Reforma trabalhista: não aplicar a Constituição da República é o pior caminho, aponta ministro Maurício Godinho

Para ministro, juízes não podem ter vergonha de atuar com o Direito

“Não aplicar a Constituição da República, as convenções e declarações internacionais de direitos humanos, econômicos, culturais, sociais e, portanto, trabalhistas, imperativos no Brasil, e não considerar a lógica jurídica sistêmica do Direito do Trabalho e Processual do Trabalho é pior caminho”. Essa foi a a direção apontada pelo ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Mauricio Godinho Delgado ao responder o tema de sua conferência “Reforma Trabalhista e perspectivas para a Justiça do Trabalho: avançar ou retroceder?”, que aconteceu nesta sexta (4/5), no 19º Conamat. 

Na avaliação do magistrado, nada justificará a presença da Justiça do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho, do Ministério do Trabalho, do Direito do Trabalho e Processual do Trabalho se esses campos jurídicos não cumprirem o seu papel. Para Godinho, o desafio é grande. “Não podemos ter vergonha de atuar com o Direito. Se ele for um instrumento de segregação, exclusão, discriminação, de separação das pessoas e de abandono de toda a matriz civilizatória constitucional, talvez não seja esse o Direto que nos fez escolher o próprio curso de Direito, nos tornarmos juízes e desempenharmos o papel fundamental que a Justiça do Trabalho exerce no país”, disse.  


Ao contextualizar o tema, o jurista pontuou como os avanços dos direitos trabalhistas incomodaram parcela da sociedade estadunidense em 1970. “A verdade é que a partir de 70, nós tivemos um processo de reorganização dos setores que se sentiram incomodados com esse paradigma social. Setores harmônicos com o liberalismo primitivo e que perderam a hegemonia”, explicou. Godinho lembrou os movimentos iniciados nos EUA, no governo de Richard Nixon, que tinham claro objetivo de barrar concessões. “Foi um momento, por exemplo, em que os meios de comunicação retratavam exatamente o que os donos do poder econômico desejavam e nesse sentido eles foram vitoriosos”, enfatizou.  

Nesse sentido, o ministro discorreu sobre o constitucionalismo humanista e social construído na Europa ocidental após a segunda grande guerra. “A única maneira de saber ou não se devemos seguir é olhar para a história”, afirmou.  De acordo com Godinho, “é dessa forma que se pode refletir com maior consistência e segurança o cenário atual”. O ministro ressaltou a importância da Constituição Federal de 1988 ser baseada nos paradigmas das constituições europeias elaboradas após a primeira guerra.  De acordo com o magistrado, princípios humanistas estão presentes nessas constituições em detrimento da constituição americana, fundamentada em um liberalismo arcaico oriundo do início do século XX. “A Constituição brasileira está focada no bem-estar social”, frisou.

De acordo com o jurista, o Estado Democrático de Direito é formado na Europa no período pós-guerra, a partir de pontos essenciais: a valorização da pessoa humana e a implantação de um governo e de uma sociedade democrática e inclusiva.  O magistrado ressaltou a relevância desse fundamento e refletiu com preocupação sobre o desaparecimento de alguns estudos na área acadêmica. “Curiosamente, estão sumindo dos cursos de formação da área de humanas matérias como fundamentos da economia e história da ciência política e história das ciências econômicas”, diz.

Godinho recordou a necessidade de compreender o contexto de hegemonia ideológica dos EUA no Brasil atual. “A constituição americana enfatiza o paradigma da primeira fase do liberalismo, que é considerada primitiva, não é um paradigma de humanista social”, explica.  O jurista reiterou que é a constituição europeia, na qual a brasileira é fundamentada, a trazer grandes pilares civilizatórios de um Estado Democrático de Direito. “Quem se baseia nos EUA se esvazia porque é baseado no estado liberalista primitivo”, explicou.

Encerrando a conferência, a vice-presidente da Anamatra, Noemia Garcia Porto, que presidiu os trabalhos da mesa, falou sobre a importância da contextualização histórica. "O ministro, ao lançar uma narrativa sobre o passado, nos coloca qual é o nosso desafio que está em nossas mãos, magistrados, para o futuro", disse. 

Conamat - O Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Conamat) acontece bianualmente e conta com participação de magistrados de todo o país. Em sua 19ª Edição, o evento, que acontece de 2 a 5 de maio, em Belo Horizonte, conta com a parceria da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 3ª Região (Amatra 3/MG) e reunirá cerca de 600 pessoas entre ministros, juízes, desembargadores, advogados, procuradores, estudantes de Direito e entidades da sociedade civil de todo o país para debater tema “Horizontes para a Magistratura: Justiça, Trabalho e Previdência”. 

As palestras estão sendo transmitidas ao vivo e ficarão disponíveis no canal TV Anamatra no Youtube. Inscreva-se e acompanhe: www.youtube.com/tvanamatra


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Confira o site do evento: www.anamatra.org.br/conamat

 

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