Segundo painel do webinário contou com a participação da vice-presidente da Anamatra, Luciana Conforti
O segundo painel do Webinário “Escravidão Contemporânea no Brasil: persistências, resistências e combate”, promovido pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), nesta sexta (28/1), discutiu o tema “Trabalho escravo: conceito e combate”, com a participação da vice-presidente da Anamatra, Luciana Conforti, como presidente da mesa e debatedora.
Em sua fala, Conforti afirmou que o objetivo do painel é tratar do conceito de trabalho análogo ao de escravo sob a perspectiva jurídica. A magistrada também lembrou que o Brasil percorreu um longo caminho para a consolidação de diversos instrumentos para o combate ao trabalho análogo ao de escravo, como a mudança de conceito, adoção da lista suja, pagamento de seguro-desemprego aos resgatados, entre outras importantes iniciativas.
A vice-presidente ressaltou que a Anamatra tem atuado intensamente na construção de medidas efetivas de combate à prática criminosa, especialmente no âmbito da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), sendo uma das representantes da sociedade civil. "A Anamatra sempre atuou nesse combate. Faz parte das suas missões estatutárias a valorização da dignidade humana e o combate a qualquer tipo de precarização das relações de trabalho”, destacou.
Dinâmica do capital e o trabalho escravo - A professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcela Soares apresentou uma análise da dinâmica do capital e da particularidade brasileira, esclarecendo alguns elementos que são aparentemente contraditórios e que estão circunscritos nas trajetórias das mudanças das relações de trabalhos. Para a docente, "é imprescindível que analisemos o trabalho escravizado contemporâneo a partir de uma apreensão de totalidade, justamente articulada às especificidades da nossa formação econômica e social", explicou. Nesse sentido, Marcela Soares destacou aspectos como a precarização do trabalho, ausência de políticas públicas, a divisão sexual e racial do trabalho, a fragilização da proteção da dignidade no trabalho e as formas renovadas de escravização pelo sistema capitalista.
Jurisprudência - Já a diretora-geral do Instituto de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Pará (UFPA), Valena Jacob Chaves Mesquita, discutiu aspectos críticos quanto à jurisprudência penal, que limita a aplicação do artigo 149 do Código Penal. Como explicou a jurista, o conceito de trabalho escravo não está unicamente do CP, necessitando uma interpretação muito mais ampla, passando pela Constituição Federal e pelos tratados internacionais ratificados pelo Brasil, com vistas à proteção da dignidade da pessoa humana e na promoção do trabalho decente. Valena Jacob fez uma análise das decisões do judiciário brasileiro em torno do tema e, explicou que, em muitos casos, aspectos como a natureza da atividade laboral ou a condição pessoal do trabalhador servem como ‘justificativa’ para os empregadores imporem condições precárias, sem que haja condenação. “Isso não deve existir! A realidade da vida pessoal do trabalhador não pode refletir na qualidade do trabalho dela”, defendeu.
Balanço e proposições -
Coube ao juiz federal e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Carlos Henrique Haddad a última exposição do evento, com o tema ‘Trabalho Escravo na Balança da Justiça’. A fala do professor teve como base os dados de pesquisa realizada pela Clínica de Trabalho Escravo de Pessoas, que fez um levantamento dos processos penais e trabalhistas sobre trabalho escravo no Brasil no período de 2008 a 2019. Haddad chamou a atenção para atuação da justiça criminal. Ao longo do período referido, de um total de 2679 denúncias foram formalizadas, sendo que 1752 réus foram julgados, 441 condenados em primeira instância e apenas 112 condenados efetivamente, o que representa apenas 4,2% do total. “A cada 100 réus que são denunciados, só 4 são definitivamente condenados. É um número bastante baixo. Isso revela que o papel da justiça criminal tenha sido muito superficial, gerando uma grande impunidade”, lamentou o juiz, que também detalhou os índices de absolvições, tramitações, prescrições, bem como os argumentos mais comuns utilizados para justificar as absolvições.
Por fim, Haddad apresentou proposições para mudar o cenário apresentado, como a capacitação de magistrados e procuradores em trabalho escravo e gestão judicial, produção de provas antecipada, maior divulgação da lista suja. “No dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo, vê-se que o Poder Judiciário ainda tem muito o que melhorar”, finalizou.
Assista o painel na íntegra (a partir de 2h12) :
Nos links abaixo você confere as notícias sobre as conferências de abertura e encerramento do webinário, bem como sobre o primeiro painel:
Especialistas defendem reforço do combate ao trabalho escravo no Brasil
Trabalho escravo: primeiro painel do webinário promovido pela Anamatra debate a história, as lutas e perspectivas em torno do tema