativa da Anamatra)

Competência geral da Justiça do Trabalho

O mundo do trabalho tem sofrido profundas alterações nas últimas décadas. O trabalho em massa, padronizado e formal tem convivido com novas formas de ocupação para as quais a legislação social e o aparato do Judiciário não têm se mostrado devidamente atualizado para atender e solucionar as demandas de fração cada dia mais considerável da população economicamente ativa.

Falamos de um mundo do trabalho sensivelmente transformado pela implementação de novos padrões produtivos, que impuseram mutações no tradicional paradigma trabalhista até então conhecido. Segundo o DIEESE, esse novo ambiente de trabalho é caracterizado pela alta rotatividade, instabilidade, pouco dinamismo na geração de novas vagas, descontinuidade da trajetória profissional e, em especial, precarização das formas de contratação de mão de obra, fazendo recrudescer, assim, a informalidade. Dados oficiais do IBGE (Pesquisa Mensal de Emprego – PME de dezembro de 2003) dão conta que mais de 40 milhões de brasileiros trabalham sem qualquer vínculo formal de emprego.

O resultado disso é a exclusão desses milhões de trabalhadores vinculados à denominada ‘economia informal’ do sistema de proteção social (trabalhista, previdenciário e de seguridade social), inclusive quanto ao acesso à Justiça do Trabalho.

Isso porque, a Justiça Especializada do Trabalho é formal e historicamente vinculada aos contratos de trabalho celebrados e regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, isto é, aos contratos formais de trabalho, nunca lhe tendo sido atribuída ampla competência para julgar as querelas oriundas de outras modalidades de trabalho.

Por essa razão, a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho é um dos aspectos mais relevantes da Reforma do Poder Judiciário.

O texto aprovado na Câmara dos Deputados consigna considerável avanço para a construção de uma Justiça do Trabalho moderna e apta a ser o ramo do Poder Judiciário acessível a todos os trabalhadores, ao dispor que será de sua competência as ações oriundas das relações de trabalho em geral (art. 115 da redação da PEC-96/92), com expressa abrangência, portanto, de todas as causas envolvendo trabalhadores, mesmo aqueles sem vínculo empregatício, os tomados dos respectivos serviços e até mesmo os servidores públicos submetidos a regime estatutário.

Poder-se-ia questionar: está a Justiça do Trabalho aparelhada para ampliar essa nova competência geral? Claro que o Judiciário Trabalhista, como os outros ramos do Poder Judiciário, carece de maiores investimentos para sua informatização, ampliação e modernização. Porém, trata-se de uma Justiça extremamente capilarizada, contando atualmente com um tribunal superior (Tribunal Superior do Trabalho), 24 Tribunais Regionais do Trabalho e 1.378 Varas do Trabalho (já consideradas as varas criadas pela Lei 10.770, de 21.11.2003) com jurisdição sobre quase todo o território nacional e vocacionada para absorver um leque maior de jurisdicionados. Além disso, estatísticas oficiais do Supremo Tribunal Federal atestam que a Justiça do Trabalho vem julgando, ano a ano, um número de processos superior ao volume de causas recebidas.

Assim, considerando que o Juiz do Trabalho deve ser o magistrado da Legislação Social brasileira, é indispensável a manutenção da redação proposta para o art. 115 da Constituição Federal.

Causas envolvendo servidores Públicos

Como já assinalado, a nova competência geral que apresenta a Reforma do Judiciário para a Justiça do Trabalho estampa uma nova feição em relação aos servidores públicos, atraindo a jurisdição trabalhista também quanto aos servidores submetidos ao regime administrativo, também chamado de estatutário.

A medida é extremamente salutar e muito interessante na perspectiva da isonomia que deve guardar a atividade jurisdicional.

Com efeito, subsistem, nos diversos entes da Federação, servidores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, cujas causas já são de competência da Justiça do Trabalho, e servidores regidos por estatuto próprio, hoje jungidos à competência da justiça comum (estadual ou federal), embora que, em ambos os casos, estejamos falando de servidores, trabalhadores em sentido amplo, que prestam serviços para um mesmo órgão ou ente estatal, numa dicotomia de tratamento jurisdicional que não é conveniente. É comum a suscitação de conflitos de competência entre ramos do Poder Judiciário para identificar a quem cabe conhecer de demanda de servidor público, dada a complexidade que a matéria, por vezes, acaba por envolver, gerando insegurança jurídica indesejável, mormente quando se tem no país uma Justiça exclusivamente voltada para os conflitos de trabalho.

Afora isso, urge considerar que a Emenda Constitucional nº 19/1998, que instituiu a Reforma Administrativa, revogou a exigência da unificação de regimes de trabalho no âmbito da administração pública, até então disposta no caput do art. 39 da Constituição Federal, o que revela a longevidade dos regimes distintos de trabalho (CLT e estatutário) e reforça a conveniência de unificação da distribuição jurisdicional em relação aos servidores públicos, até mesmo em observância ao princípio da isonomia.

Por fim, há que sublinhar que a Magistratura do Trabalho encontra-se preparada para conhecer de questões envolvendo o regime administrativo de servidores públicos. Não somente porque tal matéria integra a preparação dos juízes do trabalho, como atesta a Resolução nº 73 do Tribunal Superior do Trabalho, mas também porque as normas de direito público, principalmente as constitucionais, são igualmente aplicáveis aos servidores públicos celetistas, como o princípio da acessibilidade mediante concurso público, moralidade na gestão administrativa, execução pela via de precatório, execução de pequeno valor contra a Fazenda Pública, garantia de pagamento de salário mínimo no âmbito da administração pública, dentre tantas outras matérias que envolvem questões de direito público e integram a atividade jurisdicional trabalhista.

É dizer, mesmo naquelas causas que envolvem relações de trabalho entre servidores celetistas e o Poder Público, há a incidência de normas de direito público no exercício da jurisdição trabalhista, razão pela qual reforça-se a importância do atual modelo proposto pela Reforma do Judiciário, que proporcionará a todos os servidores públicos – independentemente do regime jurídico a que estão submetidos -, o acesso à Justiça do Trabalho para solucionar os seus litígios.

Neste sentido, posicionou-se o então eminente relator da Reforma no Senado Federal, Senador Bernardo Cabral, que entendeu que a atual redação proposta para o art. 115, caput, da Carta da República, atende à vocação competencial da Justiça do Trabalho, até mesmo por ser um ramo especializado do Poder Judiciário da União, para onde devem convergir, por razões ontológicas, todas as discussões que envolvem relações de trabalho.

Causas envolvendo danos morais

Dentre as lesões que têm merecido maior destaque no cenário mundial, destacam-se aquelas que envolvem o chamado patrimônio moral do indivíduo, verdadeira faceta do princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção à sua privacidade.

O mundo do trabalho, porção de destaque da sociedade, não poderia deixar de consignar conflitos que envolvem lesões a esse patrimônio moral, cuja reparação em pecúnia caracteriza um número crescente de demandas judiciais trabalhistas, num fenômeno relativamente novo para a Justiça do Trabalho, tal como ocorre nos demais ramos do Judiciário.

Embora vacilante num primeiro momento, a jurisprudência em vigor, a partir da paradigmática decisão do Supremo Tribunal Federal (RE 238737, Rel. Min. Sepúlveda Pertence) tem interpretado que a Constituição em vigor já atribui, na competência geral da Justiça do Trabalho, a competência para conhecer de causas envolvendo pedido de danos morais decorrentes das relações laborais.

Ademais, os princípios que informam o processo, dentre eles o da celeridade, enriquecem a argumentação de que a Justiça do Trabalho, já apreciando outros efeitos do vínculo de trabalho, é o ramo do Judiciário que melhor pode decidir sobre todas as questões derivadas dessa mesma relação. Alcança-se, dessa maneira, a concretização do princípio da celeridade e se atende aos anseios dos jurisdicionados.

O Substitutivo aprovado pela Câmara dos Deputados não alterou esse quadro, tendo apenas destacado, de fora expressa, tal aspecto da competência da Justiça do Trabalho (art. 115, inciso VI da redação da PEC-96/92), providência que reforça, de forma pedagógica em relação ao jurisdicionado, a possibilidade de reparação pelo Judiciário Trabalhista de lesões ao patrimônio moral dos atores sociais do trabalho, pelo que deve ser o referido dispositivo mantido no âmbito da Reforma.

Competência penal da Justiça do Trabalho

Um outro aspecto que pode representar um avanço inquestionável à jurisdição trabalhista é o de dota-la de competência penal.

Com efeito, a legislação penal brasileira estabelece uma série de tipos penais cujo locus é o ambiente do trabalho ou mesmo a própria Justiça do Trabalho, como ocorre com os crimes contra a organização da Justiça praticados nos órgãos do Judiciário Trabalhista.

Vejamos, como exemplo, alguns dos tipos previstos nos artigos 197 a 207 do Código Penal: “atentado contra liberdade do trabalho”; “atentado contra a liberdade de contrato de trabalho”; “atentado contra a liberdade de associação”; “paralisação de trabalho, seguida de violência ou perturbação da ordem”; “paralisação de trabalho de interesse coletivo”; “frustração de direito assegurado por lei trabalhista”; “aliciamento para fins de emigração”; “aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional”.

Como se pode observar, são tipos penais que estabelecem condutas praticadas contra a organização do trabalho, no âmbito, portanto, das relações trabalhistas, com forte caráter social, que demandam, por isso, conhecimento e manejo das questões que envolvem os atores sociais do trabalho, o que atrai, de forma indelével, a atuação do Juiz do Trabalho, já ordinariamente afeto às discussões que envolvem o capital e o trabalho e suas tensões.

De outro lado, qual a razão para delitos contra a administração da Justiça, como “falso testemunho” (art. 342, CP), coação no curso do processo” (art. 344) e “fraude processual” (art. 347) praticados durante a tramitação de causas trabalhistas não sejam submetidos à apreciação da própria Justiça do Trabalho?

Para isso, há inclusive que se considerar que o Ministério Público da União possui um ramo razoavelmente aparelhado para funcionar como promotoria natural trabalhista. Trata-se do Ministério Público do Trabalho, que conta hoje com 24 Procuradorias Regionais, com atuação em todo o território nacional e igualmente preparado e vocacionado para o exame da prática dos referidos delitos.

O novo perfil da Justiça do Trabalho, com extinção do vocalato pela Emenda Constitucional 24/99, confere à sociedade a entrega da prestação jurisdicional por apenas juízes de carreira, habilitados, pois, para tal mister.

Afora isso, não constitui nenhuma novidade o fato de que ramos especializados do Poder Judiciário detenham competência criminal relativamente aos fatos ocorridos no âmbito de sua atuação principal. Assim o é com a Justiça Eleitoral e também com a Justiça Militar da União. A competência especial tem servido até mesmo para atrair o julgamento de crimes conexos. A exceção, na verdade, é a Justiça do Trabalho.

Cabe assinalar que, em Portugal, é de suma importância a experiência dos juízes do trabalho que, além de deterem competência cível-trabalhista, também detém especial competência para o julgamento das contravenções e crimes contra a organização do trabalho e contra a própria administração de tal justiça, modelo que se espera repetir na Justiça do Trabalho no Brasil.

A oportunidade dessa ampliação da competência da Justiça do trabalho, no bojo da Reforma do Judiciário, vai ao encontro, inclusive, de fatos concretos que revelam o recrudescimento da exploração degradante do trabalho, com as diversas denúncias sobre a prática de trabalho escravo em diversas regiões do país.

O texto da Reforma, em sua redação constante do relatório do Senador Bernardo Cabral, avança ao incluir as infrações penais praticadas contra a organização do trabalho, mesmo porque mantém a competência para conhecer e julgar habeas corpus, consagrada no texto aprovado na Câmara dos Deputados (art. 115, IV da redação da PEC-96/92). No entanto, entendemos que o texto pode avançar, agregando outras práticas delituosas conexas ao mundo do trabalho na competência da Justiça do Trabalho.

Competência previdenciária

A Emenda Constitucional no 20/1998 inovou de forma inteligente o sistema de competências, conferindo à Justiça Trabalhista a competência fiscal previdenciária para as demandas decorrentes dos feitos trabalhistas. É necessário aprofundar nessa linha, mesmo porque houve inclusive uma inversão de prioridade, já que o natural seria que uma Justiça, de signo social como a Justiça do Trabalho, recebesse, antes da competência fiscal previdenciária, a competência alusiva aos benefícios previdenciários, quando decorrentes de suas próprias decisões.

É necessário dar input ao processo de dispersão e difusão de competências jurisdicionais. O sistema constitucional de competências tem pontos de concentração vertical e horizontal. Ou seja, da perspectiva vertical, há uma concentração hierárquica nas cúpulas; do viés horizontal essa concentração se verifica em determinados ramos do Judiciário, o que, evidentemente, causa estrangulamentos e morosidade processual. A Justiça do Trabalho encontra-se em posição relativa de subaproveitamento, isso se considerada, principalmente, em relação à Justiça Federal.

Além da consideração quanto à otimização da distribuição de competência, é importante destacar que o fenômeno do trabalho deve ser tratado pelo Judiciário de uma forma holística, com a reversão do processo de excessiva fragmentação que lhe foi imposto desde os primórdios do varguismo. Atrair para a Justiça do Trabalho todas as relações de trabalho humano, e todos os potenciais litígios a elas conexos, sejam em sua perspectiva penal, administrativa ou previdenciária, é, evidentemente, o caminho que mais se coaduna com uma sociedade que pretenda consagrar o primado do trabalho.

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Dr. Marco Aurélio Marsiglia Treviso
Diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra