Para vice-presidente, aumento da jornada promove adoecimento e reduz postos de trabalho
A vice-presidente da Anamatra, Noemia Porto, participou, nesta segunda (25/6), de audiência pública destinada a debater jornada de trabalho, trabalho extraordinário e salário mínimo. O evento foi provido pela Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa para discutir o Estatuto do Trabalho (SUG 12/2018).
Em sua intervenção, a vice-presidente ressaltou a importância do Estatuto do Trabalho para a retomada de um caminho civilizatório para todos os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil. “É inegável que, quando se escolhe o recorte jornada de trabalho e remuneração, nós estamos diante daquilo que está no centro da luta histórica dos trabalhadores por melhores condições de vida e de trabalho”, salientou, ao citar mudanças promovidas pela Lei 13.467/2017 (reforma trabalhista).
Na avaliação da magistrada, a Constituição Federal deve ser o marco da militância em prol da cidadania. “A Constituição aponta o limite de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais como um mínimo de proteção trabalhista, e assume que normas futuras poderiam melhorar essa condição da disponibilidade para o trabalho”, defende.
A vice-presidente também destacou que a Recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) nº 116, da qual o Brasil é signatário, versa sobre a redução progressiva do horário de trabalho que, além de atender à norma internacional, tem como princípio o respeito às regras de segurança e medicina do trabalho. “O excesso de disponibilidade de um trabalhador, além de significar o grave risco de adoecimento, também implica que outro posto de trabalho não está sendo criado. Se adota uma lógica de descarte. É a vida do trabalhador que é esgotada, jogada para fora, descartada, e outra vida de um trabalhador é esgotada. Ele adoece e é descartado num ciclo vicioso e permanente de adoecimento e de pobreza”, alerta.
Fazendo um paralelo com outros países, Noemia Porto explicou que o excesso de disponibilidade no trabalho não tem nenhuma relação com o incremento de produtividade. Segundo estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, países com menores quantidades de horas trabalhadas por ano têm elevado PIB per capita, o mesmo ocorre com o índice de desenvolvimento humano.
Um dos exemplos trazidos foi a Suécia, que tem altos índices de produtividade econômica e sucessiva redução da jornada de 40 horas semanais para 36 horas. Até mesmo a reforma trabalhista francesa, explicou a magistrada, manteve a jornada padrão de oito hora diárias, com a possibilidade de execução de duas horas extras, limitadas a 35 horas semanais. Lá, apenas em casos emergenciais, e após negociação com o sindicato, é possível estender o trabalho para até quatro horas extras. “Na chamada reforma trabalhista brasileira, o que disso foi preservado? A negociação coletiva ficou atingida, o excesso não é apenas em casos emergenciais, basta a negociação direta entre trabalhador e empregador, e tudo isso fica longe dos olhos estatais”, analisou.
Segundo a vice-presidente, países europeus como Portugal, Espanha, Itália, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Alemanha e Suécia possuem um rígido controle do limite de horas extras, o que não ocorre no Brasil com as mudanças promovidas pela Lei 13.467/2017. “Banalizou-se a hora extra no Brasil. A tentativa é de tornar os trabalhadores mais disponíveis, com jornadas imprevisíveis, e sem contrapartida remuneratória”, afirma.
O Estatuto do Trabalho trata do tempo de trabalho e determina que o mesmo não pode exceder oito horas diárias e quarenta horas semanais, tornando concreto o compromisso brasileiro com a Recomendação nº 116 da OIT. Para a Anamatra, essa mudança, além de atender a cláusula de progressividade dos direitos sociais trabalhistas, implementa a possibilidade de uma experiência nacional que aproxime o Brasil da realidade de países que se preocupam com renda per capita e índice de desenvolvimento humano. “É uma oportunidade de retomada dos direitos que foram retirados pela chamada Reforma Trabalhista, incluindo a importante questão da jornada de trabalho”, afirmou.
Na avaliação da juíza, são abusivos todos os discursos que têm chamado a Reforma Trabalhista de modernidade. “Modernidade é olhar 50 anos atrás e notar que não avançamos. Desde 1988 não conseguimos progredir no compromisso de redução de jornada. O Estatuto do Trabalho, sim, poderá, sem abusos, ser grafado de moderno”, concluiu.