Juíza Noemia Porto fala sobre a importância da adoção, pela OIT, da Convenção nº 190, que aborda o tema
A presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, foi uma das palestrantes, na última sexta (30/8), no seminário “O centenário da OIT e o futuro do trabalho”. O evento ocorreu durante toda a semana em diversos locais em Curitiba (PR).
A participação da presidente ocorreu em painel com o tema “Gênero e Relações de Trabalho”, realizado na sede da Associação dos Magistrados do Trabalho da 9ª Região (Amatra 9/PR), que também contou com exposições da consultora em sustentabilidade e gestão da diversidade do SESI Paraná, Renata Cunha, da professora de Sociologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Maria Aparecida Bridi e da assessora da Força Sindical Gilce Martins.
Em sua intervenção, a presidente da Anamatra falou da importância da aprovação, na 108ª Conferência Internacional do Trabalho (CIT), realizada em junho último, da adoção da Convenção nº 190 e da Recomendação nº 206, abordando a violência e o assédio no local de trabalho. A Convenção entrará em vigor 12 meses após dois Estados-Membros da OIT a ratificarem. “De todo modo, independente da sua entrada em vigor, a divulgação ampla das disposições da Convenção pode promover a conscientização sobre a necessidade da maior proteção dos trabalhadores e mudança de certas posturas violadoras de direitos humanos, além de servir de horizonte para a interpretação dos tribunais, no julgamento de casos concretos, já que os termos da nova Convenção são compatíveis com os princípios adotados pela Constituição de 1988”, observou.
A magistrada explicou que os instrumentos aprovados adotam enfoque prático, com a definição das violências e do assédio no trabalho como um conjunto de comportamentos e ações inaceitáveis, que têm por objeto provocar ou ocasionar danos físicos, psicológicos, sexuais e econômicos, em todas as pessoas que trabalham, independentemente de sua situação contratual. “As previsões abarcam o abuso físico e verbal, a intimidação e as ameaças, o assédio sexual, entre outros atos, reconhecendo-se que as violências no trabalho podem ocorrer fora do seu espaço físico e até em comunicações profissionais, geradas pelas tecnologias da informação”, explicou.
Segundo a presidente, os instrumentos aprovados no centenário da OIT reforçam o compromisso do organismo internacional de promover o futuro do trabalho, baseado na dignidade e no respeito. “São princípios não só relacionados com os empregados formais, mas com todas as formas de trabalho, para a proteção dos direitos humanos e afastamento dos abusos e de situações inaceitáveis, reforçando a utilidade e eficácia do diálogo social e do tripartismo (consenso entre governos, trabalhadores e empregadores), como elementos essenciais para a criação de normas internacionais, de observância mundial”, explicou.
A presidente da Anamatra, que acompanhou os debates na 108ª Conferência Internacional do Trabalho, observou que a postura do Brasil na votação que culminou na aprovação da nova Convenção nº 190, revelou-se preocupante. Isso porque a representação de empregadores se absteve de votar para a aprovação da norma e apenas a representação dos trabalhadores votou favoravelmente à Recomendação nº 206, ao contrário de países como Canadá, Finlândia e França, que votaram fechados, governo e representações de trabalhadores e empregadores, tanto para a adoção da convenção quanto da recomendação.
Prevenção – A palestra da presidente da Anamatra também abordou o contexto do assédio no meio ambiente de trabalho, segundo a magistrada, inserido na preocupação com o equilíbrio e a salubridade do meio ambiente. “Não há como negar que ambientes laborais injustos e violentos interferem na produtividade dos trabalhadores. São evidentes os casos de absenteísmo, conflitos no ambiente de trabalho e constante rotatividade de trabalhadores”, observou.
Especificamente com relação à perspectiva de gênero, a presidente da Anamatra mencionou que, embora a vítima possa ser tanto homem quanto mulher, todas as estatísticas revelam que se trata de uma questão do gênero feminino. “Há subnotificações. O que se nota é que não há uma inserção igualitária no ambiente de trabalho, daí porque a questão do combate ao assédio em geral e ao sexual em particular também demanda uma discussão sobre a igualdade de gênero nas relações de trabalho”.
Para a presidente, a discussão sobre o assédio envolve reflexões sobre a adoção de políticas preventivas e repressivas, podendo ser citado o comprometimento com a promoção de uma educação corporativa que esclareça o que é assédio. Segundo Noemia Porto, a defesa de um meio ambiente saudável, longe da violência, depende do compromisso de todos. “O combate efetivo à violência que o assédio representa é o caminho para a valorização do trabalho como expressão de cidadania, com ganhos evidentes, não apenas para o cumprimento dos direitos fundamentais constitucionalmente vinculados, como, ainda, para o desenvolvimento econômico que se realize de forma sustentável, projetando organizações privadas e públicas que se remodelem e se modernizem na concepção do que sejam produtividade e criatividade, as quais dependem do componente humano”, apontou.
O programação na sede da Amatra 9 (PR) contou, ainda, com exposições da presidente da Amatra 9 (PR), Camila Caldas, do ex-presidente da Anamatra Guilherme Feliciano e da presidente do TRT da 9ª Região, desembargadora Marlene Suguimatsu.
Sobre o evento - Organizado coletivamente por diversas entidades, entre elas a Anamatra, empresas e setores da sociedade civil, o seminário comemorativo ao centenário da OIT levantou outras importantes discussões ao longo da semana, como liberdade sindical, “compliance” nas relações de trabalho, liderança, reforma trabalhista e trabalho em plataformas digitais. A conferência de abertura foi ministrada pelo diretor do escritório da OIT no Brasil, Martin Hahn, no prédio histórico da UFPR.