Trabalho Escravo: Anamatra defende preservação da publicidade da lista suja, da independência técnica da Magistratura e da integridade da lei 

Presidente da entidade afirma que Ministério do Trabalho invadiu competências dos poderes Legislativo e Judiciário

O presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, participou ontem (20/10) de ato público, na Câmara dos Deputados, contra a Portaria nº 1.129/2017, do Ministério do Trabalho, relativa ao trabalho escravo. O documento, entre outros pontos, redefine o conceito do trabalho escravo, de forma incompatível com o Código Penal, bem como dificulta o acesso à lista suja, reduzindo a transparência e atentando contra o princípio da publicidade próprio da administração pública. O evento foi promovido pelo deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) e outros parlamentares.

Guilherme Feliciano explicou que o Código Penal, em seu artigo 149, alterado em meados dos anos 90, indica que a escravidão contemporânea se define pelo trabalho forçado, pela escravidão por dívidas, pelo trabalho degradante e pela jornada exaustiva.  “Se são quatro figuras, não podemos reduzi-las a uma só. O Ministério do Trabalho toma para si uma competência que é do Parlamento e, para além do disso, do Poder Judiciário”. Na avaliação do presidente, o documento atenta contra a liberdade da Magistratura em, dentro das balizas técnicas, constitucionais e legais, entender quando há ou não o trabalho escravo contemporâneo, no campo penal (Justiça Federal) e no campo civil-trabalhista (Justiça do Trabalho). 

O presidente da Anamatra ressaltou que o Brasil tem um compromisso internacional com o trabalho decente, tendo reconhecido a existência do trabalho escravo contemporâneo na década de 90. A partir de então, em função de diversas políticas públicas de erradicação do trabalho escravo, o Brasil se tornou referência mundial na matéria. “A Justiça do Trabalho teve um papel importantíssimo nessa evolução”, disse. “São os juízes do Trabalho que reconhecem a indignidade e determinam que os direitos trabalhistas sejam efetivamente satisfeitos”, ressaltou, mencionando também os papéis importantes desempenhados pelos procuradores e auditores fiscais do Trabalho. 

Na contramão dessa realidade, a portaria, na avaliação do presidente, corrobora o quadro de desestruturação do Estado Social no país. “Os senhores começam a ouvir de diversos segmentos mais um rescaldo do que se tentou lá nos idos de 2003, que é a extinção da Justiça do Trabalho. O que nós teremos então para  assegurar o trabalho digno no Brasil? É preciso que o cidadão abra os olhos para o que está acontecendo: essas instituições são históricas e existem por uma única razão, que é garantir o cumprimento da Constituição Federal e das leis nas relações de trabalho”.

Para o magistrado, a portaria, para gerar alguma segurança jurídica, precisaria ser discutida com a sociedade civil organizada, o que não ocorreu. “Se, de fato, há no final desse túnel uma liberação oblíqua das práticas hoje consideradas trabalho escravo contemporâneo, valerá sempre lembrar que o Brasil foi o último país da América a abolir formalmente a escravatura. Que não seja o primeiro a reabrir o caminho de volta”, concluiu o presidente. 
 

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