Juíza Noemia Porto participa do Seminário Online Eleições 2020, promovido pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral
“A igualdade de gênero na política é uma verdadeira desigualdade. Trata-se de um espaço compreendido como naturalmente masculino, assim como o espaço público e de poder é considerado atributo dos homens”. A declaração foi feita pela presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, nesta terça (12/5), no Seminário Online Eleições 2020, promovido pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
Em sua intervenção sobre o tema “Igualdade de gênero e democracia”, a magistrada destacou a necessidade de o debate sobre a política estar presente no cotidiano da sociedade e das famílias brasileiras. “Desde o movimento sufragista, é fato que a igualdade é fruto de disputa e de luta”, apontou a presidente, que relembrou a luta histórica em busca de reconhecimento pela igualdade das mulheres na condição de cidadãs. “A prática da política brasileira demonstrou que essa conquista, embora muito importante, não foi e não tem sido suficiente para tornar democrático, igualitário e, muito menos, representativo o espaço da política e a ocupação dos espaços decisórios”, alertou.
Entres os problemas para a efetiva igualdade de gênero na política, segundo a presidente, estão os atributos culturais. “A mulher desde seu nascimento é ‘preparada’ para assumir determinados papéis, ou seja, continuamente consideradas como trabalhadoras braçais e atender às vontades de terceiros, em especial dos homens. São as mulheres aquelas para as quais são endereçados os atributos e as obrigações sociais do cuidado”. E, nesse aspecto, para Noemia Porto, não há uma construção linear da participação feminina que, em algum momento, representará a redenção da desigualdade.
A presidente apresentou números que corroboram os argumentos relativos à desigualdade de gênero na política. Após as eleições de 2018, as mulheres passaram a ocupar 15% dos espaços formais de poder, um incremento, apesar de diminuto, no número de mulheres eleitas em 2018. O Congresso Nacional possui, atualmente, 77 deputadas federais e 12 senadoras. Segundo o ranking elaborado pela União Interparlamentar (IPU), o Brasil ocupa a 156ª posição, em uma lista de 190 países, que mede a participação feminina na política. “Não há equidade, igualdade e justiça na ocupação dos cargos políticos no Brasil. O deficit de representatividade diz muito, ainda, sobre a qualidade da democracia brasileira”, disse.
Em relação às eleições de 2018, a magistrada lembrou que a participação política das mulheres e a sua proteção jurídica estiveram nos debates recentes em razão das denúncias de fraudes no repasse de verbas por partidos a candidatas. De acordo com Noemia Porto, essas fraudes deram origem a argumentos no sentido de que não há mulheres interessadas nas candidaturas e de que a política de cotas femininas deve ser eliminada. “Ambos os argumentos são complicados. A política partidária, dominada pelos homens, não tem condições de afirmar o desinteresse feminino pela participação. O que há é a ausência de compromisso de diversas agremiações em tornar essa participação viável. As denúncias de fraudes não indicam que a política deva ser eliminada. Ao contrário, deve ser ampliada e protegida”, defendeu.
A presidente da Anamatra também fez uma análise da temática no âmbito do direito internacional. Segundo Noemia Porto, a desigualdade entre os sexos na ocupação de cargos públicos vem se mostrando como motivo de preocupação estatal, a exemplo da Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher (1953) e, posteriormente, a Convenção para Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979). “As convenções estipularam que as mulheres devem ter iguais condições de serem elegíveis aos cargos eletivos, assim como devem participar, nas mesmas condições que o homem, da vida política, social, econômica e cultural de seu país, cabendo aos Estados a adoção de mecanismos para promover essa igualdade”, explicou.
Na avaliação de Noemia Porto, é obrigação dos poderes constituídos propiciar, para a correção de desigualdades históricas, condições reais e efetivas de as mulheres serem eleitas, de participarem nas mesmas condições que os homens, na vida política, social, econômica e cultural do país”. “O fato é que as políticas de ações afirmativas para a equidade de gênero na vida política não têm se mostrado suficientes. Para além do aspecto numérico das candidatas, é necessário levar a sério a participação efetiva durante o processo eletivo, e mesmo antes, ou seja, nos espaços decisórios dentro das agremiações; e, ainda, depois, como ocupantes de posições estratégias como presidentes de comissões, integrantes de mesas diretoras, etc”.
Ao final de sua intervenção, a presidente da Anamatra fez um chamado à responsabilidade de toda a sociedade para que a igualdade de gênero seja uma realidade e colocou a Associação à disposição para contribuir nos diversos fóruns comprometidos com o processo democrático brasileiro. “O chamamento que deixo é para um pacto social pela igualdade de gênero no Brasil”.